Homilia 27º Domingo Comum
Lc 17,5-10
A semana se inicia no domingo para os discípulos-missionários de Jesus. Na vivência da fé cristã o domingo é o dia mais expressivo e marcante do nosso esforço de fidelidade, formação e crescimento espiritual. Celebramos e atualizamos nele a ressurreição de Jesus. Por ela o corpo martirizado do Cristo, tornou-se o acontecimento fundante que deu para os seus discípulos todo o mérito da fé perante Deus. Logo, viver a entrega de si a Deus na fé por meio do jeito de ser do Senhor Jesus caracteriza e distingue o agir do cristão no mundo.
A força poderosa da fé é invisível, mas é maior do que qualquer realidade natural visível e concreta
A força poderosa da fé é invisível, mas é maior do que qualquer realidade natural visível e concreta: árvores de fundas raízes, montanha, ou mar. Mas, só estará presente e agirá no íntimo de alguém se for acolhida como dom de Deus, na humildade e na disposição de servir só a Ele. Exemplo dessa verdade é o texto do profeta Habacuc (1ª leitura da missa). Nos anos 600 AC, o profeta pedia a Deus que libertasse o povo hebreu submetido às humilhações de vizinhos mais poderosos. Tantas súplicas e parecia-lhe que Deus estava alheio às grandes desordens políticas e sociais do tempo. Iluminado por uma inspiração divina o profeta Habacuc exortava seus compatriotas a resistirem com paciência às adversidades perseverando na fé, pois conforme a palavra do Senhor: “o justo viverá por sua fé”. (2,4).
Já na vida de Paulo, a fé em Jesus Cristo tinha feito dele prisioneiro do cárcere romano lá pelo ano 67 DC, (2ª leitura). Nesta provação ele escreveu a 2ª carta a Timóteo. Na expectativa do martírio próximo repassa a Timóteo, seu antigo companheiro missionário que então dirigia a Igreja em Éfeso, como que o testamento espiritual. Exorta-o a “reavivar a chama do dom de Deus”, a “não se envergonhar do testemunho de Jesus aceitando sofrer por causa do Evangelho”. A “guardar o precioso depósito (da fé) com a ajuda do Espírito Santo que habita em nós” (2ªTim.6, 14).
Na catequese de Lucas percebemos a preocupação cristã em ser resiliente (enfrentar crises e superar limites) em meio ao estilo de vida da sociedade pagã greco-romana, lá no começo da Igreja. Como reagir e resistir naquele ambiente hostil e escandaloso? Ora, os apóstolos também passaram grandes dificuldades na vivência do discipulado. Lucas liga o tema ao ensino de Jesus que por meio de comparações impactantes explicara a eles o poder e a força da fé se assumida e posta por nós a serviço do Reino de Deus. O texto do capítulo 17, 5-10 nos diz que o poder da fé vem de Deus e só por ela superamos nossas limitações. Mas, o contato com Deus não é recompensa de méritos e sim fonte do serviço generoso. Leia: Lucas, 17,5-10.
O pedido dos apóstolos no texto: Senhor, aumenta a nossa fé! talvez seja o reflexo de uma crise vivida pela comunidade de Lucas na prática da fé em Jesus. As comunidades experimentaram o fracasso na evangelização. Quem sabe já seria decadente o fervor dos primeiros tempos em diversos grupos cristãos. Os discípulos envolvidos pela massa da sociedade pagã voltada para a idolatria, sentiam-se sufocados e meio perdidos como pequeninos arbustos numa grande floresta. Ora, se há fracasso numa comunidade é preciso repensar a prática da fé antes de tudo. Avaliar a qualidade da vivência e não tanto os projetos.
Era necessário repensar como fora a “prática de Jesus”. Lá e hoje aqui nós precisamos viver enraizados nele. Confiar no poder da fé em Cristo. Compare-se ela ao grãozinho de mostarda. Na aparência algo pequenino e insignificante, mas guardando dentro dele um poder inimaginável que o leva a deitar fundas raízes, crescer, vicejar e espalhar ramos e galhos como uma árvore. Assim deve ser a nossa fé no Senhor Jesus. Na aparência somos fracos, sem influência e prestígio social. Unidos aos outros na comunidade vamos superar os maiores impasses. E Jesus acentua a comparação: se fosse possível medir o ato de fé ao tamanho do grãozinho de mostarda, ele bastaria até para transplantar no mar uma árvore de raízes profundas como a amoreira.
A fé é um investimento que Deus faz em nós.
O texto enfoca outro aspecto. A fé é um investimento que Deus faz em nós. É uma tarefa, um serviço, um encargo que sua misericórdia nos confia. Daí a evangelização, os trabalhos da comunidade não geram para ninguém qualquer direito à remuneração divina. O discípulo não passa de humilde empregado. Está a serviço do Evangelho sem exigir recompensas. E apesar disso, compara-se ao “servo inútil”, que sendo serviçal em tudo, apenas cumpre seu dever. É evidente aqui a referência de Jesus aos fariseus e à mentalidade da aristocracia política. Eram minuciosos na observância ritual e exterior da lei mosaica e imaginavam ter direitos adquiridos perante Deus. Ou seja, julgavam-se bons e cumpridores à risca da Lei religiosa mosaica. Imaginavam-se com direitos adquiridos perante o Senhor. Não é por aí a “a teologia da prosperidade”, muito em moda em várias seitas?
O discípulo (a) de Jesus, não vive assim a fé. Uma religião de méritos! Quem recebe o dom da fé está serviço do projeto de vida de Jesus. A fé nele, não produz merecimento. Produz o amor serviçal, humilde e desinteressado. É da sementezinha da fé em nosso coração que vem o testemunho cristão no mundo, fecundando aí os valores do Evangelho. Nosso olhar então repousa na primeira cristã, Maria! A servidora fiel do Senhor. Desde a anunciação conviveu com o mistério do Cristo, nas aparências do fracasso até o final do Calvário. Sua fé mais forte que o mar regou com lágrimas a Igreja que nascia ali nas dores de parto da cruz. Por isso, podemos apresentar a Deus em nosso favor, também os “créditos” de sua intercessão por nós.
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