Por Pe. César Moreira, C.Ss.R. Em Igreja

Entrevista: ‘A missão da Mãe de Jesus na história da Salvação’

Todos gostamos muito de Nossa Senhora, mas nem todos sabem com exatidão o lugar e a missão que a Mãe de Jesus tem na História da Salvação e na Igreja.

Com a intenção de aprofundar o conhecimento sobre Ela, entrevistamos o Missionário Redentorista Padre Antônio Clayton Sant’Anna, diretor executivo da Academia Mariana de Aparecida.

Foto de: Thiago Leon

Nossa Senhora Aparecida (Thiago Leon)

 

Padre César: O que é a Academia Marial? Qual a razão de sua existência e em que consiste sua atividade?

Padre Antônio Clayton: É uma agremiação religiosa e cultural com Estatutos próprios e com Regulamento aprovados pelo Arcebispo de Aparecida, que é seu Presidente. (Atualmente o cardeal Dom Raymundo Damasceno Assis). Fundada em 16 de julho de 1985 no clima do XI Congresso Eucarístico Nacional em Aparecida.

O patrono nomeado pelo então Papa João Paulo II é São José de Anchieta- SJ, considerado o primeiro mariólogo do Brasil. A AMA reúne associados que, motivados por forte espiritualidade mariana, querem conhecer e amar mais a Nossa Senhora inspirando-se nela enquanto modelo que é da vida cristã e ícone da Igreja. Os sócios inscritos são devotos e estudiosos muito interessados em aproximar-se do “mistério de Maria”: sua fé, sua união singular com Jesus, seu exemplo de discipulado, sua disponibilidade ao projeto salvador do Pai. Enfim seu verdadeiro lugar e função na história da salvação.

A Academia erigiu-se há 29 anos como centro de estudos, reflexões e pesquisas sobre teologia mariana e sobre a veneração especial à pessoa de Maria na Igreja. (Consta ser a única do gênero no Brasil). A devoção a Nossa Senhora pode ser vivida como religiosidade popular costumeira (festas, santuários, práticas piedosas etc.) e como ciência ou saber teológico atualizado.

A Academia Marial abrange os dois aspectos. Promove a espiritualidade mariana entre os fiéis e cultiva o progresso intelectual mediante estudos, palestras nos Congressos e outras atividades como a Assembleia anual e o contato epistolar com os sócios. Sediada no 11º andar da Torre tem uma biblioteca especializada em Mariologia e marca presença no Portal A 12 com um site próprio. O Congresso anual realiza-se em parceria com a Faculdade Dehoniana de Taubaté. Ela, credenciada pelo MEC, habilita o evento como curso de extensão universitária expedindo Certificado legal aos participantes.  

Enfim, são quase 400 os sócios inscritos espalhados pelo Brasil e até no exterior: de simples devotos a professores universitários.  Entre eles: cardeais (4) bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas, leigos atuantes. Um associado, Dom João Bráz de Aviz  é Prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica. O próprio Dom Raymundo, cardeal de Aparecida, é co-presidente do Sínodo extraordinário sobre a Família que acontece em Roma até 19 de outubro próximo.

O conjunto de atividades faz sim da Academia Marial um espaço qualificado que auxilia o trabalho evangelizador do Santuário Nacional.

Padre César: Por que as pessoas gostam de Nossa Senhora? Conheceriam a missão dela no Plano de Deus?

Padre Antônio Clayton: O amor a Nossa Senhora é inseparável da fé em Jesus. O povo cristão sente isso, mesmo sem maiores conhecimentos teológicos sobre a Virgem. O culto a Maria vem do início da Igreja, fundamentado nos Evangelhos que no-la apresentam como Virgem intata e Mãe de Deus.

 

O amor a Nossa Senhora é inseparavável da fé em Jesus. O povo cristão sente isso, mesmo sem maiores conhecimentos teológicos sobre a Virgem.

Os católicos gostam de Maria porque creem em Jesus e querem ser discípulos dele como o foi Maria. Ela é “aquela que acreditou!”: a mulher em quem a identidade se confundia com a fé e por isso, a colaboradora incondicional da salvação messiânica.  Ela é venerada como a primeira discípula do Filho, é modelo de vida na fé e no discipulado, é ícone da Igreja-mistério e da igreja-missão.  

A partir da era apostólica e do período patrístico e até hoje houve (e há) uma compreensão progressiva do papel de Maria no mistério do Filho. Os pastores de alma (e a mídia católica!) deveriam ajudar mais o povo cristão a libertar-se dos desvios devocionais presentes na religiosidade popular mariana. O Concílio Vaticano II, as Conferências Episcopais sul americanas: Medellin - Colômbia em 1968; Puebla - México em 1979 insistem muito nesse particular. Mas, podemos dizer que a devoção a Maria sustenta e educa a vida cristã na comunidade.

Padre César: Que é preciso saber sobre Nossa Senhora para ser um cristão bem informado e conhecedor da fé católica?

Padre Antônio Clayton: Nas comunidades onde o ensino do Catecismo é realmente levado a sério nos inícios da formação cristã e preparação aos sacramentos com apoio e exemplo das famílias, muita coisa habilitará os fiéis no conhecimento mariano e na prática do verdadeiro culto a Nossa Senhora. 

A sã doutrina, o culto e a devoção autêntica a Nossa Senhora levam sua figura para além do imaginário popular que a vê como a santa poderosa e bondosa, a mãe de Jesus que intercede por nós e nos ajuda nas precisões.  Não se pode contentar com as festas de tradição, costumes folclóricos, procissões, romarias etc. quando alimentam ou expressam apenas o sentimentalismo e emoções passageiras.  Claro que é necessário preservar os valores herdados das gerações e ao mesmo tempo ir purificando-os do misticismo supersticioso.

