A cidade de Barão de Cocais (MG), tem sofrido momentos de grande tensão nos últimos meses. Desde que a barragem de Brumadinho rompeu, a atenção dos moradores se volta para esta temática, que gira em torno do perigo.
O sensacionalismo das mídias e as fake news também têm aumentado preocupações. Mas o fato é que nesta localidade existe, sim, um risco iminente: devido ao abalo nas estruturas da barragem de Gongo Soco, comunidades inteiras já foram retiradas da zona primária de risco, que fica no entorno da barragem. Porém, o fato movimenta e preocupa toda a população da cidade, pois, no fim das contas, todos têm a ver com o problema.
A Agência Nacional de Mineração informou que a velocidade de movimentação do talude norte da mina Gongo Soco tem uma média de 40,9 centímetros de deslocamento por dia, segundo último relatório, divulgado no dia 5 deste mês.
O talude é um paredão que fica acima da cava de mineração na Mina de Gongo Soco, de onde é retirado o minério de ferro.
O temor inicial era de que a movimentação do talude provocasse uma queda brusca e, em uma hipótese mais grave, a vibração ocasionasse, consequentemente, o rompimento da barragem sul superior.
Cerca de 500 moradores da área chamada de “autossalvamento”, já estão fora de suas casas desde fevereiro. Outras 6 mil pessoas que vivem na zona secundária (até 15 km de distância), só devem deixar suas casas se a barragem se romper. Os rejeitos da barragem demorariam mais de uma hora para chegar à zona considerada secundária.
Na Zona Secundária, situa-se a Igreja Matriz de São João Batista, construída em 1763, lugar onde os moradores da região buscam o refúgio na fé. Tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o templo é de grande importância para o país e fica a 30 km da mina. Para se ter ideia, Aleijadinho participou como escultor, primeiramente na imagem de São João Batista, feita em pedra-sabão, colocada no nicho da fachada principal e, depois, no interior da igreja, na tarja do arco-cruzeiro, também entalhada na mesma pedra.
De acordo com o pároco, Padre José Antônio Oliveira, a Igreja é um centro de referência para congregar, fortalecer, levantar os ânimos e orientar as pessoas e, apesar do momento complicado, o Santuário está funcionando normalmente.
Com a ajuda e atenção da Defesa Civil, do Corpo de Bombeiros, da Polícia Militar todas as celebrações da Semana Santa, inclusive procissões, e preparativos para celebrar o Jubileu de São João Batista, padroeira da cidade, entre os dias 15 e 24 deste mês, transcorrem na normalidade.
“Sentimos que há uma necessidade urgente de rever a prática da mineração no Brasil. Os crimes e desastres que temos sofrido, com tantas perdas humanas e com tamanha agressão à mãe natureza, poderiam ser claramente evitados. Os métodos usados, as falhas e omissões criminosas na fiscalização, o fato de a maioria dos políticos terem suas campanhas eleitorais patrocinadas por mineradoras, o poder do dinheiro, que interfere seriamente até mesmo nas decisões judiciais, a supremacia do lucro sobre a pessoa, tudo isso precisa ser repensado”, opina o padre.
Para o sacerdote, há uma luta desigual: “Somente com a organização e mobilização popular, com o apoio das Igrejas e instituições que se pautam pela defesa da vida, da justiça e do direito será possível reverter esse quadro”.
Na avaliação de Padre José Antônio, o Ministério Público precisa ter uma atuação mais corajosa e decisiva junto às grandes empresas. “Não se omitir e nem se contentar em conseguir um Termo de Ajustamento de Conduta, que muitas vezes permite a continuidade da injustiça e do crime. Ainda mais porque a experiência tem mostrado que muitos dos compromissos assumidos não são de fato cumpridos”.
O padre também aconselha a população a não negociar diretamente com a mineradora Vale ou de forma individual, porque de maneira coletiva eles terão muito mais força para a negociação. Ele critica a situação de que muitas vezes a empresa usa a tática de dividir os atingidos para enfraquecê-los ou favorece a alguns e prejudica a outros.
De acordo com o padre, o sensacionalismo da mídia prejudica, porque as pessoas estão com medo de visitar a cidade. “Há muito medo. Parentes, amigos, visitantes, turistas se negam a vir. Isso baixa a autoestima e traz uma sensação de rejeição”.
Padre José Antônio partilha que aqueles que foram retirados de suas casas e comunidades são os que mais sofrem, pois já são quatro meses de angústias, enfrentamento da situação em pequenos quartos de hotéis, demora em receber o auxílio para o aluguel de casas, dificuldade de adaptação fora do ambiente familiar, onde existiam hortas e criação de animais e, ainda assim, quando recebem o auxílio, este é de apenas R$ 400,00.
Sofrem crianças, que ficam sem espaço e encontram dificuldades para frequentar a escola. Sofrem os ribeirinhos, sofrem idosos e pessoas com deficiência ou acamadas, que acabam deprimidas ou adoecem ainda mais.
A Prefeitura se sente impotente, pois não tem recursos e a demanda aumentou demais, sobretudo na área da saúde, física e mental. O comércio também teve seu movimento drasticamente abalado. Alguns bancos e os Correios chegaram a fechar portas.
Com quase 300 anos de história, a Igreja de Nossa Senhora Augusta do Socorro, é a que mais sofre risco caso a barragem venha a estourar. Localizada na Zona Rural, área de maior risco, onde os moradores já foram retirados, a Igreja de 1737 é a mais antiga do município. Os bens culturais foram transferidos para a Igreja Matriz, visando sua proteção.
Em declaração ao A12, o Iphan afirma que está definindo uma linha de trabalho conjunta e diária com o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA), para ações integradas e articuladas principalmente visando a identificação, em mapa georreferenciado, de todos os bens culturais acautelados (incluindo bens materiais, imateriais e arqueológicos) na área de risco como um todo.
O Iphan vem colaborando com os Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual para a avaliação dos riscos e possíveis danos ao patrimônio cultural.
Boleto
Carregando ...
Reportar erro!
Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:
Carregando ...
Os comentários e avaliações são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site.