Por Ir. Miria T. Kolling Em Música

O ministério dos compositores

O ministério dos compositores

A Constituição sobre a Sagrada Liturgia nos orienta para os diversos ministérios exercidos a serviço da comunidade celebrante: "Nas celebrações litúrgicas, cada um, ministro ou fiel, ao desempenhar a sua função, faça tudo e só aquilo que pela natureza da coisa ou pelas normas litúrgicas lhe compete."

Dentre os vários ministérios do canto, destacamos hoje o letrista (poeta) e o músico (compositor). Alguns são poetas e compositores ao mesmo tempo; mas em geral, um faz a letra e outro compõe a melodia.

 

"...sobretudo com relação aos Salmos, como sendo a melhor escola de oração: "Eles serão o poço onde os autores ou letristas litúrgicos poderão continuamente beber."

1º) Quanto ao letrista ou poeta - Os textos dos cantos litúrgicos devem expressar a fé  e estar de acordo com a doutrina da Igreja; tenham sua principal fonte de inspiração na vida, na liturgia e na Bíblia, especialmente nos Salmos; apresentem qualidade literária e poética, não sejam banais nem vulgares; evitem o demasiado regionalismo,  adaptando-se a um repertório comum, rico em imagens e metáforas, cuidando-se da rima, que seja rica e bem construída; embora ela  não seja necessária, facilita a memorização. Os textos sejam dialogais, celebrativos e orantes, não explicativos nem doutrinários ou catequéticos, pois a finalidade da liturgia não é doutrinar e sim, celebrar a aliança de Deus com o seu povo. Evite-se também a linguagem intimista, que sobrepõe o "eu" individual ao "nosso" plural, povo de Deus em oração... A letra leve em conta a função específica de cada canto na liturgia: aclamação, hino, refrão, penitencial, canto estrófico, proclamação, salmo... Também os tempos litúrgicos, a festa do dia e o mistério celebrado inspirem o texto.

Assim, o poeta litúrgico deve ter vivência cristã, formação bíblica e litúrgica, além de experiência celebrativa; esteja integrado na comunidade, para comungar com a realidade do seu povo; também tenha certa cultura musical, para trabalhar a métrica e o conteúdo que traduza a alma de sua gente, seu modo de expressar a vida e a fé. Importante o que diz o Estudo 79 da CNBB "A Música Litúrgica no Brasil", no nr. 227, a respeito da Bíblia, sobretudo com relação aos Salmos, como sendo a melhor escola de oração: "Eles serão o poço onde os autores ou letristas litúrgicos poderão continuamente beber."

 

...o canto não é algo secundário ou autônomo, mas é a expressão mais profunda da liturgia, dela fazendo parte integrante e necessária.

2º) Quanto ao músico ou compositor - A música na liturgia deve nascer e estar a serviço da Palavra, do mistério celebrado, do momento ritual e da própria comunidade. Como já dizia Bach, a música é humilde serva da Palavra, que tem a primazia e, portanto deve ser ponte que nos leve do visível ao invisível. Deste modo, o canto não é algo secundário ou autônomo, mas é a expressão mais profunda da liturgia, dela fazendo parte integrante e necessária. Por isso mesmo, a melodia deve ter qualidade musical.

Orienta o mesmo documento se componham melodias que tenham as características da verdadeira Música Sacra; possam ser cantadas não só pelos grandes corais ou pelo grupo de cantores, mas estejam ao alcance da assembleia, favorecendo a participação ativa e frutuosa de toda a comunidade.

Daí que o compositor tem uma grande responsabilidade ao compor e criar a música litúrgica. Ele deve ter conhecimento em harmonia, composição e instrumentação... ou ter assessoria técnica pelo menos quanto ao básico, saber ler as notas, ter formação musical... Para divulgar um canto, é importante que se achem bem definidas as características rítmicas e harmônicas, os registros vocais, a tessitura adequada para ser cantado pelo povo, indicações de interpretação e o correto uso litúrgico. (Manual de Liturgia II - CELAM, Paulus, pág. 297). Outra questão é a correspondência entre o canto e a ação litúrgica, isto é, levar-se em conta sua aplicação e função ministerial na liturgia, com as características requeridas para o rito ou momento celebrativo:  canto de abertura ou de comunhão, salmo proclamado ou aclamação jubilosa, que a melodia expresse enfim o espírito do texto. A música litúrgica é como "uma ferramenta" que vai permitir comungar na mesma ação, aclamar, meditar, proclamar..." (Para viver a liturgia - Jean Lebon, Edições Loyola). Ainda, que a música tenha fluência e beleza, qualidade sonora e melódica... No dizer de Ione Buyst, "não seja banal, mas artística e bonita, como é bonito um pôr-de-sol, um olhar de criança..."

Ficam alguns questionamentos para os letristas e compositores litúrgicos:

1) Tenho a humildade de reconhecer minhas limitações, de consultar aqueles que sabem mais, de submeter à apreciação de outros as minhas composições, no desejo de acertar? ...

2) Invisto na formação litúrgico-musical?  Conheço os livros litúrgicos? Tenho alguma técnica musical? ... Procuro saber mais para servir melhor? Sirvo a Deus e à comunidade? ...

3) Sou comprometido e integrado na vida da Igreja e da comunidade?  Tenho vivência cristã? ...

4) Faço do altar um palco, um show à parte? ... ou atuo de forma discreta, levando em conta a assembleia? Coloco os cantos certos no lugar certo, no momento certo e adequado? ...

5) O meu canto faz a comunidade cantar rezando? Ajuda a mergulhar no mistério sagrado do Senhor? A letra expressa o sentido litúrgico do que se celebra?

6) Sigo a moda, os sucessos atuais, com letras vazias e intimistas, escolhidas a esmo, ou os textos e músicas exprimem a fé e os valores perenes da nossa Igreja e do povo de Deus a caminho? ...

A proposta não é de "fazer música", mas de entrar, por meio da arte musical, no mistério da salvação. (Gelineau).

*Ir. Miria Kolling é Religiosa da Congregação do Imaculado Coração de Maria, compositora da música litúrgica e religiosa, musicista, pedagoga, gravou mais de 30 trabalhos em LPs e CDs, como também livros sobre canto e liturgia.

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