Por Allan Ribeiro Em Jornal Santuário

Redução da maioridade penal exclui jovens da sociedade

A redução da maioridade penal voltou a ser pauta no Congresso Nacional. A possível mudança na Constituição estabelece 16 anos como a idade mínima para que um acusado responda pelos seus atos. Contrária à medida, a Igreja no Brasil defende que a sociedade deve sair ao encontro dos jovens, não descartando-os, e reafirma que a redução não seria a solução para a diminuição desses crimes, mas sim a promoção de políticas públicas sólidas.

Desde 1995, quando foi apresentada, a proposta foi engavetada por quatro vezes. No último mês, o assunto recebeu o aval da Comissão e Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Agora, o projeto precisa passar por uma comissão especial.

 

Atualmente, os infratores com menos de 18 anos são submetidos ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A partir dos 12 anos, eles já são responsabilizados penalmente, sofrendo medidas socioeducativas que, apesar de punitivas, têm como objetivo valorizar a pessoa do adolescente e favorecer as condições de autossuperação para a retomada da vida em sociedade. Com a mudança, os adolescentes passam a ser penalizados em regime comum.

O Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo, com cerca de 715 mil encarcerados, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de junho de 2014. O país fica atrás apenas dos Estados Unidos, com 2,2 milhões e da China, com 1,7 milhão. Aproximadamente 22 mil jovens estão em conflito com a Lei, sendo apenas 1,8 mil fichados por prática de homicídio.

 

O sistema carcerário do país é deficitário e não possui estrutura para atender a esses novos infratores. Além disso, a punição para adultos iria afastar ainda mais o adolescente de uma possível recuperação, já que ele terá maior contato com variados tipos de criminosos e organizações.

Como consequência, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e bispo auxiliar da Brasília, dom Leonardo Steiner, em entrevista a assessoria da CNBB, afirma que a redução irá permitir que abusadores de adolescente que tenham idade a partir da fixada na Constituição fiquem impunes, vez que os crimes dos quais eles são acusados, perderão o objeto.

Foto de: Istockphoto

Maioridade Penal - Istockphoto

Punição para adultos pode afastar ainda mais
o adolescente de uma possível recuperação

“O projeto que visa diminuir a maioridade penal é um projeto de morte contra crianças, adolescentes e jovens empobrecidos das periferias de nossas grandes cidades. Os adolescentes, em sua grande maioria, foram descartados, para usar uma expressão do Santo Padre, socialmente e, com a diminuição da maioridade penal, serão descartados em sua totalidade”, pontua o secretário-geral.

Apesar da alteração, os índices podem ficar estagnados, como já observados em outros países que optaram pela mudança. A medida sozinha, não seria capaz de reduzir os crimes, já que atinge apenas as consequências, e não as causas do problema. O presidente Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz e bispo de Ipameri (GO), dom Guilherme Werlang, afirma que a ferida do problema está na forma como as famílias, a sociedade e o Estado educam os jovens.

“A redução da maioridade penal não irá diminuir a violência praticada pelos jovens. É a mesma coisa que podar uma árvore. Você corta-a e logo ela volta a crescer novamente. Para coibir a violência tem que se ir na raiz, naquilo que é gerador. O jovem que pratica violência é fruto de uma sociedade violenta, fruto da impunidade e da injustiça que se comete contra eles”, ressalta o bispo.

A maioria das crianças e adolescentes em conflito com a lei estão em situação de vulnerabilidade justamente por ausência do Estado, explica o professor de direito penal da Universidade Mackenzie, Humberto Barrionuevo Fabretti. Ele acredita que o atual sistema não é capaz de recuperar os jovens. “Quanto mais cedo uma pessoa é presa e ingressa no sistema penitenciário, mais cedo e mais infrações ela comete. O sistema carcerário é um multiplicador dos crimes e não um inibidor”, diz o especialista.

Outro embate a respeito da mudança é que a maioridade penal é uma cláusula pétrea da Constituição Federal, ou seja, não poderia ser levada a plenário para ser modificada, nem mesmo conter emendas. Para alterá-la, seria necessário que uma nova Constituição fosse feita.

Para sanar o problema e reduzir a criminalidade nessa faixa etária, seriam necessárias políticas públicas que integrem o jovem à sociedade. Dom Guilherme acredita que faltam opções de lazer e entretenimento sadio aos adolescentes, o que acaba contribuindo para que uma parcela dessa juventude se desvie para o mundo do crime. Ele defende ainda que eles devem ser ouvidos e precisam participar do processo de elaboração.

“O jovem deve ser chamado para compor a mesa. A sociedade precisa interagir, tentar adequar e saber o que ele deseja e anseia, fazendo com que o ele se torne protagonista das políticas públicas. Não adianta só o estado definir o que deve ser feito e impor”, expressa o Presidente da Comissão.

Organismos ligados à CNBB como a Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (Anec) e a Cáritas Brasileira e Pastoral da Juventude (PJ), manifestaram-se contrárias a decisão. No ano passado, a CNBB também emitiu nota na qual reafirmava “que a redução da maioridade não é a solução para o fim da violência”.

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