A misericórdia é fruto da fé dos que creem no Reino de Deus. Ela não é uma teoria e nem um “produto” de uma prateleira de mercado, que podemos pegar e pagar. Ela é dom e resultado de uma experiência, isto é, de um encontro confiante com Jesus, o Deus-Filho de Deus-Pai. A sua vinda ao mundo é prova máxima do quanto Deus é misericordioso, que nos ama e nos perdoa, a fim de que vivamos como filhos(as) de seu Reino. Pois Ele sabe quem somos: necessitados de sua misericórdia, dada a desobediência de Adão e Eva, que nos seduz a todo instante.
Em uma de suas obras, o Venerável Fulton Sheen escreveu que “não temos medo de Deus não nos amar devidamente, mas de Deus nos amar demais”. Porque o amor liberta, cura, cuida e não exige nada em troca, mas compromete-nos. Sentimo-nos movidos a responder ao amor, amando. Igualmente é a misericórdia de Deus para conosco, um gesto extraordinário de amor concreto, cuja iniciativa é dele, na qual nos concede para viver em seu Reino de amor. A misericórdia, então, é como uma porta para ingressarmos no Reino de Deus. E, nessa analogia, Jesus é como se fosse sua maçaneta, que precisamos tocar, nos apoiar e sentir a energia de seus ensinamentos de Mestre. Somente Ele nos ajudará a ter forças para abrir e passar por tal porta, que nunca estará trancada para quem tem fé, a fim de termos acesso ao Reino do Pai.
Entretanto, o egoísmo presente no mundo é o pecado que desconsidera a voz do Espírito e enfraquece as forças humanas de irem em direção dessa porta da misericórdia e, logo, de Jesus, pois bloqueia o coração. O que já alertava São João Paulo II: “A pior prisão é um coração fechado”. A pessoa se fecha em torno de si mesma, desejando ser o centro das atenções e optando ficar pelo lado de fora da porta da misericórdia, para construir um reino próprio de soberba, ilusões e frustrações.
Hoje em dia, com a conectividade sem fronteiras e limites, tornou-se mais fácil construir e viver sob “reinos próprios”, isto é, em guetos, grupos, panelinhas, bolhas, e em “pedaços”, quando convém, desconsiderando ou insensibilizando pelo diferente. O Papa Francisco, no seu discurso aos diplomatas em dezembro passado, escreveu que é preciso ter sensibilidade para combater a Terceira Guerra Mundial em pedaços, haja vista os conflitos recorrentes, crescentes e permanentes. Como cristãos, não podemos nos acostumar com nenhuma forma de violência e segregação.
Pelo nosso batismo, precisamos ser “sal e luz no mundo”, no aqui e agora da história. Nesse sentido, querer construir o Reino do Pai e não reinos regidos pelo próprio umbigo, causando formas de violências humanas. Então, a misericórdia é a porta dessa sociedade de Deus onde a paz, o amor, a fraternidade e a amizade social são critérios para bem viver. É se permitindo passar por ela que encontraremos realização. Peçamos ao Espírito Santo de Deus, por intercessão de Maria, que nos dê ânimo para sempre ir ao encontro de Jesus e aprendermos de sua Misericórdia, ultrapassando as barreiras do pecado que nos impedem de experimentar o Reino do Pai e de ser coerdeiros dessa graça.
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