Por Deniele Simões Em Notícias Atualizada em 18 MAR 2019 - 10H47

Seminário reflete sobre missão e vocação religiosa

Refletir sobre os desafios da vida religiosa consagrada no mundo pós-moderno e buscar caminhos para renovação da missão e dos carismas.

 

Esse foi o foco do Seminário Nacional da Vida Consagrada, que reuniu mais de 2.200 religiosos e religiosas, entre padres, irmãos, irmãs, freis e até bispos em Aparecida (SP), de 7 a 10 de abril, no Centro de Eventos Padre Vítor Coelho de Almeida, no Santuário Nacional.

Foto de: Eduardo Gois / JS

Irmã Mercedes - Eduardo Gois JS

Irmã Mercedes Casas Sánchez, presidente da Confederação Latino-americana e Caribenha de Religiosos e Religiosas: “Em toda crise temos principalmente crescimento que nos ajuda a buscar o essencial de nossas vocações. Talvez o essencial na vida consagrada seja também aprender a sermos poucos. A pequenez não significa perda e sim algo muito evangélico, que ajuda a nascer um novo rosto da vida religiosa. Creio na força do espírito. Temos que crer na fé, na esperança e na caridade”

 

 

O encontro, promovido pela Conferência Nacional dos Religiosos do Brasil (CRB), teve como tema Assumir o núcleo identitário da Vida Consagrada: Atitude Profética, Processo Mistagógico e, como lema, Não ardia o nosso coração quando Ele nos falava pelo caminho? (Lc 24,32).

O Seminário acontece em consonância com o Ano da Vida Consagrada proposto pelo Papa Francisco que aponta para o anseio de uma “Igreja em saída, em que a vida consagrada pode e deve ser reflexo de relações humanas acolhedoras, transparentes, sinceras e de uma missão que resgate o encontro pessoal e o apoio ao povo marginalizado.

Durante os quatro dias de atividades, os participantes assistiram a conferências, tiveram momentos de celebração e oração, e tiveram oportunidade de partilhar suas experiências e anseios sobre a vida religiosa consagrada.

Para a presidente da CRB, irmã Maria Inês Vieira Ribeiro, o Seminário superou as expectativas não só em relação ao grande número de inscritos, mas sobretudo pela vivência e partilha do conteúdo entre os participantes.

Foto de: Eduardo Gois / JS

Dom Raymundo - Eduardo Gois JS

Dom Raymundo Damasceno, Cardeal arcebispo de Aparecida: “Que na fidelidade e atualização dos seus carismas nos dias atuais, cada um possa se entregar cada vez mais”

 

 

 

 

“Se a nossa missão é animar a vida consagrada, o Seminário vem justamente para nos colocar, nos fazer continuar o caminho, porque a presença da vida religiosa na Igreja e no mundo é justamente evangelizar”, destaca.

Na avaliação da religiosa, a grande procura pelo Seminário é sinal de busca, de renovação e de esforço de fidelidade ao projeto de Jesus. “Que possamos sair com mais entusiasmo, mais comprometidos com a causa do Reino, para podermos, justamente, sermos fiéis ao nosso compromisso de vida consagrada”, acrescenta.

Já o padre Edênio Valle, que coordenou a CRB na década de 1990, vê uma semelhança entre o momento atual da vida consagrada e a época do Concílio Vaticano II, sobretudo no que diz respeito ao tema e ao lema do Seminário.

Na opinião do religioso, não se pode esquecer os problemas que a vida religiosa enfrenta no país, que são sérios e de vários tipos. “Ao mesmo tempo, há uma perspectiva de caminhar e um certo entusiasmo”, pontua.

