Revista de Aparecida

Com Maria, cuidar da vida em toda criação

Pesquisadores relatam o cuidado com a Casa Comum com saberes tradicionais, ciência e fé.

Escrito por Revista de Aparecida

03 OUT 2025 - 08H32 (Atualizada em 04 OUT 2025 - 18H10)

Julia Silveira

Texto por: Julia Silveira - Sob supervisão de Victor Hugo Barros 

Em virtude das mudanças climáticas e a crescente degradação ambiental, o convite a “cuidar da vida em toda criação” ganha novo sentido. Inspirado pelos 800 anos do Cântico das Criaturas e 10 anos da encíclica Laudato Si’, o segundo dia da Novena em preparação para a Festa da Padroeira traz reflexão sobre a Casa Comum. Esse cuidado ambiental também motiva o trabalho de pesquisadores na Amazônia.

Entre eles estão o professor da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e pós-doutorando da Universidade de Siena, na Itália, Jackson Matos, e a enfermeira e pesquisadora da Fundação Esperança, Franciane Matos que mostram, com fé, ciência e saberes tradicionais, que cuidar da natureza é também cuidar da vida e do futuro das pessoas.

Na Amazônia, onde há vida nas florestas, rios e comunidades tradicionais, a ameaça à Casa Comum se apresenta de modo intenso. Segundo dados da Coleção 10 do MapBiomas, a Amazônia perdeu quase 50 milhões de hectares de florestas nos últimos 40 anos. O equivalente a 22 vezes o tamanho de Sergipe.

E dessa forma, o Papa Francisco adverte: “O ambiente humano e o ambiente natural degradam-se em conjunto; e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental, se não prestarmos atenção às causas que têm a ver com a degradação humana e social" (LS, 48).

Julia Silveira Julia Silveira Ricardo, Francine e Jackson Matos

O professor Jackson Matos destaca a necessidade de uma nova harmonia entre humanidade e natureza, rompendo com a ilusão de um progresso baseado apenas no crescimento econômico.

“A gente trabalha muito com essa perspectiva desse retorno a um equilíbrio, a uma harmonia entre o ser humano e a natureza a partir de uma outra compreensão do que é a natureza”, salienta.

Para Franciane Matos, a fé é combustível para resistir às agressões contra a floresta e manter viva a esperança: “Se não for com fé, a gente não consegue seguir”, ressalta.

É justamente esse olhar, que inspira o tema do segundo dia da novena em Aparecida, ‘Com Maria, cuidar da vida em toda criação’.

“O cuidado pela casa comum e defesa da vida não é apenas um dever moral ou uma necessidade de sobrevivência, mas, sim, um chamado profundo do coração revestido dos mesmos sentimentos do Cristo Jesus”, exprime Pe. Cristóvão Mamala, C.Ss.R., pregador da Novena da Tarde.

Na Amazônia, a distância entre comunidades ribeirinhas e os serviços de saúde é grande, podendo chegar até oito horas de viagem. Essa realidade torna o acesso a medicamentos e tratamentos ainda mais difícil.

“Com as mudanças climáticas, com essa questão dos impactos ambientais ocorrendo, as secas, já são fatores que estão dificultando esse acesso do povo aos serviços de saúde”, explica a pesquisadora.

E para contornar esse empecilho, Francine conta como as comunidades mais afastadas podem ser ajudadas.

“A gente tem, por exemplo, o navio do Papa Francisco, que faz esse atendimento nas comunidades e é muito lindo porque ele tem, cada vez mais, ido a comunidades mais afastadas, como, por exemplo, Barreiras, que fica ali próximo do município de Itaituba, que é bem afastado”, afirma.

“E são locais onde não tem uma assistência, às vezes, de um tratamento mais específico ou que tenha uma tecnologia a mais, como no caso de uma ressonância magnética, de um exame mais complexo. E que o navio acaba favorecendo e levando esse tipo de atendimento”, continua ela.

Porém, mesmo com esse atendimento do Barco Hospital, muitas vezes permanecer com o uso regular da medicação se torna um problema para essas comunidades distantes que não conseguem estar sempre em contato com um sistema de saúde. Por isso, a pesquisadora explica o modo de tratamento utilizado por eles.

Arquivo pessoal Arquivo pessoal Em Belém com pesquisadores das Universidades de Siena, Firenze e Pisa.

“Quando a gente volta para os elementos da natureza, a gente tem as plantas medicinais, que ainda é uma cultura muito forte. Quanto mais afastada da área urbana, a gente tem o uso dessas espécies de cura, e que para a gente, como profissional de saúde, é um desafio porque a gente não conhece exatamente a posologia”, pondera.

Ela prossegue, “mas o comunitário, o povo tradicional, ele sabe exatamente quantas folhas daquela planta ele vai usar, quantas xícaras, com quantas colheres ele vai ter que tomar daquele chá ali para fazer aquele efeito. Então, eu vejo essa importância do diálogo entre o conhecimento científico e o conhecimento tradicional, e sempre favorecendo esse conhecimento tradicional, porque se ele persiste até hoje, é porque ele funciona. Se não, já teria desaparecido”, completa.

Ao recordar o chamado da novena, ‘Com Maria, cuidar da vida em toda criação’, a reflexão se amplia para além da devoção, tornando-se compromisso concreto com a Casa Comum. Na Amazônia, como relatam Jackson e Franciane Matos, esse cuidado se traduz em ações cotidianas de resistência e preservação, que unem saberes tradicionais, ciência e fé.

É o mesmo espírito que atravessa a encíclica Laudato Si’, quando o Papa Francisco nos lembra que “o nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos. Nada deste mundo nos é indiferente” (LS, 2). Assim, fé e responsabilidade ecológica caminham juntas, apontando para um futuro em que a criação seja respeitada como dom de Deus e herança para todos os seus filhos. “Se não, o que a gente vai mostrar, o que a gente vai deixar para as gerações futuras?”, finaliza Franciane.

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