“Então vocês declararão perante o Senhor, o seu Deus: 'O meu pai era um arameu errante. Ele desceu ao Egito com pouca gente e ali viveu e se tornou uma grande nação, poderosa e numerosa. Mas os egípcios nos maltrataram e nos oprimiram, sujeitando-nos a trabalhos forçados. Então clamamos ao Senhor, o Deus dos nossos antepassados, e o Senhor ouviu a nossa voz e viu o nosso sofrimento, a nossa fadiga e a opressão que sofríamos. Por isso o Senhor nos tirou do Egito com mão poderosa e braço forte, com feitos temíveis e com sinais e maravilhas. Ele nos trouxe a este lugar e nos deu esta terra, terra onde há leite e mel com fartura”. (Dt 26,5)
Para conhecermos um pouco mais as Sagradas Escrituras, inclusive, a ligação de Jesus com a história de seu povo, precisamos conhecer um pouco sobre a Civilização Aramaica.
Os arameus foram um antigo povo semítico que habitou as terras do chamado Crescente Fértil, na região que abrange partes do atual Oriente Médio, incluindo partes da Síria, Turquia, Iraque e Irã, durante grande parte da história antiga. O povo arameu deixou profundas marcas na história da região, contribuindo significativamente para a cultura, língua e política do mundo antigo.
Origem da civilização aramaica
Além do texto do Livro do Deuteronômio com o qual iniciamos este artigo, várias passagens de outros livros da Bíblia mencionam os Arameus. Este povo era oriundo da Mesopotâmia, do lugar chamado de Aram-Naharaim, ou Aram dos dois rios, além das regiões circunvizinhas, como a Síria, a Pérsia, o vale do Jordão ou as montanhas do Líbano.
Basicamente os arameus formavam tribos de pastores que habitavam a região de Arã-Naharaim, fazendo fronteira com Assur (até 323 a.C.), quando foi absorvida pelos gregos que renomearam a região como Selêucida (323–64 a.C.). Conquistada pelos romanos, a região recebeu o nome de Síria (64 a.C.-636 d.C.) que mantem até nos dias de hoje.
Os arameus desempenharam um importante papel na história política do Oriente Médio. Por volta do século II a.C., conseguiram estabelecer vários estados independentes conhecidos como “reinos arameus”. Um deles, o Reino de Arã, com sua capital em Damasco, se destacou, exercendo influência sobre a região por vários séculos, chegando a desafiar a hegemonia dos reinos vizinhos, incluindo Israel e Judá.
Conforme narra o Segundo Livro de Samuel, no processo de ocupação pelos Hebreus, o Rei Davi enfrentou e venceu o reino arameu de Damasco, capital da Síria moderna.
Davi se apossou de mil dos seus carros de guerra, sete mil cavaleiros e vinte mil soldados de infantaria. Ainda levou cem cavalos de carros de guerra, e aleijou todos os outros. Quando os arameus de Damasco vieram ajudar Hadadezer, rei de Zobá, Davi matou vinte e dois mil deles. Em seguida estabeleceu guarnições militares no reino dos arameus de Damasco, sujeitando-os a lhe pagarem impostos. E o Senhor dava vitórias a Davi aonde quer que ele fosse. (II Sam 8, 4-6)
A língua falada por Jesus
A língua aramaica se consolidou como uma das línguas semíticas mais importantes da antiguidade, falada não apenas pelos arameus, mas como língua básica, sendo amplamente utilizada em toda a região. Sua influência linguística foi bem vasta e o aramaico acabou sendo adotado como a língua administrativa do Império Persa, usada em documentos oficiais e diplomáticos.
O aramaico foi uma das línguas faladas por Jesus Cristo e pelos seus discípulos, tornando-se importante no contexto do Cristianismo primitivo. Jesus falava o aramaico porque era a língua do dia a dia em todo o Oriente Médio. Se o grego era a linga comercial, o aramaico era falado pelas pessoas mais simples em seu quotidiano, tanto que partes do Novo Testamento foram escritas nesta linga e o evangelho preserva várias expressões em aramaico.
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O povo que vivia em cidades e pequenas povoações da Galileia, na região norte e em cidades como Cafarnaum, Nazaré, Caná, Tiberíades, Corazim falava o aramaico.
Ali Jesus foi educado, cresceu e passou a maior parte de sua vida.
Fora das fronteiras da Galileia, o aramaico também era falado e entendido porque somente se usava a língua hebraica no ambiente religioso.
Herança dos arameus
Além das realizações políticas e linguísticas, os arameus deram diversas contribuições para a cultura e sociedade do Oriente Médio antigo. Sua arte e artesanato refletiam a rica tradição cultural, evidenciada nas esculturas, cerâmicas e artefatos como os que foram descobertos em sítios arqueológicos dos arameus. Eles também eram conhecidos pelas habilidades comerciais e pelas técnicas agrícolas avançadas que contribuíram para a prosperidade de suas cidades e de seus reinos.
Seu apogeu e queda estão ligados às mudanças políticas e militares da região. A partir do século VIII a.C., o domínio assírio levou à gradual assimilação dos arameus em seus vastos domínios. Depois veio a dominação do Império Neobabilônico e do Império Persa Aquemênida, que governaram sobre as terras arameias, consolidando a influência persa na região e marcando o declínio de sua civilização.
Apesar de terem perdido a independência política, o legado dos arameus perdurou através dos séculos, principalmente através da língua e da cultura que continuaram a influenciar o desenvolvimento do Oriente Médio até os dias atuais.
Atualmente, pouco mais de dois mil arameus considerados puritanos vivem na Síria, na Turquia e numa pequena região do Iraque, mas estão ameaçados de extinção por conviverem em um ambiente próximo do domínio islâmico, enfrentando exércitos turcos e guerrilheiros curdos.
O povo arameu continua, entretanto, representando uma peça importante no quebra-cabeça da história de ontem e de hoje do Oriente Médio, como testemunho de uma civilização que deixou sua marca duradoura na região.
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