Por Alexandre Santos Em Notícias

Padre Joãozinho analisa legado dos papas João XVII e João Paulo II

Próximo domingo (27), Francisco canonizará dois dos mais populares Papas da história: João Paulo II e João XXIII. Para analisar os legados de ambos, o JS conversa um dos autores do livro As Janelas do Vaticano II – A Igreja em diálogo com o mundo, o padre João Carlos de Almeida, S.C.J.

 

Foto de: Nome do fotógrafo

Pe. Joãozinho - Arquivo Pessoal

"Não sei o que Francisco fará, mas
se eu fosse o Papa recomendaria
que, aos 80 anos, o Papa renunciasse"

Jornal Santuário de Aparecida – Quais a principais características do pontificado de João XXIII?

 

Padre Joãozinho – Foi breve, mas intenso. A Igreja sofria pela morte de Pio XII, que fez a diferença, principalmente no pós-Segunda Guerra Mundial. Pensaram em escolher um Papa já experiente, para um papado de transição. Porém João XXIII surpreendeu a todos, convocando o Concílio Vaticano II. Antes do Concílio, ele disse uma frase que faz parte do seu legado: “Quero uma Igreja pobre para os pobres”. Curiosamente, é a mesma com que Francisco começou o pontificado dele.

Jornal Santuário de Aparecida – O senhor percebe mais alguma semelhança com o pontificado de Francisco?

Padre Joãozinho – Com certeza. Francisco parece ter a graça de expressar, de alguma maneira, aspectos dos últimos pontífices. A bondade e a cultura do encontro, de João XXIII; a inteligência, a perspicácia, o estudo e a profundidade de Paulo VI; o sorriso e a coragem reformista de João Paulo I; a dimensão missionária e a santidade de João Paulo II. Mas ele também tem algo de próprio, que é a sua simplicidade. Um Papa pobre no meio dos pobres.

Jornal Santuário de Aparecida – O Concílio Vaticano II foi o principal legado de João XXIII? Como o senhor analisa a aplicação do Concílio ao longo desses 50 anos?

Padre Joãozinho – João XXIII teve a coragem de convocar o Concílio Vaticano II, o que colocou a Igreja no coração do povo. Porém quem aprofundou as teses reformistas do Concílio foi Paulo VI. Segundo Francisco, as reformas do Concílio ainda não foram totalmente assimiladas. Bento XVI diz que existe um concílio virtual, que ficou famoso na mídia, e o Concílio real, que ainda precisa ser aplicado.

Jornal Santuário de Aparecida – Alguns teólogos defendem que o pontificado de João Paulo II, de certa forma, freou as mudanças do Concílio.

Padre Joãozinho – Não concordo. A principal premissa do Concílio é o diálogo da Igreja com o mundo. João Paulo II pegou um mundo em conflito, dividido entre socialistas e capitalistas e protagonizou uma comunhão internacional. Porém, muitos interpretaram o Concílio de um modo relativista. Houve muita coisa boa, mas alguns valores foram banalizados. Por exemplo: muita gente imaginou que o canto gregoriano não faria mais sentido. Porém, João Paulo II escreveu um documento, mostrando que o patrimônio musical da Igreja não pode ser jogado fora. Bento XVI também diz isso, e quem imagina que Francisco vai banalizar a liturgia está muito enganado.

Jornal Santuário de Aparecida – Como o senhor define o pontificado de João Paulo II?

Padre Joãozinho – Ele foi o Papa santo. Até o pontificado de João Paulo II, o Papa era praticamente prisioneiro do Vaticano. Ele viajou pelo mundo inteiro, foi um missionário. Já Bento XVI foi o Papa sábio e Francisco é o Papa simples, mártir. Mártir no sentido de martiria, que significa testemunho. Ele fala mais pelos gestos que pelas palavras.

Jornal Santuário de Aparecida – Em 1978, a eleição de um Papa não italiano gerou o mesmo impacto que a eleição de um latino-americano?

Padre Joãozinho – Olha, muito interessante sua observação. Foi o mesmo impacto. Porém, na Europa, talvez muito maior. Estávamos acomodados em ter um papa italiano, o que facilitava desde a língua até a diplomacia. Contudo, o João Paulo II rapidamente ultrapassou os limites da língua, mostrou que tinha trânsito em várias culturas. Bento XVI não ficou atrás. Agora não temos um Papa poliglota. Mas o trânsito cultural dele é imenso. Ele não tem o idioma, mas tem a linguagem.

Jornal Santuário de Aparecida – Qual o principal legado de João Paulo II?

Padre Joãozinho – Num pontificado que durou tanto tempo, é difícil determinar um legado principal. Para o mundo, a nova organização geopolítica foi a principal contribuição de João Paulo II. A queda do Muro de Berlim é atribuída, em mais de 60%, ao impacto diplomático dele. Para a Igreja, podemos citar várias coisas. Por exemplo, a atualização do Concílio Vaticano II sob a forma de magistério. Ele teve uma atuação criativa em diversos campos e, ao mesmo tempo, deu serenidade a uma Igreja em crise. Ele conduziu a Igreja ao terceiro milênio com uma catequese intensa. Em nome da misericórdia, talvez alguns problemas tenham sido tratados internamente, mas precisavam vir à tona, como um furúnculo, que precisa que o pus saia. O problema da pedofilia e outras questões mostraram chagas internas na Igreja. Hoje, com Francisco, essas feridas estão sendo tratadas e a própria sociedade tem reconhecido isso.

Jornal Santuário de Aparecida – Bento XVI surpreendeu o mundo ao renunciar. Numa situação semelhante, Francisco também renunciaria?

Padre Joãozinho – Acho que essa atitude se tornará padrão. Penso que Bento XVI iniciou, com coragem, uma nova cultura. Como um bispo não tem de permanecer no governo da diocese após os 75 anos, por que o Papa tem que ficar? Francisco já está com 76 anos, daqui a pouco terá 80. Veja a rotina desse homem. Uma pessoa assim envelhece mais rápido. Caso ele tenha algum tipo de problema que o impeça de governar a Igreja, não tenho dúvida de que renunciará.

Jornal Santuário de Aparecida – No futuro a renúncia poderá se tornar uma norma?

Padre Joãozinho – Não sei o que Francisco fará, mas se eu fosse o Papa, recomendaria que, aos 80 anos, o Papa renunciasse.

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