PÁGINAS DE HISTÓRIA DA IGREJA NA AMÉRICA LATINA
Parte 15
Ao contrário do que muitos livros de história afirmam, a evangelização da America Latina, com os seus diversos povos e civilizações não foi feita de forma tão pacífica, mas enfrentou muitos conflitos e dificuldades aos longo dos 500 anos da primeira evangelização.
Encontro, Métodos Evangelizadores e Conflitos:
A evangelização propriamente dita possui três momentos estruturais: Primeiro, vem o encontro, depois a conversão e, na sequência, a vida cristã subsequente. Dos dois primeiros momentos depende em muito o terceiro.
A distância da Metrópole dificultava a vinda de
missionários para a America. Uma viagem durava
em média 45 dias, podendo chegar até a 70 dias.
Neste processo, diante da evangelização é possível ao menos duas posturas. A primeira é identificada com o modelo daCristandade o que reduz o sujeito da evangelização ao método da tabula rasa. Em muitos episódios o encontro das civilizações aqui na América e o processo de evangelização se fez em meio à violência da conquista. Neste método se desconhece os valores que o outro traz, se reduz a zero os seus conhecimentos e se parte para a Doutrinação. Este método não toma em consideração a cultura indígena, mas impõe a cultura e a doutrina pela força da conquista, fazendo uma doutrinação massiva. No melhor dos casos, vinha o paternalismo, pois se considerava os índios como se fossem crianças que tudo precisavam aprender.
O método mais adequado e que também foi bem usado na América Latina é identificado com a Postura Missionária. Neste método não se apaga o que o outro traz, mas parte-se para a ação baseada no respeito pelo outro. Assim, a evangelização se faz com a promoção do outro e com consciência, podendo se identificar com a evangelização mais adequada.
O encontro das totalidades - Modos de enfrentar-se
O encontro do mundo europeu com o indígena
não se fez de forma pacífica.
Os produtos tecnológicos das totalidades histórico-concretas dos europeus representadas num primeiro momento pelos espanhóis e portugueses eram superiores e, com isso, a dominação se fez no nível econômico, político e, por fim, no religioso. O uso de armas de fogo e do cavalo, além de outros produtos, fez com que a superioridade dos povos europeus fosse gritante.
Entendemos que o processo de evangelização como encontro foi o choque de dois povos, de duas estruturas prático-produtivas ou duas culturas. O religioso garantiu e legitimou a superioridade do europeu e a ordem estabelecida de dominação.Houve o choque e o encontro desigual entre a visão de mundo dos índio latino-americanos contra a visão de mundo Hispano-Lusitano.Para o índio, ser espanhol-português e ser cristão era a mesma coisa.
Diante disto como se colocava a tarefa do missionário? Isso nem sempre era pacífico, mas o missionário devia fazer a distinção entre o ser espanhol e o ser cristão, convertendo as populações indígenas ao cristianismo e não só à cultura europeia.Por esta forma de evangelização os missionários tentavam fazer a evangelização pela persuasão da razão e do entendimento do índio e reconhecem a dignidade de ser humano do evangelizado (importância da bula Altitudo Divini Consilii de Paulo II - 1537). Aqui, a evangelização se faz sem armas.
A evangelização deve reconhecer a dignidade e
a vontade do evangelizado
Para desenvolver os métodos pacíficos eram exigidas certas técnicas como o conhecimento das línguas indígenas (Insistência das cédulas reais, Sínodos e Concílios). Mas havia um elemento muito complicado de se realizar: Como traduzir os dogmas e conceitos nas línguas e nas culturas dos povos indígenas fazendo a catequese das verdades cristãs?
Dentro desse mesmo sistema mais pacífico, aconteceram também casos de paternalismo de Tabula Rasa ou foram usados métodos pacíficos em regiões anteriormente conquistadas pela violência. Muitas e muitas vezes o missionário devia ser um critico da exploração colonial, como tão bem o fez o Frei Bartolomeu de Las Casa e muitos outros, sobretudo, aqueles que eram das ordens religiosas.
