Palavra Redentorista

Um itinerário para aprofundar a Espiritualidade Quaresmal

Pe. Rogério Gomes, C.Ss.R. (Foto Deniele Simões JS)

Escrito por Pe. Rogério Gomes, C.Ss.R.

06 MAR 2017 - 08H03 (Atualizada em 08 ABR 2022 - 13H39)

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O tempo quaresmal deve ser, para o cristão, um momento oportuno para recordar, na vida pessoal, as ações de Jesus. A Quaresma nos convida a dar um salto qualitativo, à luz da vida do Doador de Vida, que convoca cada um de nós a um itinerário de seguimento e a fazer a experiência da Via Amorosa e Reconciliadora, presente no mistério pascal.

Esta realidade tem implicações profundas na vida e não é uma tarefa fácil, uma vez que pede, de cada um, certos elementos que rompem com o comodismo, com a passividade e requerem nova postura frente à realidade, e também um modo novo de vivenciar a fé. Deve superar a concepção de que basta somente o jejum, a caridade e a oração, muitas vezes vistos de um modo banal pela sociedade de hoje e por muitos cristãos, como um mero cumprimento de preceito.

Diante da proposta litúrgica da Quaresma, cada um deve se perguntar: O que significa este tempo para mim? Como o vivo? Quais são os frutos espirituais conquistados e que repercutem na vida cristã? Como estou me preparando para celebrar o grande mistério pascal de Cristo? Ou será que este é mais um período proposto pelo calendário litúrgico e nada me diz?

É bom que, à luz destas interrogações, cada um se ponha a perguntar e a refletir sobre a vida espiritual pessoal. Para ajudar, neste artigo vão alguns elementos para que cada pessoa, na Quaresma e na vida, possa fazer seu próprio itinerário espiritual.

Neste tempo profundo, proposto ao crente para a preparação à grande Festa da Páscoa, não se pode esquecer da Sagrada Escritura, especialmente daqueles textos que ajudam a refletir sobre o sentido da misericórdia, da conversão e do amor de Deus na vida do ser humano. Também sobre a libertação, a aliança com Deus e a humanidade e aqueles que se referem à Criação, ou à Nova Criação, à profecia, ao testemunho e às ações de Jesus: sua vida de anúncio da Boa Nova, oração, contato com as pessoas e seu modo de fazer o bem.

Propositalmente, não colocarei nenhuma citação para direcionar, pois é importante que cada um sinta-se estimulado a buscar estes temas é lê-los em sintonia com a realidade e à vida. Alguém pode perguntar: por que buscar estes temas? O aprofundamento deles, no período quaresmal, ajudará a celebrar melhor a Páscoa.

A Quaresma é como um tempo de enamoramento, à espera da grande festa de casamento, em que se celebra o mais profundo mistério de fé, de humanização de Deus e a mais fiel aliança da história, realizada na Cruz de Cristo e na Sua ressurreição.

Neste sentido, a Escritura é nossa testemunha, é porta-voz de todo o evento divino-humano e redentor da história da humanidade, e que fornece um itinerário à fé. Não é um itinerário tranquilo, pois desinstala, coloca em movimento, em caminho, para encontrar a razão da fé e o sentido para a existência.

Além da Escritura, é importante ler a vida dos Santos e Santas da Igreja ou, se há oportunidade, alguma obra que escreveram. Vale recordar a vida de João da Cruz, Teresa de Jesus, Teresinha de Lisieux, Edith Stein, Santo Antão, Santo Afonso, e outros que fizeram uma profunda experiência de fé: Madre Teresa de Calcutá, Dorothy Stang, Margarida Alves, pessoas que doaram sua vida por causa da fé em Jesus, em favor dos mais frágeis. Importante recordar os santos e santas das comunidades que, no silêncio, expressam a força para a missão da Igreja.