Foto de: Deniele Simões / JS

Irmã Terezinha - Deniele Simões JS

Irmã Terezinha Lumbieri, da Congregação do Sagrado Coração de Jesus (Irmãs Cabrini), que atua com trabalhos sociais e Lectio Divina em Farroupilha (RS): “Esse Seminário é uma abertura muito grande e, mais do que isso, um sinal de que a vida religiosa, a vida consagrada, irmãs, leigos, irmãos, sacerdotes da vida consagrada, todos nós estamos acordados”

Papa Francisco e a vida religiosa

Padre Edênio vê com muita alegria o atual momento da Igreja, em que o Papa Francisco convoca os religiosos e religiosas para a integração ao processo de renascimento, com um rosto mais missionário e em “saída”.

“Isso é o que nós, cristãos batizados, chamados à santidade e à missão no discipulado, fazemos como religiosos. Essa é a grande fraternidade que vem da comunhão do Pai com o Filho e o Espírito Santo. E é o espírito de Deus que conduz a Igreja, através de uma opção pelos pobres; saindo e não ficando”, explica.

A irmã Terezinha Lumbieri, religiosa da Congregação do Sagrado Coração de Jesus em Farroupilha (RS) também associa o pontificado de Francisco como um incentivo para fomentar uma Igreja em “saída” e compromissada com os pobres.

“Para nós, religiosos e religiosas, isso está muito claro. Não é para ficar nas sacristias, nos conventos, mas ir para a rua; ser rueira, no sentido de ter objetivo concreto, de ter uma visão de onde a gente quer chegar e como a gente quer chegar lá”, diz.

Foto de: Deniele Simões / JS

Irmã Vanilda - Deniele Simões JS

Irmã Vanilda de Fátima Ramos, da Congregação Nossa Senhora da Consolação, que atua com Comunidades Eclesiais de Base em Guarapari (ES): “Pretendo voltar com a fé renovada e também com o olhar novo para a realidade e muita força para a minha missão, porque realmente as pessoas precisam da gente. Esse Seminário é algo que está renovando a nossa vocação e também a nossa comunidade”

Para a religiosa, é preciso despertar para uma vida autêntica e apaixonada por Cristo e pelo Reino, acordando também a sociedade e o mundo para a justiça e a tolerância, que são valores profundamente humanos e cristãos. Ela coloca que é justamente esse o convite que Francisco tem feito aos religiosos.

O exemplo de Francisco é incentivo também para a irmã Vanilda de Fátima Ramos, da Congregação Nossa Senhora da Consolação. Ela atua em uma paróquia na cidade de Guarapari (ES), que possui 26 Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).

Vanilda trabalha com a formação de lideranças nas mais diversas pastorais e também no atendimento a famílias carentes. “Estamos em uma comunidade inserida muito perto das pessoas mais necessitadas e acho que nossa luz que tem de brilhar em nós deve estar renovada para retornar à missão”, diz a religiosa, que vê no Papa Francisco essa grande luz necessária ao trabalho missionário.

Na coletiva com a imprensa, o irmão João Carlos Hinz, da Congregação dos Franciscanos, falou em nome das comunidades inseridas na região Nordeste. Ele comparou o trabalho dos consagrados e consagradas ao mandacaru, planta que resiste à seca e a todo sofrimento.

Foto de: Deniele Simões / JS

Irmã Maria Suely - Deniele Simões JS

Irmã Maria Suely Germano Santos, Superiora Provincial da Congregação Nossa Senhora de Lourdes (Irmãs Lurdinas), em Recife (PE): “É um seminário de renovação, confirmação, ânimo – você dar um horizonte de esperança, realmente, da vida. Como disse João Braz de Aviz, a gente precisa retomar os três níveis da vida religiosa, que é a vida em comunhão, a dimensão do dinheiro e do poder e a dimensão do serviço”

“As pequenas comunidades inseridas nascem na década de 1960, no intuito de estar junto do povo, dos mais sofridos e daqueles que são os excluídos. Temos fatos e relatos fortes de irmãs que vivem nas periferias, que estão nas escolas, que estão na zona rural”, relata.

