Opinião

Duelo entre opiniões

Escrito por Dom Walmor Oliveira de Azevedo

10 JAN 2015 - 07H00 (Atualizada em 21 DEZ 2022 - 12H16)

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Há uma palavra magistral de Jesus, no Templo de Jerusalém, dirigida aos Judeus que acreditaram nele, conforme narra São João no seu Evangelho:

“Se permanecerdes em minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos,
e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. 
(Jo 8, 31-32)

Essa palavra é a indispensável evocação de que existem princípios e valores inegociáveis, que permitem à humanidade aproximar-se da verdade que liberta. Trata-se de um ensinamento que não impede a diversidade das opiniões, mas adverte a respeito da verdade como condição insubstituível para que haja autêntica liberdade.

Compreende-se que há um perene e exigente percurso na busca da aproximação da verdade. Ninguém dela é dono ou a possui na sua inesgotável inteireza. Afastar-se desse entendimento produz consequências sérias e abomináveis, como os fundamentalismos religiosos, políticos e outros, que muitas vezes são usados para justificar a perpetração de crimes, atentados e outros tipos de desrespeitos à dignidade humana.

Especialmente na contemporaneidade, diante de tantos avanços e conquistas no âmbito de direitos e cidadania, não se pode encastelar a verdade nas estreitezas de parâmetros culturais, religiosos e políticos, que cegam e tentam justificar ações inaceitáveis.

Leia MaisPapa Francisco: “Que Nossa Senhora Aparecida livre o brasileiro do ódio, da intolerância e da violência”Intolerância, tolerância e prudênciaAs muitas ameaças à liberdade e à cidadania que ocorrem pelo mundo, em razão de opiniões equivocadamente elaboradas - particularmente as que nascem de convicções religiosas e políticas - são motivo de grande preocupação.

Não menos preocupantes são os cenários que se formam no interior de culturas e nações, quando mecanismos degradam o erário, a violência ceifa vidas, as disputas desumanas intermináveis destroem sonhos e possibilidades.

Cada relato de violência, vandalismo, atentado e outras abominações deve levar a um exame de consciência e a uma postura mais cidadã, que indiquem a necessidade permanente de se buscar a verdade para balizar opiniões.

Esse processo educativo e civilizado é uma urgência no contexto do mundo contemporâneo que, na contramão de seus avanços e conquistas, continua a alimentar barbáries e inseguranças. Uma triste realidade em que cada pessoa busca justificar suas ações apenas a partir do próprio ponto de vista. 

Shutterstock/ DisobeyArt
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O distanciamento da verdade é o caminho mais curto para todo tipo de terrorismo, corrupção e atentados contra grupos, sociedades e culturas.

O exercício civilizatório que o contexto atual preocupante exige é desafiador, urgente e precisa ser considerado em todos os âmbitos. Não pode restringir-se às estratégias de estado em defesa de sua integridade, ou às instituições na preservação de suas identidades, nem mesmo à família, na sua indispensável condição de ordenar a sociedade.

Inclui também, e de modo muito especial, a postura cidadã de cada um diante do outro, da realidade, dos projetos e das diversas situações. Não se pode viver da alimentação indiscriminada e facilitada pelos meios todos disponíveis de um duelo entre opiniões.

Continuar nesse caminho é viver sob a ameaça constante de uma “bomba-relógio”, que pode explodir aqui ou em qualquer outro lugar, com danos de toda a natureza para povos, culturas, grupos e indivíduos, acabando drasticamente com projetos, sonhos e possibilidades.

Leia MaisFundamentalismo é sempre prejudicial Dos fundamentalismos? Livrai-nos Senhor! É preciso averiguar e mapear fundamentalismos de todo tipo, lacunas sérias em processos educativos, para desenvolver programas e dinâmicas que garantam aos indivíduos, nas diferentes culturas e realidades, um sentido de apreço pela verdade.

Somente assim será possível a convivência de opiniões que contribuam para as escolhas e para a adoção de novas posturas, pois prevalecerá a perspectiva de que o mais importante, e que está acima de tudo, é o respeito a direitos e a dignidades.

Oportuno é lembrar o que disse o Papa Francisco, na sua Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2015:

“A Boa Nova de Jesus Cristo - por meio de quem Deus renova todas as coisas - é capaz de redimir também as relações entre os homens, incluindo a relação entre um escravo e o seu Senhor, pondo em evidência aquilo que ambos têm em comum: a filiação adotiva e o vínculo de fraternidade em Cristo”.

Esta referência é um exemplo de princípio e valor que deve incidir sobre dinâmicas culturais e modificá-las na direção de uma incontestável qualificação. Trata-se de um ensinamento que promove a fraternidade, gera paz e sustenta o sentido de igualdade que convence sempre, mentes e corações, sobre a importância de se respeitar a integridade do outro, seus direitos e a riqueza de sua cidadania.

É preciso investir permanentemente nas dinâmicas sociais, políticas, religiosas e culturais presididas por valores e princípios capazes de preservar a vida em sociedade. Assim, será possível trilhar o caminho da verdade, distante das tiranias que sempre serão fonte de prejuízos e dos inaceitáveis “duelos entre opiniões” que comprometem o bem, a justiça e a paz.

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