O missionário redentorista da província do Rio, Minas e Espírito Santo, padre Vicente de Paula Ferreira, conversa com o JS sobre a obra Cristianismo Não Religioso, da Editora Santuário.
A obra apresenta o pensamento de Gianni Vattimo, que reconhece a caridade cristã como elemento fundamental para a contemporaneidade.
Ele ressalta que o livro, recém-lançado em uma cerimônia no Seminário Santo Afonso, em Aparecida (SP), apresenta muitas bifurcações. “Uma delas é como a razão pós-moderna colhe caminhos de solidariedade a partir de uma experiência de fé”, diz.
Foto de: Deniele Simões / JS
Padre Vicente de Paula Ferreira durante lançamento da obra no Seminário Santo Afonso,
em Aparecida (SP)
Jornal Santuário de Aparecida – O senhor é autor do livro Cristianismo Não Religioso, fruto da sua tese de doutorado. Como surgiu a ideia de transformar esse trabalho em um livro?
Padre Vicente de Paula Ferreira – Depois de pensar bastante, resolvi compartilhar essa produção com um público maior. Enviei a tese, que defendi no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião, na Universidade Federal de Juiz de Fora, para a Editora Santuário, que aprovou a publicação. Com o bom acompanhamento editorial, creio que transformar a pesquisa em livro tenha sido um caminho bonito. Publicar exige empenho, ainda mais quando se trata de um assunto tão importante como esse: dar razões de nossa esperança, fé e caridade nos tempos atuais.
Continuo a pesquisa, agora num estágio pós-doutoral na Faculdade Jesuíta de Filosofia e de Teologia, em Belo Horizonte, sendo bolsista da Capes/PNPD. Tive a necessidade de voltar-me para a Antropologia Teológica aprofundando, ainda mais, o diálogo entre fé e razão.
JS – Como foi lançar a obra em Aparecida?
Padre Vicente – Experiência maravilhosa! O interesse que os colegas redentoristas demonstraram pelo meu trabalho foi muito motivador. Foram inúmeros diálogos e tudo com uma eficiência fascinante. Prontamente também me convidaram para o lançamento durante um congresso de espiritualidade redentorista, no Seminário Santo Afonso, juntamente com outros autores. Senti-me continuando a missão de nosso fundador, Santo Afonso, que escreveu mais de uma centena de livros.
JS – O livro apresenta o pensamento do filósofo Gianni Vattimo e foi prefaciado pelo próprio. O que representa isso para o senhor?
Padre Vicente – Vattimo sempre respondeu meus e-mails nos vários anos de minha pesquisa sobre seu pensamento. Quando resolvi transformar a tese em livro, arrisquei em pedir-lhe um parecer. Encaminhei-lhe o texto e grande foi a surpresa quando me enviou o prefácio. Claro que isso foi uma alegria contagiante. De fato, não contava com tamanho presente.
JS – Em tempos de pós-modernidade e relações líquidas, qual a importância de se enfatizar os valores que fundamentam o pensamento cristão?
Padre Vicente – O cristianismo, mais que uma verdade abstrata, trata-se de um caminho, de uma vivência baseada na fraternidade. Jesus mostrou e realizou a comunhão com Deus e com os irmãos como condição para a dignidade mais profunda do ser humano. Vivemos num tempo inusitado e cheio de novas configurações, principalmente nas relações humanas.
Como é arriscado aderir às posturas simplesmente relativistas ou fundamentalistas! Em muitos casos, a solidariedade fica enfraquecida e a violência tende a aumentar. A própria democracia, com todas as suas conquistas, também fica bloqueada quando não consegue defender o bem comum. Por isso, é muito bom colher um pensamento filosófico que reconhece a caridade cristã como elemento fundamental para a contemporaneidade.
JS – Acredita que o cristianismo não religioso possa conduzir as pessoas ao cristianismo religioso?
Padre Vicente – É preciso entender bem que o “não religioso”, no pensamento vattimiano, quer dizer, em última instância, que a fé cristã rompe com a imagem de religião, enquanto divisão entre Deus e mundo, sagrado e profano. A encarnação, a kênosis amorosa de Cristo revela que a criação, com toda sua história, participa de um grande mistério salvífico. Ser mais evangélico significa fazer da vida uma obra de amor, de oblação, de fraternidade. Caso contrário, corre-se o risco de adorar a Deus, sendo indiferente ao irmão sofredor. Essa dicotomia entre vida e fé é perigosa. “Se alguém disser: amo a Deus, mas odeia o seu irmão, é um mentiroso” (1Jo 4, 20).
JS – Que contribuições o senhor espera oferecer ao público por meio dessa obra?
Padre Vicente – Depois que a gente publica, a obra, de alguma forma, não nos pertence. Porém, espero, primeiramente, revelar que parte da Filosofia está interessada em temas centrais de nossa fé, como é a caridade, a hospitalidade, a construção da justiça e da paz. Segundo, que os leitores sejam provocados a pensar as razões mais profundas de ser cristão hoje. Além disso, espero que a obra provoque o leitor a construir novas posturas existenciais menos violentas e mais amigáveis. Por fim, é urgente propor aos nossos contemporâneos o Evangelho enquanto palavra que deve ser encarnada numa vivência cotidiana pautada pelo diálogo, pelo encontro, inclusive dos saberes e das experiências religiosas.
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