15 anos sem Dorothy Stang

Há exatos quinze anos morria a Irmã Dorothy Mae Stang, aos 73 anos, em Anapu (PA), vítima do conflito agrário brasileiro. Passada uma década daquele dia 12 de fevereiro de 2005, a memória de Irmã Dorothy continua viva e atualizada em cada projeto e ação desenvolvidos por aqueles que herdaram o seu legado.

Irmã Jane Dwyer, missionária da mesma congregação da Irmã Dorothy, que conviveu com a religiosa e mora em Anapu (PA), mantendo o trabalho na região desde a morte da companheira, falou ao A12 por telefone sobre a realidade dos projetos e ações que continuam sendo desenvolvidos com muita luta pelo povo paraense.

Shutterstock

Irmã Jane fez questão de frisar em sua fala que a luta da Irmã Dorothy foi assumida pelo povo de Anapu e região ,e contou em números o impacto do testemunho e do martírio da religiosa na vida deste povo. 

"Quando ela morreu, existiam 35 Comunidades Eclesiais de Base. Hoje temos 85 e continuam aumentando. Das 20 famílias que existiam no PDS Esperança, passamos a ter 281. Agora já temos 70 casas construídas, 7 escolas e um 1 posto de saúde, que está fechado, mas foi construído ali. Temos também uma fábrica artesanal de chocolate, feito com o cacau produzido pelo povo e um grupo de mulheres que trabalham com artesanato. Tivemos ainda outros avanços. O povo se reúne todo mês para discutir seus problemas e seus direitos. Temos aqui todo tipo de lavoura e também atuamos fortemente no reflorestamento", detalhou a religiosa.

Irmã Jane disse ainda contar com uma campanha de reflorestamento que tinha por objetivo o plantio de um milhão de árvores, número que, segundo, ela já foi ultrapassado, e esclareceu que a iniciativa continua porque a população entende que o reflorestamento é uma "maneira de viver" e uma prática que "comunga com a natureza". Dentre os inúmeros avanços, a religiosa também falou sobre a realidade desafiadora na região. Somente em Anapu, contam-se 700 famílias que estão em terras sem regularização fundiária. Entre eles, agricultores que mesmo frente a ameaça dos fazendeiros e madeireiros ilegais locais, continuam colhendo e vendendo sua produção.

No Brasil, segundo levantamento agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a agricultura familiar é responsável por 75% dos alimentos que vão para a mesa do brasileiro. Pelo menos, cinco milhões de famílias vivem da agricultura familiar e produzem a maioria dos alimentos consumidos no país. Diante do valor da terra para essas famílias, a religiosa conta um dos projetos que vem ganhando força na região, o Ensino Médio Modular, que leva a escola até o interior da floresta, possibilitando que os jovens não abandonem suas terras para completar os estudos. Na entrevista, a religiosa citou algumas vezes o que une o povo em Anapu. "Aqui é um lugar que acolhe os pequenos. Aqui temos uns aos outros". 

Na véspera de sua morte, Irmã Dorothy ligou para o seu irmão, David Stang [confira a entrevista na Rede Unisinos], e contou sobre a visita que faria a 12 famílias de agricultores no PDS Esperança, que tiveram suas casas e suas colheitas queimadas intencionalmente, e que estava um "pouco nervosa" devido às ameaças que recebia. Quando David disse para ela não ir ao encontro das famílias, Irmã Dorothy não hesitou em dizer: 

Tomaz Silva/ Agência Brasil

“Eu não posso fugir do povo que eu amo”.

No dia seguinte, às 7h30, Irmã Dorothy foi morta covardemente por defender a floresta e o seu povo.  

Missa em memória da Irmã Dorothy

Em memória da missionária Irmã Dorothy Stang, o bispo do Xingu (PA), Dom Erwin Krautler, presidiu na quinta-feira, 12/02/2015, às 10h, uma Missa pelos 10 anos do martírio da religiosa. A celebração foi realizada no Centro São Rafael, em Anapu, onde está o túmulo da religiosa. A programação constou ainda de um almoço comunitário e uma conversa com autoridades dos governos municipal, estadual e federal.

No dia seguinte, dom Erwin seguiu em caminhada pelas diversas comunidades de Anapu, para fazer memória da luta de Irmã Dorothy.