Por Marcus Eduardo de Oliveira - Jornal Santuário Em Artigos

Alinhado à qualidade de vida

A ciência econômica estabeleceu, grosso modo, que o consumo é sinônimo de progresso. Sendo assim, pelas lentes da economia neoclássica, a posse material torna-se, de certo modo, objetivo final – o bem-estar, por essa maneira, é então alcançado.

Para seguir essa proposta anacrônica, e realizar, por consequência, o “progresso” de todos via consumo, a receita econômica tradicional se põe a afirmar que basta fazer a economia produzir mais bens e serviços que esse crescimento excessivo chegará para todos em termos de mais produtos, facilitando assim o acesso às coisas materiais.

Percebe-se com isso que para a teoria econômica convencional o que mais importa é promover o aumento da quantidade de produtos colocados à venda.

Para isso, acelera-se, sem critérios em relação à natureza, a necessidade de fazer a economia crescer fisicamente.

O fato a ser lamentado diante dessa conduta é que a teoria ortodoxa convencional não “entende” – ou não quer entender – que quantidade (crescimento físico de uma economia) não significa qualidade (desenvolvimento, bem-estar, melhoria do padrão de vida).

Faz-se necessário, conquanto, o real entendimento que desenvolvimento, além das definições conceituais plenamente conhecidas, significa ainda organizar socialmente a economia para efetivar o acesso ao mínimo indispensável para o bem viver. Por esse prisma, o outro nome do desenvolvimento é qualidade de vida.

Em matéria de qualidade de vida, para aqueles que não foram infectados pelo “vírus do crescimento econômico”, parece não haver dúvidas que o mais importante não é atingir o crescimento puramente em termos quantitativos, mas sim alcançar a ordem dos fatores qualitativos, ou seja, na acepção do termo, o desenvolvimento.

Esse desenvolvimento aqui referenciado passa, antes de qualquer coisa, por respeitar os limites dados pela questão ecológica, levando-se em conta as leis da natureza.

Para isso, não é mais possível obedecer cegamente à ordem que impera na macroeconomia tradicional. A lei básica dos compêndios macroeconômicos, endossada pelas teorias keynesiana e neoclássica, sempre recomendou, como matéria de política econômica capaz de alavancar uma nação, a busca pelo aumento incessante do consumo, visando atingir com isso elevadas taxas de crescimento – o “nome falso” da prosperidade.

Isso está envolto na estapafúrdia ideia que se tornou verdadeira mania das economias modernas – o crescimento econômico. Dito de outra forma é a growthmania, nos dizeres do economista inglês Ezra Mishan que consagrou e criticou esse termo na obra The Costs of Economic Growth, de 1967.

Para combater esse tipo bem consolidado de pensamento, o economista chileno Manfred Max-Neef, com muita propriedade, vem argumentando em prol da implantação de novos modos de produção econômica em que as pessoas sejam alçadas ao primeiro plano, em lugar das mercadorias, condição em que o desenvolvimento seja a premissa, e não o crescimento, em que a qualidade seja realçada, e não a quantidade.

Para Max-Neef, o crescimento econômico está alinhado à qualidade de vida das pessoas até certo ponto. Ultrapassado esse ponto, não haverá ganhos, mas perdas consideráveis; não haverá benefícios, mas custos, sendo o principal deles a deterioração da qualidade de vida.

Essa é a base teórica da chamada “Teoria do Umbral” propugnada por Max-Neef que aponta dedo em riste para os custos excessivos do processo produtivo a qualquer preço.

Custos esses, por sinal, que não são quantificados pela atividade econômica, mas são sentidos por todos: poluição das águas, do ar, dos solos, degradação ambiental, emissão de gás carbônico para se produzir e transportar mercadorias para lugares cada vez mais distantes.

Para Manfred Max-Neef, uma economia “saudável” se sustenta em seis postulados:

1. A economia está para servir as pessoas, e não as pessoas para servir a economia.

2. O desenvolvimento se refere a pessoas, e não aos objetos.

3. O crescimento não é o mesmo que desenvolvimento, e o desenvolvimento, por sua vez, não precisa necessariamente de crescimento.

4. Nenhuma economia é possível à margem dos serviços que prestam os ecossistemas;

5. A economia é um subsistema de um sistema maior e finito, que é a biosfera, e, portanto, o crescimento permanente é impossível.

6. Nenhum processo ou interesse econômico, sob nenhuma circunstância, pode estar acima da referência à vida.

Dessa forma, percebe-se claramente que a realidade econômica atual, avalizada pelos manuais econômicos tradicionais, se encontra completamente oposta a esses princípios.

Marcus Eduardo de Oliveira é economista especializado em Política Internacional

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