O Redação A12 ao vivo recebeu o padre Pedro Cunha para falar sobre o tema: "O passado te prende ou te impulsiona?".
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Você aprende com seus erros ou fica remoendo-os?
Começando o bate-papo, Padre Pedro Cunha afirma que, quando o passado causa sofrimento, geralmente está ligado a feridas e traumas. "Nós não somos pedaços separados por tempo; somos continuidade, desde a gestação até a morte. Nada está desconectado, nem do passado, nem do futuro. Aquilo que a gente projeta, anseia e espera também está conectado ao que vivemos em nosso dia a dia", diz o religioso.
Padre Pedro explica também que criamos uma memória afetiva com aquele passado que vivemos com nossa família. Nós nunca vamos mudar nosso paladar em relação à comida da nossa mãe, por exemplo. A mesma coisa acontece com as lembranças ruins. "Aquilo que nos desagradou em nosso passado, se converterá numa carga que nos acompanhará ao longo de toda a nossa vida. Há todo um caminho de superação, mas as marcas nós as carregaremos para sempre", assinala.
De acordo com o padre, são dois os elementos principais que nos levam a carregar ou não essas marcas, com maior ou menor intensidade.
O primeiro deles é a profundidade. "Uma facada é sempre uma facada. Porém, em cada pessoa, a gravidade é diferente. Como foi, quem cometeu, etc., tudo isso interfere no modo como eu vou superar (ou não) esse trauma. É diferente você ser ferido por uma pessoa que você ama ou por um desconhecido", diz.
"O segundo aspecto é a minha natureza como pessoa. Tem pessoas que encaram numa boa, encaram, superam e pronto. Outras não. Para essas pessoas é muito mais difícil e demorado, por conta da própria personalidade".
Padre Pedro ainda aponta um terceiro fator, que é o ambiente onde a pessoa vive. "Se é um ambiente mais seguro e estável, a superação é facilitada", esclarece.
Guardar ou falar?
"Nunca se guarda coisa podre, porque vai feder", assinala Padre Pedro. O problema, segundo ele, é que a capacidade que a pessoa ferida tem de falar é extremamente reduzida pela própria ferida, pois trata-se de uma ferida em sua própria existência. Somado a isso, é recorrente um sentimento de culpa, onde a própria vítima se sente responsável pro ter se machucado em determinada situação.
Além disso, há também o medo da reincidência ou do descrédito por parte de outras pessoas com as quais a pessoa que se feriu deseja partilhar seu sofrimento. Isso causa, muitas vezes, uma ferida tão grande quanto. "Por exemplo, uma criança que é abusada sexualmente por seu próprio pai. Ela só tem a mãe para desabafar, mas sabe que a mãe ama muito o pai. Então, essa criança às vezes não tem condições de falar sobre o abuso, porque a probabilidade de a mãe acreditar ou não é de 50%", diz o padre.
Ele prossegue dizendo que também ocorre que ela própria às vezes não acredita que aquela pessoa que ela ama tanto tenha sido capaz de machucá-la. Então ela se culpa por, teoricamente, ter "provocado" aquela situação. Por isso, a criança nem sempre verbaliza, mas o próprio organismo sinaliza, com distúrbios comportamentais, alimentares ou outros sintomas. "Expressar é sempre importante", conclui.
Não se deve 'sepultar-se' com alguém que se foi
"Ninguém consegue enxergar que a morte é porta que se abre", aponta padre Pedro. "Esta pessoa agora é plena em sua vida, porque ela agora se reconecta com seu Criador, ao seu Redentor Jesus, e esta pessoa agora tem vida eterna". Ele diz que esta vida precária, que morre, se encerra, mas não se acaba. Ao contrário, se abre numa perspectiva completamente "mais poderosa do que esta que a gente vive aqui. Parece que nós perdemos a pessoa mais importante do mundo, mas não é verdade". Se perde o corpo, a fala, a presença física, mas não se perde o espírito que nos une, o entrelaçamento de almas, a capacidade de conexão com essas pessoas.
O sacerdote faz ainda uma analogia entre as perdas e a transição do sinal analógico para o digital na TV. "O sinal analógico é a vida terrena. O digital é quando a pessoa morre, porque é um sinal límpido, nítido, porque eu não posso mais 'enganar' a pessoa. A nossa conexão é ali. A gente tem os olhos da fé e da eternidade muito melhores do que temos aqui nesta vida", resume.
O tempo é o melhor remédio?
O sacerdote diz que é, mas não deveria ser. "O tempo nos ajuda muito. Em alguns casos, é o único remédio que a gente tem, mas não deveria ser. A gente deveria ter remédios a curto prazo, pra sair das problemáticas da vida. Mas às vezes a gente não tem pessoas, não tem ambiente, não tem forças... só tem o tempo. Mas ele não é um bom remédio em si mesmo, mas sim porque é o que nos resta. Deveria ser somente um recurso para quem não tem recurso. Mas se tenho algo a fazer, devo fazer", explica.
Ele ainda fala do risco de precipitar-se em situações de luto ou doença. "Não se pode abreviar nem prolongar o processo, porque é algo que a pessoa precisa vencer. O tempo é nosso mestre e sempre vai nos ajudar a utilizá-lo corretamente", conclui.
Só conhece o presente quem conhece o passado
Ele diz que nós somos uma coisa só, passado e presente. "Não há como você se entender hoje, sem que você entenda seu passado", afirma. Ele diz que é como quem tem dificuldade com o Português, por exemplo. Se a pessoa não tem uma boa base na escola, terá dificuldades pelo resto de sua vida. Ou então quem tem um sotaque; está na origem da pessoa e ela irá carregá-lo pela vida toda. "Nosso passado está no nosso presente. Escondê-lo ou ignorá-lo é um tremendo erro", pontua.
Para Padre Pedro, também é importante que a pessoa se sinta digna de seguir adiante, não importa o que tenha acontecido no passado e nem a aprovação de outras pessoas. "É como pessoas que um dia tiveram um relacionamento, porém terminaram e entraram cada uma em uma nova relação. É melhor que isso seja de comum acordo, para que cada um possa seguir seu caminho com tranquilidade", finaliza.
.:: Assista abaixo a íntegra da live
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