Como se fez a evangelização: Primeiro se conquistava militarmente uma região, se fazia a sua pacificação, se organizava o governo e se convertia a população à religião dos dominadores, começando a construção de algumas estruturas físicas de Igreja.Neste processo a Igreja foi colocada como um dos meios que possibilitou a expansão pré capitalista Hispano-Lusitana.
Esta sistemática de junção da evangelização com a colonização levou vários setores da Igreja a reagir ao sistema colonial. Alguns queriam a submissão da missão diretamente à Roma, sem passar pelo controle do estado espanhol ou lusitano.De outros brotou acritica profética aos métodos de conquista e evangelização, propondo em seu lugar outros métodos.Ainda uma parte apoiava os estados chegando a identificar Portugal e Espanha com a Igreja, qualificando sua obra como perfeita.
Um amplo setor da Igreja que se opunha à expansão guerreira e a dominação mercantilista buscou a autonomia em relação à coroa e as classes dominantes da América que colaboravam com o conquistador.
Modos diversos de Evangelizar
Os métodos de evangelização dependiam não somente do agente evangelizador como as ordens religiosas, clero secular e leigos, mas da cultura dos indígenas e da situação histórico-concreta. Entre os diversos métodos de organização da missão existiam dois extremos:
* Os que admitiam como convenientes e mesmo necessárias as estruturas da conquista e exploração para a evangelização. Desta posição vem o método de Tabula Rasa e Doutrinação já citados.
* De outro lado estavam os que optaram pela autonomia em relação às estruturas da cristandade e se opuseram à violência das armas. Desta posição surgem os métodos de evangelização fora da ordem colonial que primam pela valorização da cultura indígena e respeito. Exemplo: Reduções.
Críticas da Santa Sé ao Sistema de Padroado
A partir do final do século XVI e princípios do século XVII começaram as criticas ao Sistema do Padroado, com tentativas de fazer a evangelização independente do sistema colonial.Estas criticas surgiram especialmente a partir das demonstrações de fragilidade no sistema Hispano-Lusitano e com a entrada de outros países no sistema colonial (Holanda, Inglaterra e, sobretudo, a França, país essencialmente católico).
Atitudes da Santa Sé: Em 1622 a Santa sé criou a Sagrada Congregação de Propaganda Fide para coordenar a evangelização nos territórios de missão.Com isso, aumentou a critica os vícios do sistema do padroado e aos vícios da evangelização como os conflitos entre religiosos e seculares, entre Bispos e religiosos e religiosos das ordens entre si. Criticava-se também a febre mercantil de muitos missionários que queriam enriquecer-se para voltar à metrópole e os maus tratamentos feitos aos índios, bem como o envolvimento dos missionários em questão civis e a ignorância das línguas.
Dificuldades da Evangelização
Com o domínio da Espanha, aumenta a
ingerência do estado na vida interna da Igreja
Desde os primeiros tempos já se enfrentava algumas dificuldades que, em parte, persistem até os dias de hoje. Entre elas destacamos a escassez de missionários, a extensão de dioceses e paróquias, a falta de recursos e a necessidade de empenho na formação de um clero autóctone.
Outras dificuldades eram a ingerência dos reis e autoridades coloniais nas questões meramente eclesiásticas, com a cumplicidade dos missionários, bom como a falta de zelo pastoral de certos missionários e bispos. A intervenção da Propaganda Fide ou do papa nas Américas foi impedida, ou ao menos dificultada, pois os documentos e bulas precisavam da aprovação real para que tivessem validade. Isto se fazia pela prática do Exequátur.
Outra dificuldade foi o domínio de Portugal por parte da Espanha entre 1580 e1640, porque Portugal era mais liberal que a Espanha. As relações de Portugal com a Santa Sé só serão normalizadas totalmente em 1737. Por fim, outra dificuldade foi a "Questão do Ritos" que impediu a adaptação litúrgica do cristianismo às diversas culturas e povos, especialmente no oriente (Japão, China e Índia), mas com reflexo aqui na América Latina.
Padre Inácio Medeiros, C.Ss.R.
Mestre em História da Igreja
pela Universidade Gregoriana
Escreve série sobre a
História da Igreja no Brasil
para o A12.com
Boleto
Carregando ...
Reportar erro!
Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:
Carregando ...
Os comentários e avaliações são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site.