-E Eu te absolvo dos teus pecados em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.
Depois disso o cansado sacerdote lhe disse uma penitência que com certeza não são comparáveis às ofensas feitas a Deus por essa pobre alma pecadora, mas que agora sai do confessionário na melhor condição que se pode ter enquanto peregrinamos aqui na terra, a de ser pecadores sem pecado. Enquanto essa alma, agora reconciliada com Deus, caminha em direção a saída da capela, o seguinte pecador, ainda carregado pelo peso de seus pecados, se dirige a Cristo que age por meio daquele homem, em busca da sua própria reconciliação.
Já leva horas sentado nesse confessionário, e os seus mais de sessenta anos, dos quais 35 como sacerdote, lhe lembram de seu cansaço físico, da sua dificuldade de escutar e de falar, mas espiritualmente arde por distribuir o amor de Deus aos que ainda esperam na fila pela misericórdia divina que insiste em transbordar desse senhor. Ele mesmo é um pecador, e o sabe muito bem, mas sabe também que apesar dos pecados que comete (e muitas vezes aproveitando-se dessas caídas), Deus opera maravilhas por meio de suas mãos consagradas no dia de sua ordenação. É essa confiança n´Ele que o faz continuar, porque por suas próprias forças não poderia fazer muito, afinal, “Quem afinal pode perdoar pecados, a não ser exclusivamente Deus? ” (Mc 2, 7).
E Deus realmente continua fazendo maravilhas. Esse último saiu emocionado porque fez uma confissão geral de vida, há muito tempo que estava afastado do amor de Deus e já nem se lembrava de sua última confissão. Cada lembrança de pecado confessado se assemelhava a um passo dado em direção a amizade com Deus e, ao receber a absolvição, não pode conter a alegria desse abraço do Pai. Certamente poderia dizer o mesmo que Santa Teresinha em sua primeira confissão: “Ao sair do confessionário estava tão contente, como jamais sentira tamanha alegria na alma”.
Entra mais uma pessoa, enquanto o sacerdote se ajeita no banquinho que não é dos mais confortáveis que existem por aí. Aliás, se paramos para pensar, é realmente desproporcional a relação entre o que acontece nesse momento e o que se percebe externamente. Nem a mais confortável poltrona do mundo poderia representar o poder do perdão de Deus que acontece nesse lugar. Em questão de minutos se transforma, realmente, uma pessoa. Não é apenas um desabafo, um conselho ou uma palavra amiga que se escuta. Não! Nesse momento Deus vem aos corações e o renova, respondendo aquela prece de Ezequiel: “E vos darei um novo coração e derramarei um espírito novo dentro de cada um de vós; arrancarei de vós o coração de pedra e vos abençoarei com um coração de carne”.
Muitas pessoas ainda precisam desse novo coração, mas o padre precisa sair. Faltam poucos minutos para a missa diária que ele celebra. Recobra suas forças com o pensamento que por meio dele Deus quer nesse momento vir novamente ao mundo, para estar no meio do seu povo, naquela hóstia que espera para ser consagrada. Cada Eucaristia ele tenta celebrar como se fosse a única, embora reconheça que algumas vezes celebrou com mais cansaço que piedade.
Mas Deus se faz presente mesmo assim. Será que existem palavras mais poderosas que um homem pode proferir que estas que por sua simples pronúncia tornam Deus realmente presente? "Tomai, todos, e comei, isto é o meu corpo que será entregue por vós" (Lc 22,17ss). Só de pensar nisso o padre estremece interiormente de amor por tão imenso dom que lhe foi imerecidamente concedido.
A Igreja não está tão cheia assim, mas isso talvez não seja o mais importante, porque Deus gosta de fazer muito com poucos, como fez com Gedeão e seus poucos guerreiros (Juízes 7). O que mais importa ao sacerdote nesse momento é que os que estejam ali possam se encontrar com o Senhor e sair dali com essa presença divina em seu interior. Os números poderão aumentar depois, porque também é verdade que Jesus lhe pediu para anunciar o Evangelho a todas as criaturas e batizá-las em nome da Trindade Santa.
Ah! Quantas almas ele já não tinha recebido no seio da Igreja por meio deste outro sacramento, no qual se abrem as portas da Igreja, e também do Céu, para os que o recebem. Que alegria imensa experimentou em cada um deles ao ver a água tocando a frente das crianças e saber que ali nascia uma nova pessoa, um cristão.
No momento de repartir a comunhão aos fiéis, ele caminha devagar até a nave central da igreja e a cada um que recebe Jesus, oferece uma oração, pedindo que essa pessoa se conforme cada vez mais com esse Pão de Vida que está comungando. E talvez esse seja um dos momentos mais gráficos do que resume a sua vida. Ele sempre pensou em si mesmo como alguém que existe para aproximar as pessoas a Deus e qual maior proximidade pode existir que essa quando “possuímos” a Deus no nosso interior?
A missa termina. E assim se passa a vida desse sacerdote. Cuidando das almas que lhe foram confiadas, desde antes de entrarem na comunhão com Deus e até os últimos momentos dessa vida, nos quais prepara-os para o encontro definitivo com o Senhor. Poucos sabem seu nome, o que para ele não é nenhum incômodo, porque seu desejo maior é que olhando para ele, não o vejamos, mas encontremos aquele Nome perante o qual todo joelho se dobra: Jesus.
Boleto
Carregando ...
Reportar erro!
Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:
Carregando ...
Os comentários e avaliações são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site.