Por Pe. José Carlos Linhares Pontes Júnior, CSsR Em Igreja

O poder do símbolo, da fala e da escuta na cultura africana

A Matriz Cultura Africana é muito vasta e plural, mas o alicerce se dá no ser humano. É na pessoa que se fundamenta toda a transmissão do conhecimento e vivência com os demais elementos existentes. As tradições dos povos africanos foram conservadas e transmitidas pelas instituições familiares, pelos ritos de iniciação, pela música, pela língua.

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Um dos elementos mais fortes é a oralidade e o poder da palavra. Na África tradicional não há livros nem biblioteca como em Alexandria, por exemplo. A palavra falada tem muita importância, ela constitui o único meio de receber a herança dos antepassados. Os anciãos tem o dever de reger o clã e transmitir oralmente os ensinamentos da família. Atualmente, em virtude das influências externas, é perceptível que as crianças não sabem nem os nomes dos avôs e com isso estão perdendo o contato com os antepassados, com as tradições da família alargada.

Quando não há palavras para explicar os mistérios do mundo e da vida faz-se o uso do poder dos símbolos, pois existe uma íntima relação entre o simbólico e a palavra. Os símbolos são coisas sagradas porque tem origem em Deus, acredita-se que quando Deus criou o patriarca fundador daquele clã, o dotou de duas capacidades: fecundar/crescer seu povo e explicar todos os mistérios do mundo por meio da palavra e dos símbolos. Cabe ao patriarca garantir a ordem no clã, pois ele recebeu diretamente de Deus as luzes para tal missão. A lei, a ordem e o bom andamento daquele clã dependem do patriarca e dos ensinamentos que ele transmitiu aos descendentes. O simbolismo está presente na raiz do africano, pois não existem palavras suficientes que expliquem os mistérios da vida.

Outro elemento é a escuta. Reafirmo que a tradição é passada oralmente e não por meio da escrita. Existem muitos ritos e neles a palavra recria o cosmo e garante a continuidade do universo. A palavra tem força! Por isso, se algo for dito pelo chefe da tribo, pelo ancião, pela pessoa em seu último suspiro de vida, pelo padre, pela freira, pelo feiticeiro, essa palavra tem força e se realiza! A palavra se concretiza por isso é preciso escutá-la. Escutar é acolher com amor, é curar o coração. Essa dimensão gera o encontro.

A vida pode ser definida como o encontro contínuo com novas realidades, pessoas, experiências. Por isso, os ritos de iniciação promovem o contato da pessoa com a natureza, com o clã, com a sociedade de forma gradual e contínua.

Nos dias atuais, será que nós vivemos a cultura do encontro? Temos tempo para nos nossos familiares e amigos? Para sentir a natureza? Para viver os mistérios de Deus? Muitas vezes, esquecemos de sentir a vida e optamos em pensar sobre a vida e por isso não conseguimos compreender que o simbólico, a palavra e a escuta são fundamentais para a cultura do encontro e do acolhimento. Que essa antiga tradição africana possa iluminar nossas vidas e nossas relações cotidianas.

Assinatura padre junior

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