O advogado Fabricio Sicchierolli Posocco fala das expectativas para aprovação do novo Estatuto do Estrangeiro.
De acordo com o especialista, a legislação, que ainda será encaminhada para apreciação do Congresso Nacional, deve alterar a forma como estrangeiros são tratados no Brasil, assim como brasileiros que moram no exterior.
Foto de: Divulgação
Para Fabricio Posocco nova legislação deve ajudar
a corrigir distorções nas relações entre brasileiros
e estrangeiros, com ênfase nos direitos humanos
Jornal Santuário de Aparecida – O Estatuto do Estrangeiro deverá ser substituído por uma nova legislação. Qual a necessidade desse trâmite?
Fabricio Sicchierolli Posocco – A legislação atual trata o imigrante como um “caso de Polícia Federal”. A nova legislação, que se encontra em análise junto ao Ministério da Justiça, modificou totalmente o foco, passando a conceder aos estrangeiros direitos constitucionais, tais como educação, previdência social e a possibilidade de voto. Em outras palavras, a nova legislação pretendeu adequar-se às exigências do mundo moderno, transformando os estrangeiros “migrantes” em um caso de direitos humanos.
JS – Qual a perspectiva para a promulgação da nova legislação?
Posocco – O projeto de lei foi elaborado por diversos estudiosos e atualmente se encontra no Ministério da Justiça para análise e confronto dos pontos constitucionais. A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e o Ministério do Trabalho também já possuem cópias para análise. Agora se iniciam as fases das audiências públicas para a discussão do texto, a fim de que se elabore uma redação final. Posteriormente, o projeto será encaminhado ao Congresso Nacional e a aprovação dependerá da velocidade com que o Poder Legislativo colocá-lo em pauta para votação. Na melhor das hipóteses, há previsão de aprovação em até dois anos, com grande possibilidade de promulgação.
JS – O texto-base estabelece a criação de uma Autoridade Nacional Migratória (ANM). O que deve mudar com esse dispositivo?
Posocco – A principal mudança é o foco. O estrangeiro deixou de ser um caso de polícia ou segurança pública e passa a ser um ser humano comum, que independentemente de cor, crença, religião ou opção política passa a ter direitos e obrigações, como qualquer brasileiro nato. A ANM passa a exercer controle administrativo de todas as situações de estrangeiros e também de brasileiros que se encontram no exterior, sendo a análise das peculiaridades de cada caso realizada por profissionais específicos de cada área, mediante o preenchimento das condições existentes em lei.
JS – A nova lei traz algum tipo de vantagem aos estrangeiros?
Posocco – Muitas vantagens que até então não eram observadas. Assim, temos uma abordagem voltada totalmente aos direitos humanos, sendo que a nova lei assegura aos estrangeiros novos direitos sociais e até mesmo a possibilidade de direito ao voto, na medida das suas especificações. Não somente por isso, traz inovações tais como quando prevê o visto para companheiros, passando a considerar a união estável de pessoas de sexo oposto e do mesmo sexo. Outro ponto importante é a previsão da prorrogação de visto de trabalho, podendo ser transformado em visto permanente, desde que o estrangeiro prove a necessidade de permanência no país. Inova ao conceder um visto permanente para investidor estrangeiro, após uma análise do impacto socioeconômico e ambiental do negócio. Os vistos passarão a ser mais simplificados para membros do Mercosul e países de língua portuguesa.
JS – Acredita que o Estatuto poderá ajudar a conter problemas como o trabalho escravo, que explora milhares de estrangeiros no Brasil?
Posocco – Sim, principalmente porque, além de assegurar e regulamentar os direitos dos trabalhadores, torna a possibilidade de legalização no Brasil muito mais fácil. O que traz essas condições desumanas de trabalho aos estrangeiros é, em grande parte, a questão da informalidade. Se esses estrangeiros passarem a legalizar sua situação no país e, sabendo da existência de novos direitos, poderá haver uma nova perspectiva.
JS – O brasileiro é muito receptivo. Mesmo assim, a crescente migração de haitianos tem despertado racismo e preconceito. Como avalia esse paradoxo?
Posocco – A principal razão dessa ojeriza aos haitianos em muito se deve à questão do emprego. Apesar de ser receptivo, o brasileiro ainda clama por certas mudanças nas questões de emprego e não concorda que estrangeiros venham tomar seus postos de trabalho. Os haitianos que aqui chegaram encontraram condições melhores para viver e não têm problemas em relação ao trabalho, aceitando inclusive com facilidade a flexibilização dos direitos trabalhistas e a remuneração mais baixa em relação ao piso das categorias de trabalhadores nacional. Muitos, inclusive, trabalham na informalidade. Assim, por não reclamarem de nada, são preferencialmente contratados. Isso gera um descontentamento por parte dos brasileiros. É uma realidade que tende a ser corrigida com a nova legislação.
JS – No que o Estatuto difere das leis de países como os Estados Unidos?
Posocco – A principal é que trata a questão dos migrantes como uma situação de direitos humanos, adequando-se às regras internacionais das quais o Brasil passou a ser signatário, bem como a própria Constituição Federal. Difere pincipalmente da legislação norte-americana, uma vez que, após o evento trágico do ataque às Torres Gêmeas, esta passou a endurecer e muito as regras de imigração, restringindo ainda mais suas fronteiras e os direitos aos estrangeiros legais ou ilegais, tratando todo caso como questão de segurança nacional. Como as realidades dos países são diferentes, o projeto nacional é muito mais adequado à posição que pretendemos chegar no cenário internacional.
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