O arcebispo metropolitano de Campinas (SP), dom Airton José dos Santos, conta ao JS as novidades relacionadas ao Acordo Brasil – Santa Sé.
O acordo foi promulgado pela presidência da República em 2010 e, desde então, tem passado por um processo de implementação e um trabalho contínuo de divulgação junto aos leigos e religiosos.
Dom Airton, que é membro da Comissão Episcopal para a Implementação do Acordo Brasil – Santa Sé, criada em 2011, explica como o acordo tem refletido nas relações entre a Igreja, o governo e a sociedade.
Jornal Santuário de Aparecida – Por que o Acordo Brasil – Santa Sé é importante para a Igreja Católica?
Foto de: Deniele Simões / JS
"O Acordo Brasil - Santa Sé delineia a personalidade
jurídica da Igreja no Brasil"
Dom Airton José dos Santos – Porque delineia a personalidade jurídica da Igreja no Brasil. A Igreja no Brasil não é uma associação, ONG ou grupo de interessados. Ela tem uma personalidade jurídica estável, já reconhecida por lei desde o governo provisório da República, em 1889.
Depois, com o passar do tempo, isso foi sendo deixado de lado. As preocupações com o passar do tempo na história davam conta de relações bilaterais. Acompanhamento das forças armadas, um assunto ou outro, mais de caráter de relacionamento internacional do Brasil com a Santa Sé. Porém, nunca se chegou a algo mais denso.
JS – Em que circunstâncias o acordo surgiu?
Dom Airton – Nos últimos tempos, a Igreja fez o esforço de pedir ao governo brasileiro que pensasse de modo mais efetivo nas relações diplomáticas e jurídicas da Igreja Católica com a federação brasileira.
Esse acordo foi implementado, estudado e avaliado. Toda a discussão passou pelo Senado, pela Câmara dos Deputados e, com a aprovação de tudo isso, o governo brasileiro e a Santa Sé assinaram o acordo, que foi promulgado pelo presidente Lula, à época. No início daquele ano de 2010, se não me falha a memória.
Com a promulgação, ou seja, com a efetivação desse relacionamento, os artigos do acordo se transformaram em lei ordinária no país. Fazem parte da legislação do país.
JS – A negociação para a aprovação foi difícil?
Dom Airton – A dificuldade do itinerário é questão de tempo, de protocolo, de agenda. De fato, não aconteceu algum problema maior que esse. O trâmite foi feito tranquilamente.
Mas o acordo é sempre passível de revisão e, de vez em quando, aparece uma questão que deve ser revisada, retomada.
A proposta visa ao relacionamento jurídico tranquilo entre dois Estados, que são o Brasil e o Vaticano, que são dois órgãos, duas entidades soberanas de caráter internacional. E a Igreja Católica aqui no Brasil não é apenas uma religião. É a religião católica, é o anúncio do Evangelho, é a vida cristã que nós propomos. Mas ela carrega também essa carga de ser uma instituição no mundo, na sociedade. Visível, regulamentada e reconhecida.
JS – Como o acordo reflete nas relações entre a Igreja e a sociedade, de modo prático?
Dom Airton – Estamos fazendo a implementação desse acordo no Brasil diante de cada circunstância. Por exemplo. A questão do reconhecimento das sentenças estrangeiras dos tribunais da Igreja Católica espalhados pelo Brasil. Tribunal Eclesiástico e a sentença que é reconhecida pela Santa Sé.
Essas sentenças, de nulidade matrimonial, por exemplo, já são reconhecidas no Brasil pelo Supremo Tribunal de Justiça como sentenças objetivas, válidas e já temos precedentes agora. O Brasil já reconheceu, se não me engano, duas sentenças estrangeiras relacionadas à nulidade de matrimônio e, portanto, transformou essas sentenças em divórcio. Sem fazer aquele caminho que normalmente se faz aqui no Brasil. Simplesmente o governo brasileiro, o Tribunal de Justiça reconheceu a sentença de um tribunal da Igreja Católica.
Temos também – e isso, portanto, já está encaminhado – o reconhecimento dos títulos acadêmicos. Os padres e leigos que fazem um curso, por exemplo, em universidades romanas ligadas à Igreja têm seus títulos reconhecidos no Brasil.
A questão ainda um pouco pendente e que depende de alguma ação do próprio governo – porque existe um processo contrário – é o ensino religioso nas escolas públicas. Isso está no Supremo, que precisa se manifestar.
E tem tantas outras coisas. Questão tributária, questão trabalhista. Uma série de aspectos da vida da Igreja no país que devem ser regulamentados. Esses elementos devem ser regulamentados para que a Igreja no Brasil exista tranquilamente como uma entidade de personalidade jurídica própria, reconhecida, sem dificuldades de relacionamento jurídico com o Estado brasileiro.
JS – O que está sendo feito para que os leigos e religiosos tomem conhecimento sobre os pontos tratados pelo acordo?
Dom Airton – Um dos aspectos é passar adiante para as pessoas interessadas no conteúdo do acordo. Estão sendo realizados pelo Brasil afora, através das Pontifícias Universidades Católicas (PUCs) e de outras instituições, simpósios, aprofundamentos e debates sobre o acordo.
Já foi realizado, no Rio de Janeiro, um estudo com os administradores e advogados que tratam de assuntos da Igreja e os leigos que trabalham administrando os bens da Igreja. Houve uma participação muito boa.
Isso será feito durante muito tempo, porque queremos ajudar as pessoas a compreender o acordo.
Esse trabalho é feito através das PUCs, dioceses, instâncias próprias das igrejas e da Conferência dos Religiosos do Brasil, para que as pessoas tenham mais conhecimento.
No ano passado foi feita a publicação de uma nova edição brasileira do Código de Direito Canônico, já com as regras do acordo.
Além disso, há vários livros relacionados ao tema e até estudantes fazendo teses, ou de mestrado, ou de doutorado, sobre o acordo.
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