Por Deniele Simões Em Notícias Atualizada em 30 OUT 2019 - 16H32

Cultura plus size propõe ruptura dos padrões de beleza

O crescimento do mercado de roupas plus size – que compreende peças a partir do tamanho 50 – é de 3% ao ano. O segmento cresce em ritmo muito maior do que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

De acordo com o presidente da Associação Brasileira do Vestuário (Abravest), Roberto Chadad, são dois milhões de peças exclusivas e os empresários do setor vêm trabalhando para normatizar os tamanhos das confecções para os públicos masculino e feminino.

Esses números vão ao encontro do aumento de pessoas com sobrepeso. Estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, até 2020, 30% da população brasileira estará com sobrepeso.

Apesar do crescimento, o padrão na moda ainda é ditado pelo chamado corpo “sarado”. “Quem tem uns quilos a mais ainda sofre com a pouca oferta de confecções que vendam roupas bacanas e adequadas para o seu corpo, ou seja, que caia bem”, aponta a personal stylist Eliane de Rezende Brechtbuhl, da consultoria de estilo E.pia.

Segundo Eliane, embora algumas ações da mídia já demonstrem as curvas das brasileiras através de campanhas voltadas à “mulher real”, hoje o padrão da moda ainda é o da magreza. “Os estilistas ainda entendem a mulher magra como os melhores ‘cabides’”, justifica.

A psicóloga do Hospital viValle, em São José dos Campos (SP), Paula Magalhães Marques, acredita que o paradigma de que ser belo é estar magro não deve ser mudado, mas é preciso considerar quem está um pouco acima do peso com outros olhos.

O segmento plus size de vestuário tem dado esse olhar especial àquelas pessoas que estão acima do peso. Para a psicóloga, que atua com pacientes pós-cirurgia bariátrica, o crescimento desse setor é positivo. “Acredito ser fundamental para que as pessoas obesas possam perceber que a vida está repleta de possibilidades, que é possível estarem bem independente da forma física, que há beleza no que é diferente ao que nos é imposto como padrão”, salienta.

Quebrando paradigmas

A pessoa que tem uns quilos a mais normalmente demonstra baixa autoestima diante dos mais magros e da chamada ditadura da magreza. “É como se não se encaixassem em um padrão sociocultural que restringe as pessoas à forma, ao aspecto aparente e não ao conteúdo”, explica Paula.

A promotora de eventos e blogueira Renatha Silva lamenta o preconceito que os mais gordinhos enfrentam no dia a dia. Ela cita como exemplo a personagem Perséfone, da novela Amor à Vida (Rede Globo), vivida pela atriz Fabiana Karla, que sofre bullying por estar acima do peso. “Na verdade, a gente até vive o que está passando ali na tevê”, conta.

Bonita, vaidosa e bem resolvida em relação aos quilos extras, desde 2011 Renatha organiza concursos de beleza e atividades para levantar a autoestima das gordinhas.

O concurso mais recente foi o Miss Plus Size Vale do Paraíba 2013, que reuniu 22 candidatas do Vale, no interior de São Paulo. Para participar, era preciso usar manequim acima de 46, ser maior de 18 anos e residir em uma das cidades da região. Ao todo, 174 mulheres se inscreveram, número pelo menos três vezes maior do que a edição do ano anterior.

Na década de 1990, Renatha venceu o concurso A mais bela gordinha, na cidade de Aparecida (SP). A partir de então, ganhou notoriedade e popularidade, passando a defender as causas das mulheres consideradas acima do peso.

Frequentemente, a promoter realiza tardes de beleza reunindo mulheres gordinhas. Os encontros proporcionam desfiles de roupas de grifes do segmento plus size, book fotográfico e tratamentos de beleza. “Na verdade, não há pretensão de descobrir modelos. Pode até acontecer, mas o foco é fazer com que as meninas sintam-se bem”, pontua. Ela relata que a mudança de comportamento é visível nas participantes e vai desde o aumento da autoestima e autoconfiança até a melhora nas relações interpessoais.

Segundo a psicóloga Paula Marques, a baixa autoestima em algumas pessoas gordas acontece em função da dificuldade de aceitação da própria condição. Ações como as promovidas por Renatha são fundamentais para o processo de autoaceitação, porque trabalham pontos como a aparência. “Sentir-se bem com a própria aparência é um aspecto muito importante para o equilíbrio emocional, porém, mais importante do que qualquer coisa é sentir-se bem consigo mesmo de uma forma geral, valorizando nossas potencialidades, possibilidades e não apenas nossos ‘defeitos’”, ressalta Paula.

Independentemente do modelo de magreza imposto pela sociedade, a psicóloga acredita ser necessário encarar o que a gordinha chama de “defeito” como nova possibilidade de melhoria. “Aquilo que incomoda, que gostaria de trabalhar para melhorar, gostaria de fazer diferente”, justifica. O importante, segundo ela, é priorizar a qualidade de vida acima de tudo e trabalhar a percepção de que a vida não se resume ao aspecto exterior.

Na avaliação de Eliane Brechtbuhl, não se pode ser ingênuo a ponto de ignorar os padrões de beleza. Porém, é necessário que os gordinhos valorizem-se e acreditem em si mesmos. “O fundamental é buscar a saúde sempre e a aceitação do próprio corpo”, ressalta. Agindo assim e melhorando o que incomoda, a dica da especialista é respeitar-se, não buscando ideais inatingíveis de beleza.

Mercado oferece diversidade de produtos

Para a personal stylist Eliane Brechtbuhl, é fundamental buscar saúde e aceitação do próprio corpo

O mercado de vestuário está adequando-se às novas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (Abnt), que preveem trazer informações sobre peso, estatura, comprimento, dentre outros itens.

