A Comissão Pastoral da Terra (CPT) celebra 40 anos de existência em 2015. Um Congresso Nacional, realizado em Porto Velho (RO), em meados de julho, marcou as comemorações oficiais.
O JS conversa com o presidente da CPT e bispo de Balsas (MA), dom Enemésio Lazzaris, que analisa a história e os principais desafios do organismo.
Além de rememorar o contexto em que a CPT foi fundada, dom Enemésio fala sobre questões salutares, como a reforma agrária, a agricultura familiar e a necessidade de humanização do agronegócio.
Foto de: Deniele Simões / JS
Para dom Enemésio, discurso sobre reforma agrária
é eleitoreiro, desde Fernando Henrique, passando
por Lula e Dilma, mas piora em função da presença
de Kátia Abreu no ministério da Agricultura
Jornal Santuário de Aparecida – Em 2015, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) completa 40 anos de existência. O que há a se comemorar e quais os desafios para os próximos anos?
Dom Enemésio Lazzaris – Muita coisa boa precisamos comemorar nessas quatro décadas. Exatamente no dia 22 de junho, celebraram-se os 40 anos do nascimento da nossa querida Comissão Pastoral da Terra. A primeira grande comemoração é justamente a memória. Recordar tantas pessoas, sobretudo os fundadores da CPT, dom Tomás Balduíno, já falecido, dom Pedro Casaldáliga, ainda vivo, e tantos outros homens e mulheres que deram início a essa comissão que surgiu ainda no bojo da ditadura militar.
Celebrar a sua fundação é alegrar-se e bendizer a Deus por essa persistência, por essa determinação em favor de todo o tipo de campesinato, presente praticamente em todo o território nacional.
Em relação aos desafios, o primeiro é a CPT se fortalecer internamente, quanto aos seus agentes e ao voluntariado para fazer um serviço ainda melhor.
O segundo desafio é a organização. As equipes precisam ser fortalecidas. Outro desafio é o econômico-financeiro, dado que as agências estrangeiras, que nos ajudavam um pouco mais, patrocinando nossos projetos, diminuíram bastante.
E eu diria que o grande desafio é o modelo econômico avassalador, que prioriza o mercado, o capital e o dinheiro, em detrimento das populações que não têm meios, não têm a tecnologia para trabalhar e para desenvolverem-se.
JS – A CPT surgiu em um contexto que permitiu a incorporação de várias lutas ao longo dos tempos. A luta continua?
Dom Enemésio – A incorporação foi recíproca. A CPT foi se incorporando a outras entidades que lutaram, lutavam e lutam ainda pela reforma agrária, por uma melhor distribuição das terras do Brasil, concentradas quase sempre nas mãos de pouca gente.
A CPT também incorporou-se a outros organismos, movimentos populares, para lutar em favor de uma melhor distribuição da terra, em favor de uma reforma agrária, sobretudo uma reforma agrária ressignificada. E também outras entidades se incorporaram à CPT. São companheiras, parceiras.
O grande avanço desses últimos anos foi justamente essa organização das pastorais do campo, as comunidades tradicionais em defesa dos territórios dos pescadores, dos quilombolas. A parceria com o Conselho Indigenista Missionário, a luta pela demarcação das terras indígenas, os posseiros, ribeirinhos e extrativistas. Todo esse povo que luta por uma permanência na terra e pelo reconhecimento do território.
A CPT, nesses últimos anos, incorporou essa luta em defesa dos territórios dos povos tradicionais.
JS – Muito se falou em reforma agrária nos últimos tempos, sobretudo nos discursos de candidatos a cargos eletivos. Como o senhor avalia essa questão?
Dom Enemésio – A reforma agrária no país anda a passos muito lentos. É necessário, realmente, maior organização da sociedade civil, de modo especial dos movimentos populares, em particular daqueles que estão em contato com os camponeses, os sem-terra, os assentados, os acampados, para que se consiga essa necessária reforma agrária, que deveria passar também pelo limite da propriedade. Infelizmente há um descontrole total.
Evidentemente que é um discurso eleitoreiro, desde Fernando Henrique, Lula e Dilma. Ainda mais agora com a Kátia Abreu no comando. Ela que é a grande comandante da bancada ruralista. A reforma agrária no país torna-se um desafio ainda mais difícil. Mas, é preciso resistir, organizar-se para, mesmo com baixos ventos, conseguir alguma coisa a mais.
JS – Como o senhor vê a questão do agronegócio que, por um lado, produz riqueza e alimentos para a população, mas ao mesmo tempo gera destruição com o uso de agrotóxicos?
Dom Enemésio – Infelizmente, parece que há quase uma estratégia para, cada vez mais, desmontar-se a agricultura familiar, desmontar a permanência do sertanejo na sua própria terra. Evidentemente que o incentivo à agricultura familiar, à produção agroecológica é mínimo. Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia viraram celeiros de produção de grãos, seja de soja, de milho, feijão e arroz para exportação. O agrotóxico é jogado com aviões, por cima das grandes chapadas, atingindo também as populações.
O agronegócio precisa ser humanizado. Não basta a produção pela produção. Não basta somente uma produção para a exportação. É preciso que o desenvolvimento, o progresso seja sustentável, sem prejudicar o ser humano, a natureza e o meio ambiente.
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