Espiritualidade

A fase roxa e a Quaresma

joao-baptista (Arquivo Pessoal)

Escrito por Dom João Baptista Barbosa Neto, OSB

16 MAR 2021 - 08H33 (Atualizada em 14 MAR 2022 - 08H15)

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Quem é católico sabe que a cor roxa está ligada a dois tempos litúrgicos, o do Advento e o da Quaresma, ambos com significativo empenho penitencial, de modo mais particular o segundo.

Como nos encontramos no período quaresmal, irei me deter exclusivamente a este tempo. Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou estado de pandemia em todo o mundo. Desde então, o alerta tem invadido nossos lares, comércios, escritórios, escolas e igrejas, para nos lembrar dos cuidados para evitar ao máximo a contaminação. O álcool em gel e as máscaras, tornados acessórios sempre presentes e obrigatórios, ainda são utilizados por boa parte da população de maneira inadequada.

Quando foi oficializada a pandemia, já estávamos na quaresma. Esta, em 2021, já é a segunda quaresma que vivemos ou, pode-se dizer, vivemos uma única grande quaresma. Tem sido um tempo de penitência para todos. Alguns sofreram mais diretamente, no próprio corpo, atingidos pelo vírus e até morrendo em consequência dele. Outros sofrem com as suas consequências, o desemprego, a falência, a falta de recursos, a depressão, a ansiedade... a lista de problemas vai longe, mas todos nós fomos atingidos.

A pandemia vem se arrastando e causando destruição a cada dia. Milhares de infecções e mortes são noticiadas diariamente. Mesmo com a vacina, a esperança para barrar o vírus, os números de casos e mortes não deixam de aumentar, em grande parte ocasionados pelo descaso e indiferença com o descumprimento das normas sanitárias, como lavar as mãos, o uso de álcool e de máscaras e o distanciamento social. Também as fake news, notícias falsas espalhadas rapidamente pelas redes sociais, geram confusão entre o povo, atrapalhando ainda mais o combate ao vírus.

O governo do Estado de São Paulo decretou a fase roxa (emergencial), iniciada em 15 de março de 2021, que se estenderá até o dia 30 do mesmo mês. A paleta de cores aumentou, fazendo que o vermelho, o de alerta máximo, tenha perdido seu posto.

Ainda crianças, aprendemos na escola a classificação técnica, natural e até mesmo psicológica das cores, sendo elas primárias, secundárias, terciárias e neutras, assim como quentes e frias. Às vezes nos esquecemos, mas as cores também podem conter uma simbologia espiritual.

Na teologia das cores, o roxo, que é uma cor secundária formada a partir da adição entre o vermelho e o azul, representa justamente a humanidade que se deixa transformar, que se permite crescer. O vermelho é a cor do sangue, do sacrifício e do amor, faz alusão à condição humana, do seu lado terreno. O azul, por sua vez, é a cor do céu, da transcendência e da verdade, ou seja, o caráter espiritual.

A junção do vermelho e do azul, uma cor quente e a outra fria, que gera o roxo, é o ser humano completo, sua condição carnal e espiritual. Lembra a condição frágil e pecadora, a qual é inerente a todo homem e a toda mulher, mas também a esperança da vitória sobre o pecado, nosso destino como Filhos de Deus. Por isso mesmo, ao utilizar o roxo durante o tempo da quaresma, a Igreja quer lembrar a necessidade de conversão, pois é este um tempo favorável como o itinerário de quarenta dias nos quais a graça divina jorra como abundante fonte sobre nossas vidas.

São Bento (480-547) nos ensina em sua regra que o monge deve viver toda sua vida como se fosse uma longa quaresma. Ele queria com isso, que o religioso e a religiosa tivessem sempre diante de si sua condição de necessidade do sagrado, de um Deus que os salva de sua miséria. Devemos reconhecer que somos pecadores, mas que também somos preciosos aos olhos de Deus, que não quer a morte do pecador, mas que ele se converta e viva.

Mesmo num longo tempo de penitência como o que estamos vivendo, muitos ainda não aprenderam ou alimentados pelo medo, esqueceram que logo após vem a ressurreição, a vitória contra todo o mal. Cristo vence a tudo e se estamos com Ele, também nós somos vencedores. Confiemos, pois depois do roxo, nos vestimos de branco, de dourado, de luz. Que nossa fé possa ser maior e mais forte que o medo e a morte.

Escrito por
joao-baptista (Arquivo Pessoal)
Dom João Baptista Barbosa Neto, OSB

Monge do Mosteiro de São Bento (SP) e escreve sobre Espiritualidade e Vida Monástica.

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