Por Redação A12 Em Opinião

Redução de imputabilidade: solução para a violência?

Na sociedade e no cenário político brasileiro estão debatendo-se temas e questões muito delicadas para o nosso povo: uma delas é a violência de crianças e adolescentes.

Estamos todos preocupados com o aumento assustador da violência, sobretudo, dos jovens e adolescentes e também das crianças. Precisamos mesmo aproveitar esse momento histórico para debater com seriedade esta problemática das violências nas  suas causas profundas. Diferentes são as propostas: alguém propõe redução de imputabilidade, mais cadeia, mais repressão, mais polícia, mais punição com pequenas diferenças.

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Outros acreditam serem necessárias soluções mais complexas e profundas  para alcançar as causas verdadeiras: família, educação, escola, profissionalização, políticas públicas, oportunidades. Esta é a tragédia. Precisamos repensar a educação no Brasil e nossa sociedade que perdeu valores fundamentais. Os adolescentes  mais expostos à tentação do crime, na maioria são negros, pobres, sem família ou com família quebradas e ausentes, sem escolarização, sem perspectivas e futuro, fácil isca do narcotráfico e da criminalidade. Nós afirmamos: violentos porque não amados e rejeitados. Muitos são usuários de drogas. Precisam de tratamento de saúde mental, psíquica e espiritual e de perspectivas para o futuro: não de cadeia. A droga é tentativa ilusória de se consolar e encarar sofrimentos. Cadeia não cura traumas e carências e não resolve a violência, aliás, aumenta a revolta. Adolescentes com adultos criminais? Insanidade coletiva; escola de crime e de desumanização!

 

A redução da imputabilidade não resolve a situação da violência dos meninos, ao contrário, aumenta a violência e criminalidade. Porque redução até 16 anos e não 14 e não dez?  

A mídia está envenenando a opinião pública e fazendo uma campanha de ódio contra crianças e adolescentes vistos como monstros e ameaça, fazendo deles os maiores responsáveis da violência no Brasil. Isso não é absolutamente  verdade: embora esteja em aumento a violência infanto-juvenil. O que sinaliza a violência de crianças e adolescentes? Nos gritam que precisam de pai e mãe, de  família, de amor, de oportunidades e futuro. Nossas crianças não estão bem, sofrem muito, no corpo, no coração e na alma. Não são mais acolhidos como presente e dom, não são amados. Nunca a sociedade adulta os tratou tão mal como agora. Eles nos devolvem aquilo que recebem. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é acusado de ser culpado da violência, pois crianças e adolescentes não seriam punidos. Os centros de ressocialização-cadeias para crianças e adolescentes estão cheios e lotados, mas não funcionam bem e não colaboram para uma mudança dos adolescentes infratores e custam cerca de 5 mil por adolescente. O ECA contempla punições para infratores em certos casos maiores de que para adultos. Mas nem isso  tem eficácia. O ECA deve ser revisto, pois a sociedade mudou nestes 25 anos sem porém perder seus valores  perenes e conquistas. Eu acrescentaria no ECA um direito: direito a ser filho e a ser amado. E direito a aprender a amar. Para ser feliz.

A redução da imputabilidade não resolve a situação da violência dos meninos, ao contrário, aumenta a violência e criminalidade. Porque redução até 16 anos e não 14 e não dez? Conheço meninos no crime com menos de dez anos. Não têm dados e motivações sérias para a escolha desta idade. Precisamos botar na cadeia bebês quando nascem: já choram!

Por experiência afirmo que o menino não deixa de fazer besteira por ser punido com lei mais duras ou até assassinado.  Na maioria das vezes realiza crimes quando está drogado. Ele, se não amado e sem perspectivas, quer morrer mesmo e não se importa com nada. Não amar um menino é a maior violência e é matá-lo todos os dias. Se a cadeia resolvesse, o Brasil deveria ser um paraíso!

 

"Reduzir a imputabilidade é abandonar nossos filhos mais feridos quando mais precisam, é desistir deles, é declarar a derrota da família, da escola, da sociedade, das igrejas, do governo e de todos nós". 

A redução da imputabilidade é de fato criminalização da pobreza: punirá somente filho de pobre ou de família quebrada, pois filho do rico terá dinheiro e advogados para se libertar. Nossas cadeias são cheias de pobres negros. O parlamento e Senado deveria aumentar punição aos adultos que usam crianças e adolescentes para todo o tipo de crime.

Reduzir a imputabilidade é abandonar nossos filhos mais feridos quando mais precisam, é desistir deles, é declarar a derrota da família, da escola, da sociedade, das igrejas, do governo e de todos nós. É declarar a falência da educação no Brasil. Sociedade e governos abandonam seus filhos mais doentes e  necessitados: teremos um futuro sempre mais violento e obscuro. Uma sociedade que não cuida dos seus meninos mais vulneráveis e os abandona é uma sociedade decadente e doente que não terá futuro e que pagará caro por tudo isso.