Para o religioso, a participação no Seminário é fundamental para despertar nos participantes o desejo de ser, cada vez mais, irmãos e irmãs de cada um que sofre e que está à margem da sociedade. “Nós, como religiosos, nunca perdemos a esperança. Estamos lá acreditando, e mesmo em tempos de crise e dificuldade, acreditamos que há dias melhores e há um mundo melhor”, finaliza.

Reflexões

Ao longo dos quatro dias, a programação incluiu reflexões sobre a espiritualidade da Vida Consagrada através de conferências, místicas e testemunhos.

Com a assessoria do jesuíta, padre João Geraldo Kolling, o evento iniciou com um resgate da caminhada da CRB nos últimos 10 anos. Ainda no primeiro dia, o assessor teológico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), padre Paulo Suess, fez um aprofundamento das cartas da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, do Vaticano, “Alegrai-vos” e “Prescrutai”.

Foto de: Allan Ribeiro / JS

Irmã Maria Lourdes - Allan Ribeiro JS

Irmã Maria Lourdes Urbam, das Irmãs de Nossa Senhora, Passo Fundo (RS): “Nós queremos com esse encontro renovar a nossa fé na pessoa de Jesus Cristo na sua missão, vivendo e revivendo nossos votos de consagração e na vivência em comunidade. Dentro da vida consagrada nós procuramos manifestar a bondade do bom e providente Deus, especialmente na educação, na saúde e na evangelização das periferias e nas missões. O maior desafio é a globalização total que tem influência direta na vida religiosa e a retomada dentro disso para que possamos dar uma resposta condizente aos desafios do mundo que estão ali, especialmente dentro da Igreja. Isso pra nós é um pensar e replanejar, constante e plenamente”

Ele refletiu sobre como viver o carisma de cada comunidade, segundo a vontade de Deus e as necessidades do mundo, na unidade do Espírito Santo e em comunhão com a Igreja. Essa é, segundo o teólogo, uma pergunta essencial do Ano da Vida Consagrada, pois levanta questões sobre a identidade do carisma, a vontade de Deus, o sentido da vida para a humanidade sofrida e a unidade eclesial na diversidade do Espírito.

O padre explicou que, a temática força a busca de vestígios da vontade de Deus, não nas nuvens, mas na memória histórica de “peregrinos vigilantes”, na visão de “místicos militantes”, que exigem coragem profética e esperança.

“Faz muitos anos que procuramos decifrar as crises da Vida Religiosa: a crise da identidade, a crise vocacional, o choque das mentalidades em nossas casas, a crise causada pelo envelhecimento, a crise das nossas obras, a crise econômica e psicológica. Mas quantas vezes já morremos no decorrer da história, fomos perseguidos por regimes políticos por causa das nossas virtudes e dos nossos pecados? Quantas vezes a Vida Consagrada já ficou um ano debaixo da terra, como a cigarra, e voltou de novo revigorada, cantando ao sol?”, questiona.

Segundo o assessor, a caracterização da Vida Consagrada como “sinal profético” é um fenômeno do tempo pós-conciliar. Ele também recordou aqueles perseguidos por causa de seu caráter profético. Figuras como, Rodolfo Lunkenbein e Irmã Genoveva, dom Pedro Casaldáliga e Irmã Dorothy, dom Luís Cappio, Irmã Alberta, dom Erwin.

Ao final, o conferencista relembrou sete imperativos formulados pelo Papa Francisco na Evanguelii Gaudium, aplicáveis à vida consagrada: “Não deixemos que roubem nosso entusiasmo missionário!” (EG 80). “Não deixemos que nos roubem a alegria da evangelização!” (EG 83). “Não deixemos que nos roubem a esperança!” (EG 86). “Não deixemos que nos roubem a comunidade!” (EG 92). “Não deixemos que nos roubem o Evangelho!” (EG 97). “Não deixemos que nos roubem o ideal do amor fraterno!” (EG 101). “Não deixemos que nos roubem a força missionária!” (EG 109).