De acordo com Roberto Chadad, da Abravest, a padronização das roupas masculinas já foi concluída e agora trabalha-se nos padrões femininos. A padronização seguirá o que já acontece em países como Japão e algumas nações europeias.

Para a blogueira Renatha Silva, o comportamento do mercado em relação aos gordinhos já pode ser sentido. “Graças a Deus está mudando muito, porque as empresas estão investindo na moda e não na roupa da gorda”, opina.

Ela recorda que, até algum tempo atrás, as roupas disponíveis para as mais cheinhas eram justamente roupas de senhoras. “Era o que as grifes faziam para elas e hoje em dia elas podem usar saia, shorts, vestido – claro que com muita decência”, diz.

A miss plus size Vale do Paraíba, Gisselly Paulina Faria, a Gi Faria, avalia de forma muito positiva o crescimento do mercado plus size. “Fico feliz por ver a indústria da moda esforçando-se para colocar no mercado opções alegres e bonitas para quem busca estar de bem com vida, independentemente do peso.”

Para Gisselly, a mudança no mercado traz uma democratização da moda, já que antigamente havia poucas opções de roupas e de lojas no segmento.

Vida de miss plus size

A vendedora, de 32 anos, foi a grande vencedora do concurso Miss Plus Size Vale do Paraíba 2013, entre 22 candidatas. Com 114 quilos distribuídos em 1 metro e 71 centímetros, a moça de Guaratinguetá (SP) é dona de uma beleza que hoje começa a ser reconhecida no segmento da moda.

Apesar da confiança e da autoestima elevada, a vida de Gisselly não foi sempre um mar de rosas. Desde criança enfrentou preconceito por ser gordinha. “Sempre tem aqueles que fazem brincadeiras de mau gosto, que hoje chamamos de bullying, mas tirava de letra”, revela. Ela sempre levou os comentários desagradáveis na brincadeira, mas até hoje ainda pronunciam frases preconceituosas, do tipo: “você tem um rosto lindo” ou “por que não tenta fazer uma dieta?".

A disponibilidade para participar de concursos de beleza apareceu após insistência de sua irmã. Tudo começou quando uma amiga ouviu o anúncio do primeiro concurso plus size em Guaratinguetá, em 2011. “Eu logo disse que não iria, porque tinha vergonha e não aceitava a minha forma física”, relembra. Mesmo contra a vontade de Gisselly, a irmã fez a inscrição escondido.

Gi Faria não só venceu o Miss Plus Size Guaratinguetá como o Plus Size Vale do Paraíba, no ano passado. Também em 2013, participou do Miss Brasil Plus Size 2013, em Brasília (DF), onde representou a cidade de Atol das Rocas. Em 2014, a miss vai marcar presença no concurso Miss São Paulo Plus Size. Ao participar de todos esses concursos, Gisselly ganhou muito mais autoconfiança do que tinha antes. “Todos os dias, ao levantar e ao me deitar, afirmo que sou importante, capaz, que tenho valor, sou inteligente, carinhosa e espero muito de mim”, ressalta.

Para a miss plus size, não há obstáculo que não possa ser vencido e, a partir de seus atos, ele acredita que pode ajudar outras mulheres gordinhas a se aceitarem do jeito que são. Isso não significa fazer apologia à obesidade. “Pelo contrário”, diz. Segundo Gisselly, o excesso de peso causa inúmeras doenças e uma péssima qualidade de vida. Por isso, a proposta é cuidar-se. “A minha proposta é viver bem com o corpo que você tem, cuidando da saúde, mas ainda mais da autoestima.”

A receita para tudo isso, segundo ela, é fé em Deus. “Ele soprou, pisquei os olhos e a minha vida toda se fez diferente”, conclui.

Dicas de especialista

A personal stylist Eliane Brechtbuhl destaca que as mulheres plus size podem e devem andar bem vestidas. Basta seguir algumas dicas:

Blusas – Escolha as mais soltinhas (tipo morcego ou boca de sino), que não repuxam na hora de movimentar os braços. Se quiser disfarçar os braços, use blusas com mangas. Aposte em blusas transpassadas, porque escondem os pneuzinhos. Também dê preferência aos decotes em V e túnicas, que disfarçam o tronco.

Jeans – Opte sempre as lavagens de tom mais escuro e modelagem de corte reto, deixando a barra tocar no peito do pé. A técnica alonga a silhueta.

Casacos – adote o uso de casacos com modelagem sempre reta e comprimento na altura dos joelhos. Afinal, peças compridas ajudam a disfarçar os pneuzinhos.

Saias e vestidos – Aposte em saias e vestidos nos modelos evasê, que disfarçam os quadris sem marcá-los. Peças com recorte em A e cintura mais alta também favorecem a silhueta.

Calçados – Use sandália ou sapato de salto alto, que ajudam a “enxugar” as medidas, já que passam a impressão de pernas mais finas. Tome cuidado com os saltos muito finos, porque desequilibram a silhueta e não dão tanta sustentação ao corpo.

Cores e listras – Aposte em cores mais escuras, como preto, marrom, cinza-escuro, verde-escuro, azul-marinho e roxo. Peças com pequenas estampas e fundo escuro também são bem vindas. Já as listras podem ser grandes inimigas ou aliadas perfeitas. Aposte apenas nas verticais, que alongam a silhueta.

Acessórios – Invista em belos colares, principalmente os alongados e compridos, que criam uma linha na frente do corpo, alongando-o. De preferência às bolsas grandes que, além de estar na moda, “enxugam” a silhueta.

Colo em evidência – Deixar o colo à mostra, mas sem vulgaridade, é uma arma poderosa para quem está acima do peso. A técnica desvia a atenção da famigerada barriguinha.

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