A violência não se vence com outra violência. Cadeia não é útero que aconchega. Devemos proporcionar a  nossos filhos “úteros vivificantes”: família, escola, profissão, lazer, trabalho, bairro, comunidade, cidade acolhedora. Nossa sociedade e as TVs estão  destruindo a família (ideologia do gênero). Nossos meninos somente colocam em prática aquilo que na mídia pregamos todos os dias: ter prazer e poder. Mas para isso matam, estupram, roubam e nós, hipocritamente, fingimos estar escandalizados e os criminalizamos.

Precisamos de criatividade e de esperança: inventar novos caminhos: a cadeia e  a violência é o velho e não resolve.

A sociedade, o governo, as igrejas e as tradições religiosas devem se sentir responsabilizadas e questionadas, devem se unir em rede para um mutirão contra a violência e para a defesa da vida e propostas eficazes. Cadê nossas propostas vivificantes?

Precisamos investir mais na educação e numa educação com valores, regras e limites. Os meninos precisam de limites e de serem mais  responsabilizados. Isso deve ser feito na família e na escola. Precisamos investir em profissionalização e inserção no mercado de trabalho, políticas públicas de inclusão. Os  jovens pobres são sempre mais excluídos  e invisíveis. Refugiam-se nas cracolândias e no narcotráfico que os acolhe sempre. Precisamos acreditar na bondade do ser humano ferido, mas não destruído. Cada ser humano pode se regenerar e se recuperar. A Casa do Menor São Miguel Arcanjo, com quase trinta anos de experiência, testemunha isso. Todos são recuperáveis. Se não os recuperamos é porque cansamos de amar ou não temos as condições objetivas para responder as necessidades e gritos deles.

O governo deve apoiar ONGs que resgatam meninos e não abandonar como faz. O governo não faz e não sabe fazer, mas não ajuda quem faz e sabe fazer, condena a  fechar obras sociais, sobretudo, se com inspiração religiosa. Precisamos ser mais humildes. Precisamos uns dos outros. Somente em rede seremos vitoriosos. O estado não poder ser o único sujeito e gestor  do social. Deve ser leigo (não identificado com nenhuma denominação religiosa), mas não laicista (excludente da dimensão religiosa). A dimensão transcendente é constitutiva do ser humano, não facultativa, contudo, é  verdade que tem experiências religiosas alienantes e perigosas!

Precisamos parar, refletir, repensar toda  nossa sociedade e seus valores, não reagir em maneira primitiva e instintiva.

Porque tanta raiva dos adultos contra os meninos? Jung – psicólogo suíço –, explica e fala do arquétipo criança, arquétipo forte. A força da criança é enorme. Não é definida, ainda em formação, frágil, exposta, perigo potencial. Nos dá medo, nos questiona todos, nos desarma, nos faz sentir culpados.

 Melhor jogar a culpa nele!

Se crianças fossem cachorros o mundo gritaria ao escândalo e se levantaria para proteger os “animais crianças”. Pena que nossas crianças são apenas seres humanos!

Algo de novo deve acontecer.

Porque não se fala mais em desarmamento? Os meninos matam usando armas que adultos fabricaram e colocaram em suas mãos!

E porque não repensar  todo o sistema de luta as drogas que não funciona? A quem interessa? Cadeia não é novo e  não resolve: se resolvesse o Brasil seria um paraíso: quarto país com mais cadeia no mundo, mas país também mais violento do mundo e sempre mais violento. Os países que investiram em mais cadeia para adolescentes estão voltando atrás. A quem interessa mais cadeia? É lobby econômico?

Nós temos de fato a pena de morte: 180 assassinados em media por dia. Muitas vezes é o estado que mata.

Os filhos do Brasil não amados são frutos de um “aborto comunitário” que vem de longe: precisamos fazer um “parto comunitário”. Devemos ser “útero comunitário” que faz reerguer  fetos deformados, pois não amados  e não cuidados. Sermos juntos (família, igrejas, sociedade, governos) útero que acolhe, alimenta, afaga, sara, regenera  e faz crescer. Meninos de rua dormem em posição fetal: procuram o útero, voltar ao útero.

Aquilo que fizerem a um destes pequeninos a Mim o fizestes (Jesus)… aqui o desafio. Colocaríamos Jesus na cadeia? Ele incomoda! Por isso foi morto... Vamos enjaulá-lo e matá-lo de novo?

Lembro que o Brasil é (era) o país mais religioso!

O que acontece conosco?

Padre Renato Chiera
Fundador da Casa do Menor São Miguel Arcanjo

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