Foto de: Allan Ribeiro / JS

Nilza - Allan Ribeiro JS

Nilza Antunes Freitas, Ordem da Companhia de Maria, São Paulo (SP). “A missão da vida consagrada é variadíssima. Estamos vendo um chamado muito grande para voltar a interioridade, para mística. Parece que esse está sendo o grande chamado para revermos a nossa presença no mundo”

 

Também foram abordadas reflexões sobre as manifestações de Deus como mistério (a mistagogia) com provocações para os religiosos e religiosas. O tema foi assessorado pela mistagoga, assessora da CNBB e da Rede Celebra, Rosemary Fernandes da Costa, que destacou a necessidade de voltar às fontes para melhor acolher o mistério de Deus.

De acordo com Rosemary, os religiosos têm o tesouro nas mãos, Aquele que os chamou. Tarefa da Vida Consagrada é tomar este tesouro e se perguntar o que fazer para que o homem e a mulher de hoje encontrem a Deus no cotidiano.

Rosemary deixou claro que identidade e mistério andam de mãos dadas, pois quando a pessoa descobre a sua identidade, consequentemente renova a sua atitude, deixa de ter medo.

A identidade, segundo a assessora, chama para uma atitude profética. Quando a pessoa se descobre como ser no mundo e ser alguém que liga, religa, isto é, religioso, tem que estar atento aos dois lados, o que quer dizer, a Deus e os homens, pois esta atenção leva a uma atitude profética.

O arcebispo de Porto Alegre e bispo referencial para a Vida Consagrada, dom Jaime Spengler reconheceu o grande trabalho da Vida religiosa no processo de evangelização no Brasil. "A Igreja é devedora da Vida Religiosa Consagrada, nesses cinco séculos de história de evangelização", destacou.

Foto de: Eduardo Gois / JS

Irmã Maria Inês - Eduardo Gois JS

Irmã Maria Inês, presidente da CRB “Que eu saiba, a CRB nunca conseguiu reunir mais de 2.000 religiosos. Um seminário que virou congresso surpresa do amor divino. Cada um foi encontrado, alcançado e transformado por Cristo. Esse tempo vai marcar a história pessoal de cada um de nós. Estamos aqui para reafirmar o nosso compromisso com Ele. Assumamos cada minuto com transbordante gratidão pelo nosso passado, são dias para intensificar nossa ação de graças pelo chamado, agradecer o grande dom da vida consagrada. Acreditemos com fé que a Mãe do ressuscitado prepara a cada um de nós um futuro pleno de esperança que só Ele conhece”

O arcebispo ressaltou o desejo de que a Vida Religiosa seja sempre conduzida pela esperança, sem perder de vista o Cristo crucificado. "Como bispo que acompanha a Vida Consagrada, aprendemos muito, vemos riqueza, beleza espalhada por todo o país, realizando o trabalho de forma discreta e vigorosa, ao mesmo tempo", concluiu Spengler.

Já o Irmão Afonso Murad falou sobre oportunidades e perspectivas para a Vida Consagrada no mundo contemporâneo, não esquecendo de abordar a questão do machismo na Igreja e esforço do Papa Francisco pela participação das mulheres. Também fez reflexões sobre o que temos de aprender com a sociedade moderna.

A presidente da Confederação Latino-americana e Caribenha de Religiosos e Religiosas, Irmã Mercedes Casas Sánchez realizou conferência abordando uma reflexão sobre as luzes e esperanças da vida consagrada na américa latina. “Devemos caminhar como vida religiosa mística e profética, mais encarnada e respondendo mais ao clamor de Deus pelos mais pobres, pelas marginalidades e uma vida religiosa que queira mais sair de si mesma, mais missionária como no convite do Papa Francisco, queremos estar em saída e responder ao chamado de Deus, saindo encontro de nossos irmãos.”

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