Por Roberto Girola Em Artigos

Vamos brincar de boneca ...

Qual é a mulher que quando menina não ganhou uma linda boneca? Desde então houve um pressentimento oculto: o mundo esperava que ela um dia pudesse brincar de ser mãe. As mulheres que não podem ter filhos frequentemente se sentem mutiladas e são estimuladas a se submeter a tratamentos caros e difíceis para poder engravidar. No fundo essa é também, na maioria das vezes, a expectativa do parceiro.

Mas, e quando a linda bonequinha se transforma em um bebê real? “O rei” chegou e se apoderou do corpo da mulher, que começa a sofrer transformações cada vez mais visíveis e nem sempre aceitas como algo esteticamente agradável. Isso sem contar as mudanças hormonais, o mal-estar, os enjoos, as inseguranças e o medo. Sim medo de não dar conta do parto, do bebê, do sofrimento...

Quando o bebê nasce, por um lado, é um alívio, mas aos poucos ele toma conta da casa e da vida da mulher e, se ela tiver sorte, também da vida do marido que, às vezes, reclama...

O processo inicial que permite ao bebê se desenvolver como sujeito é extremamente delicado e complexo, como várias vezes foi frisado nos meus artigos. O bebê, sobretudo nos primeiros seis meses, é por natureza narcísico, inicialmente nem tem condições de entender que a mãe, ou quem cuida dele, não é ele. O bebê não demonstra gratidão. Aliás, poder viver esse narcisismo é a condição para que ele possa se desenvolver de forma saudável do ponto de vista psíquico... Mas, e a mãe?

O que pretendo ao esboçar esse quadro nada romântico não é desencorajar a experiência da maternidade, mas é permitir às mulheres que se tornaram mães poder viver sem culpa suas ansiedades e também seu “ódio” pelo bebê. Sei que ódio é uma palavra forte, que incomoda, mas o inconsciente não é “bem-comportado”, ele é instintivo e portanto os sentimentos que se aninham nele são primitivos e, às vezes, assustadores.

É importante que as mães possam entrar em contato e processar essa raiva que às vezes sentem do bebê, pois ela é absolutamente normal e, se identificada e aceita, ela não vai prejudicar o bebê, pois a mãe poderá processá-la adequadamente, se permitindo pedir ajuda, reconhecendo seus limites físicos e psíquicos, sem que por isso ela deva se sentir um monstro.

O fato da depressão pós-parto ser um fenômeno estatisticamente comprovado com alta incidência e da depressão profunda pós-parto ocorrer, embora com menor incidência, demonstra que a mãe precisa de um apoio total e irrestrito, sobretudo de seu parceiro, para que ela possa encarar com relativa serenidade a maternidade.

 

Roberto Girola é psicanalista e terapeuta familiar

Acesse: www.robertogirola.com.br

 

 

Escrito por
Roberto Girola
Roberto Girola

Psicanalista e terapeuta familiar

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