Se no fim do século XIX as afirmações de Freud sobre a sexualidade infantil escandalizaram o ambiente burguês da Viena imperial, hoje suas teorias pareceriam superadas pelos que consideram absolutamente normal a exposição prematura das crianças à sexualidade adulta.
Leia MaisO que não falar sobre Deus para uma criança?A partir de quando as crianças podem se confessar?Isto seria prejudicial ao desenvolvimento psicológico normal da criança? Não abriria caminho à sedução infantil e ao abuso sexual das crianças, bastante praticado em diferentes camadas sociais?
Sandor Ferenczi, um psicanalista húngaro, discípulo de Freud, escreveu um importante texto sobre a teoria da sedução infantil intitulado: 'Confusão de línguas entre os adultos e a criança'. O simples título desta obra alerta para um paradoxo. Em tema de sexualidade, a criança e o adulto falam línguas diferentes.
Fazer com que a criança seja obrigada a falar a língua do adulto, a língua erótica da paixão é um tipo perverso de sedução, que “confunde” e “enlouquece” a criança ao afastá-la de sua linguagem natural, a linguagem da ternura.
Embora a criança, em busca de sua autonomia, goste de “imitar” o adulto, sobretudo naquilo que o diferencia dela, no âmbito da sexualidade ela o faz usando uma linguagem que a expõe àquilo que um conhecido psicanalista francês chamava de significante enigmático.
O discurso sexual do adulto é um discurso enigmático e perturbador para a criança. Embora a criança possa sentir prazer sexual, o seu psiquismo ainda não é capaz de significá-lo adequadamente nas práticas sexuais do adulto.
Os danos psíquicos envolvidos em situações de abuso sexual de crianças representam a parte mais obscura do que acontece no próprio abuso. Somente quem acompanha, no espaço clínico, pacientes que foram abusados na infância pode compreender a violência que isso representa para o psiquismo da criança e do futuro adulto, que tenderá a ver sua vida sexual inibida ou exacerbada pelo enigma do abuso.
Isso tudo pode se inscrever em uma tendência atual mais generalizada à exposição, favorecida pela explosão midiática e pelas mídias sociais, fortalecida por uma tendência dos pais a querer que seus filhos “cresçam rapidamente” e se tornem mini-adultos.
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