50 anos atrás o Concílio Vaticano II refletiu intensamente sobre a Igreja: sua origem divina na Trindade, sua condição de Povo de Deus na terra; a hierarquia, os leigos, a vocação comum à santidade; os religiosos. Nasceu então o primeiro documento do Concílio intitulado: Lumen Gentium (Luz dos povos). O Capítulo VIII desse documento consagrou o ensinamento atual sobre o culto mariano conforme o papel de Maria, a mãe de Deus, no mistério de Cristo e da Igreja. Supõe-se que o católico esclarecido saberá ao menos os quatro dogmas marianos: a maternidade divina; a virgindade perpétua; a imaculada conceição e a assunção ao céu.

Foto de: Diego Simari/A12

Consagração a Nossa Senhora Aparecida -  Diego Simari

Nossa Senhora sob o título de Aparecida.

Padre César: Por que são muitíssimos os nomes com que Nossa Senhor é chamada no mundo?

Padre Antônio Clayton: Os inúmeros títulos e denominações de invocação à única pessoa de Maria ao longo dos séculos vêm de uma fonte perene: a cristologia, Ou seja, o conhecimento sobre Jesus Cristo. Aí enraíza-se também a presença bíblica de Maria unida ao mistério do seu Filho. Aliás, o primeiro título foi-lhe dado pelo mensageiro celeste: Ave, Ó CHEIA DE GRAÇA!

O apelativo “nossa senhora” veio no 1º século. Segundo a pesquisa histórica e a iconografia (estudo artístico das imagens) as primeiras imagens de Nossa Senhora, seriam as “virgens orantes” erigidas nas catacumbas romanas. Representam uma mulher em pé, com os braços elevados em atitude de oração.

Os títulos traduzem os anseios das pessoas, grupos ou povos. Os escravos negros acharam consolo em Nossa Senhora do Rosário. Com o tempo a piedade popular e o culto litúrgico mariano multiplicaram as “nossas senhoras” em festas, novenas, ladainhas, terços, títulos de padroado.  Às vezes lembrando os locais ou situações bíblicas vividas por Maria: Belém, Nazaré, Egito. Ou, os episódios da Anunciação, Visitação, Natividade, Calvário, Soledade. Outros títulos vieram de fatos extraordinários e aparições: Nossa Senhora de Guadalupe, de Lourdes, de Fátima, Aparecida etc. Todos os países cristãos tem Maria como padroeira sob um título específico.

 

Maria é uma só pessoa, com a identidade do seu corpo terreno de Mãe de Jesus.

Maria é uma só pessoa, com a identidade do seu corpo terreno de Mãe de Jesus. Já os títulos devocionais originam-se de circunstâncias históricas, festivas, locais, etc.etc. Se a grande imprensa não sabe distinguir em Maria a identidade e os títulos a ela atribuídos, ao menos os cristãos conscientes deveriam saber. Os responsáveis do ensino doutrinal e da prática pastoral são os primeiros “culpados” de possíveis confusões nesse item.

Padre César: Quais são as formas mais indicadas de rezar a Nossa Senhora?

Padre Antônio Clayton: São as tradicionais da Igreja: a Ave Maria; a Saudação angélica (Anjo do Senhor); a antífona: a vossa proteção recorremos, mãe de Deus (a oração mais antiga a Nossa Senhora); a Salve Rainha; o terço, ultimamente com renovado apreço; as Ladainhas (mês de maio).  Muito popular é o Ofício da Imaculada Conceição. E também as diversas fórmulas de Consagração, rezada ou cantada. Dificilmente haverá uma paróquia que não faça a Novena mariana em preparação à festa da sua padroeira. 

Os Missionários Redentoristas propagam no mundo inteiro a Novena a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. A título de exemplificação: em Curitiba-PR a Novena é frequentada toda quarta-feira por 35 mil pessoas. Cumpre-se assim a ordem do Papa Pio IX que, em 1865, entregou o ícone de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro aos cuidados dos Missionários Redentoristas recomendando: “fazei-a conhecida no mundo inteiro!”. E mais ainda, cumpre-se a profecia da Virgem: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada!”.

Padre César: Qual a Nossa Senhora de sua devoção? E por quê?

Padre Antônio Clayton: É aconselhável saber como e quando usar os títulos marianos com proveito espiritual. Evitando ofuscar -ainda que de maneira sutil- a filial relação do culto à pessoa de Maria.  Na minha devoção particular os títulos não figuram com maior importância. Prepondera a reflexão sobre a ligação de Maria com Jesus e, consequentemente, com minha vida cristã e consagrada. Títulos são expressões que avultam só em dadas circunstâncias ou situações vividas, por razões pessoais ou pastorais. Por exemplo, como redentorista recorro a “Mãe Aparecida” e a “Mãe do Perpétuo Socorro”. Venero Maria como filha de Sant’Anna, já que é meu sobrenome de família.

Colunista - Padre César Moreira

 

Escrito por
Padre Antônio César Moreira Miguel (Arquivo redentorista)
Pe. César Moreira, C.Ss.R.

Sacerdote, jornalista, radialista e escritor com muitos anos de atividade nos meios de comunicação social. Foi diretor geral da Rede Aparecida de Comunicação e fundou a Rede Católica de Rádio, hoje atua na área de assistência social da Província de São Paulo.

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