Opinião

Cringes com orgulho

Mariana Mascarenhas

Escrito por Mariana Mascarenhas - Redação A12

12 JUL 2021 - 14H01 (Atualizada em 13 JUL 2021 - 08H30)

Shutterstock

Você se considera cringe? Bom, se você teve que consultar alguém ou algum site de busca para se informar a respeito, talvez seja considerado(a) um(a).

Expressão adaptada do inglês e que significa “vergonha alheia”, a palavra cringe se tornou a nova gíria da geração Z (nascidos entre a metade dos anos 1990 até o início de 2010), que passou a utilizá-la, especialmente nas redes sociais, para definir determinados hábitos considerados antiquados por essa turma mais jovem. A repercussão foi tamanha que as buscas pela expressão no Google aumentaram em 500% nas últimas semanas.

O termo chegou a incomodar, principalmente, alguns jovens da geração Y, os chamados millenials (nascidos entre o fim da década de 1980 e início da de 1990). Tudo isso porque a turma da geração Z começou a classificar como cringe pessoas que tomam café da manhã, usam emoji de risada, pagam boletos, entre outras atividades. “Não há nada mais cringe do que ser fã de Harry Potter e pagar boletos”, disseram alguns internautas nas redes, se referindo ao personagem de uma das maiores sagas de best seller infantojuvenil dos últimos tempos. Não demorou muito para que os millenials revidassem e respondessem tais comentários, afirmando, por exemplo, que o fato de pagar boletos significa que assumiram responsabilidades e não são mais dependentes de “papai e mamãe”.

Leia Mais3 motivos que provam que você é cringe 😰A questão é que os millenials também já vivenciaram esse momento “não cringe de uma outra forma. A diferença é que eles utilizavam expressões como “pagar mico” – a qual também se referia a vergonha alheia.

Essa expressão teve sua origem a partir de um jogo de cartas, em que os jogadores deviam formar pares de animais, com exceção do mico, que não tem par – e seu alvo eram os nascidos entre meados da década de 1960 e início da década de 1980, constituindo a chamada geração X.

Para os millenials, essa turma “pagava mico” por não estar na rede social Orkut, por não teclar no MSN, serviço virtual de mensagens instantâneas, por escrever “você” e “não”, ao invés de “vc” e “naum” – hábitos que são considerados cringe pela geração Z, que mal os conhece nos dias atuais.

O químico Lavoisier já dizia que “na natureza nada se cria, tudo se transforma”. Podemos aplicar tal frase nas relações comportamentais de cada geração. Afinal, considerando os devidos contextos, percebemos como a linha do tempo é Cíclica e não-linear, pois o passado está sempre influenciando o presente de alguma forma. Algo que nos esquecemos, muitas vezes, em razão do nosso apego excessivo ao tempo presente e da falsa sensação de sermos autores de criações que, sem percebemos, já existiam antes de nós e apenas se transformaram. Portanto, o cringe de hoje é o 'pagar mico' de ontem.

Outro exemplo está na forma como a geração Z expressa a risada em mensagens virtuais, o famoso “kkkk”. Na visão dela, quem não se expressa assim é cringe. Mas, por mais que esses jovens se achem modernos, por rirem dessa forma, esse tipo de gargalhada já é mais que centenária. Isso mesmo! Se observarmos algumas obras de escritores como José de Alencar (1829-1877) e Machado de Assis (1839-1908), encontraremos expressões como “cá, cá, cá” ou “quiá, quiá, quiá” que foram se modificando com o tempo. Logo, não há nada de novo na risada virtual de agora.

Além disso, apesar das diferenças, há muitas semelhanças entre millenials e jovens da geração Z. Embora esta já tenha nascido na era da internet, aqueles adentraram o universo virtual ainda na infância ou adolescência, já que a popularização da internet aconteceu nos anos 1990 e seu alcance se ampliou nos anos 2000.

Assim, ambas as gerações se familiarizaram mais cedo com o mundo digital do que as outras e passaram a ter acesso a um grande número de informações, além de se tornar produtora ativa de conteúdo. A partir daí, muitos adolescentes e jovens puderam exprimir suas opiniões e adquirir consciência crítica de diversos problemas sociais existentes. Vemos, então, gerações mais novas engajadas em questões sociais, sustentáveis e políticas.

Portanto, aos millenials que se sentirem ofendidos com a definição de cringe, não há com o que se preocupar. Trata-se, apenas, de uma fase pela qual já passaram em relação à forma como enxergavam a geração X. Simplesmente, nós estamos crescendo e amadurecendo e, se isso é ser cringe, que o sejam com orgulho.

Escrito por
Mariana Mascarenhas
Mariana Mascarenhas - Redação A12

Jornalista e Mestra em Ciências Humanas. Atua como Assessora de Comunicação e como Articulista de Mídias Sociais, economia e cultura.

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