A preparação quaresmal requer uma mística e nos leva a uma; leva o crente a transfigurar-se em Jesus. Essa transfiguração tem um elo na vida contemplativa e prática, fé e ação. E, neste sentido, a vida dos santos e santas e daqueles que doaram suas vidas em favor do Reino e das vidas fragilizadas, nos faz repensar o nosso itinerário de vida e de fé, porque nos remete às raízes de nossas promessas batismais e às implicações que o batismo tem na vida cristã.

Quando se espera alguém para uma festa, antes há uma preparação. Na Quaresma também não é diferente; é preciso preparar o coração - centro das decisões morais, lugar onde cada um é o que é. Uma das maneiras propostas pela Igreja é o Sacramento da Reconciliação. Infelizmente, hoje, este sacramento vem sendo desvalorizado, tanto por parte de muitos sacerdotes, bem como dos fiéis.

Para este momento, sacerdote e fiel devem estar preparados, pois é um sacramento que toca lá nas profundezas da pessoa, nas suas luzes e sombras e, busca trazê-la à luz que emana do mistério pascal de Cristo. O sacerdote deve ser um mistagogo, aquele que ajuda o penitente a fazer a experiência do mistério redentor de Jesus na vida e a reencontrar novos caminhos de vida e santidade.

Além do Sacramento da Reconciliação, é imprescindível a participação na Eucaristia, a grande oração da Igreja, momento em que celebramos a nossa páscoa na Páscoa de Jesus.



São Tiago, em algumas linhas, recorda que a fé se expressa em atos concretos:

"Meus irmãos, se alguém diz que tem fé, mas não tem obras, que adianta isso? Por acaso a fé poderá salvá-lo? Por exemplo: um irmão ou irmã não têm o que vestir e lhes falta o pão de cada dia. Então alguém de vocês diz para eles: ‘Vão em paz, se aqueçam e comam bastante’; no entanto, não lhes dá o necessário para o corpo. Que adianta isso? Assim também é a fé: sem as obras, ela está completamente morta". (Tg 2, 14-17)

Leia MaisReze por 15 minutos diante de uma CruzÉ comum ouvir alguém dizer que a Quaresma é tempo de “fazer caridade”. Não é incorreto. Porém, se a nossa caridade termina com a Quaresma, algo vai muito mal e é sinal de uma espiritualidade débil.

O agir caritativo e solidário deve continuar na dimensão da pascalidade de Jesus. Isto é, deve ganhar tonalidade, vigor e estímulo, para que a dimensão pascal da fé cristã torne-se um imperativo ético, porque impõe um olhar crítico à realidade, questionando as estruturas envelhecidas do pecado e da morte. Não se trata de um falso moralismo, sim de um viver angustiado, que interroga o mundo, para ajudá-lo a ser o lugar, onde as pessoas possam plenificar-se humanamente. 

Um exemplo de ação é envolver-se com as propostas da Campanha da Fraternidade, que é uma convocação da Igreja do Brasil, à comunidade de fé a olhar com cuidado certos problemas e desafios, refletir sobre eles e buscar uma ação concreta, à luz da fé, da esperança e da caridade.

A espiritualidade quaresmal se faz seguindo os passos de Jesus. Para isso, é preciso recordar (deixar passar pelo coração) bem de sua pessoa e caminhar com ele, fazer os seus êxodos, sofrer com ele as tentações, as incompreensões, a sua experiência de intimidade com o Pai e com os mais abandonados da sociedade.

Entregar-se, de fato, esvaziar-se para que se faça a vontade do Pai e experimentar a força da Ressurreição como resposta à morte, ao egoísmo, à indiferença e a tudo aquilo que afasta do projeto de realização do Reino na vida humana.

Escrito por
Pe. Rogério Gomes, C.Ss.R. (Foto Deniele Simões JS)
Pe. Rogério Gomes, C.Ss.R.

Missionário redentorista, formado em Filosofia e Teologia, com doutorado em Teologia Moral. Lecionou no ITESP e na Academia Alfonsiana de Roma. Atualmente é Conselheiro do Governo Geral da Congregação Redentorista.

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