Crescendo na Fé

O corpo na visão do cristianismo

Escrito por Jovens de Maria

14 FEV 2022 - 15H02 (Atualizada em 23 FEV 2022 - 12H17)

Eak.Temwanich/ Shutterstock

Você já teve alguma dúvida sobre o seu corpo? Se por si só ele é pecado ou se você pode utilizar da liberdade para fazer o que quiser com ele?

Essas e outras dúvidas são respondidas no texto abaixo, escrito pelo missionário redentorista Pe. Rodrigo Costa Silva. 

(Ah, o texto está fantástico e grave na sua agenda: logo, serão divulgados e-books também da Teologia do Corpo. Maravilhoso, né?)

Aproveite a leitura!

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Ao longo da história, a compreensão e percepção do corpo foi objeto de diversas interpretações. Na realidade, cada época, com seus padrões e valores, incide sobre o corpo de algum modo, já que este é o meio imediato com o qual nos expressamos e nos relacionamos com o mundo a nossa volta.

Durante vários séculos, o corpo esteve sob as proibições e interditos de diversas tradições, considerado uma incógnita, quase nunca desvelado ou exposto em lugares públicos e, muitas vezes, silenciado. 

Porém, no final do século XIX e ao longo do século XX, aconteceu uma reviravolta na percepção do corpo e da sexualidade que se expressou, sobretudo, na progressiva exposição dos corpos, no rompimento dos antigos tabus e na liberação em defesa do direito ao prazer.

Para entendermos a cultura atual acerca do corpo, é necessário fazer uma breve retrospectiva histórica. É importante ter em mente que as diversas transformações na compreensão e vivência do corpo em cada época não são rigidamente separadas, mas continuaram exercendo influência e convivendo com novas percepções ao longo dos anos.

Assistimos hoje a uma reinvenção do corpo, acompanhada de uma excessiva exaltação e exibição. De uma compreensão do corpo marcada por interditos e associada à ideia de pecado, passamos a uma idealização do corpo na qual os antigos “tabus” foram rompidos. Assim, o corpo tornou-se objeto de uma metamorfose permanente.

Mas o que a compreensão cristã tem a dizer sobre o corpo? Os atuais valores acerca da vivência da corporeidade podem ser assimilados e vividos pelo cristão? Para respondermos a essas questões partiremos das contribuições da Teologia do Corpo, do Papa João Paulo II, e das demais reflexões do Magistério da Igreja.

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Inicialmente, temos o corpo idealizado da Grécia antiga. Naquela cultura, o corpo era treinado, aperfeiçoado e exibido. Para os gregos, um corpo atlético era sinal de boa saúde e fertilidade. Não havia uma moral rígida em relação ao corpo e à sexualidade, apenas estabelecia-se certos limites. Também não havia a preocupação com o pudor. Até hoje, a imagem do corpo grego exerce atração e permanece como uma referência.

Com o cristianismo, encontramos uma nova percepção do corpo. A grande novidade cristã é a encarnação do Filho de Deus: “E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). Essa compreensão exercerá impacto decisivo sobre o entendimento e a vivência do corpo durante séculos.

Ao contrário da filosofia platônica que considera o corpo como cárcere da alma, a perspectiva cristã entende o corpo como caminho para Deus, já que o Filho de Deus, ao encarnar-se, veio ao encontro do ser humano, elevando e dignificando a corporeidade.

Infelizmente, uma determinada concepção cristã do corpo acabou se impondo ao longo dos séculos, associando o corpo ao pecado e colocando-o como objeto de diversas proibições. A concepção original judaico-cristã, que entende o ser humano a partir da unidade corpo e alma, acabou por ceder lugar à oposição corpo e alma das correntes platônicas e gnósticas, com a consequente desvalorização e silenciamento do corpo.

Por sua vez, na Idade moderna, com o advento do método científico, o corpo passou a ser compreendido a partir do olhar da ciência, como objeto de estudos e experiências. Agora, o corpo passa a ser compreendido a partir do dualismo corpo e razão.

O corpo, como os demais objetos, está subordinado a razão, podendo ser investigado e dissecado de acordo com o método científico. Com a expansão e consolidação do sistema capitalista e das grandes transformações econômicas, sociais e culturais, ao longo dos séculos XIX e XX, o corpo foi fortemente impactado por transformações inéditas, que se refletem até hoje e possibilitaram o surgimento de uma cultura somática, marcada pela supremacia do bem-estar do corpo.

Se no início da era industrial o corpo era visto como instrumento para os interesses da produção e do acúmulo de capital, hoje, o corpo passou a ser mais um objeto da indústria do consumo.

A cada dia, os medias vendem modelos e padrões estéticos de acordo com as demandas e desejos dos indivíduos. A explosão das academias, o aumento das cirurgias estéticas, a publicidade, o crescimento das indústrias da beleza e da saúde são alguns exemplos da cultura de consumo do corpo na qual vivemos.

Porém, essa cultura oscila entre a idealização e a estigmatização. Por um lado, a indústria do consumo vende a possibilidade de permanecermos jovens e belos, não obstante o passar dos anos, por outro, são excluídos aqueles que não conseguem alcançar o padrão de corpo veiculado pela publicidade.

Por tudo isso, podemos dizer que, na atualidade, assistimos a uma revolução do corpo. Outrora relegado ao esquecimento e considerado instrumento de pecado, o corpo passou a ser exaltado e exibido como um troféu, objeto dos mais diversos investimentos.

Shutterstock/ FOTOGRIN
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Mas como o cristão deve se comportar face a esta revolução do corpo?

O que a fé tem a nos dizer sobre nossa experiência e valorização do corpo? A Sagrada Escritura compreende o ser humano composto de basar (corpo), nefesh (alma), ruah (espírito), os quais não podem ser separados, mas integrados, designando o ser humano em sua totalidade.

O relato bíblico de Gn 2 descreve poeticamente a criação do ser humano. Afirma-se aí que a criação do ser humano é obra de Deus, que o plasmou a partir do limo da terra e insuflou o hálito da vida em suas narinas.

Ser plasmado da terra e insuflado por Deus evocam a fragilidade do ser humano e sua radical dependência de Deus. Fundamental é a compreensão do ser humano como uma uni-totalidade criada. Com a novidade da encarnação da Palavra divina no Novo Testamento, o tema do corpo alcança seu ápice. A salvação no cristianismo não é um processo de iluminação e desprezo do corpo como nas correntes platônicas e gnósticas, mas ela acontece no corpo.

É no corpo que Deus participa da nossa humanidade e nós participamos de sua divindade. E o que dizer das referências bíblicas que associam a carne e o corpo ao pecado (cf. Rm 8,13; Gl 5,13-25)? O Apóstolo Paulo em suas Cartas condena a carne e o corpo que foram desfigurados pelo pecado, isto é, que se entregaram aos excessos e incorporaram valores contrários à sua natureza. Mas nunca é dito que o corpo é em si negativo e pecaminoso.

A partir dessa síntese sobre as principais reflexões encontradas na Sagrada Escritura sobre a importância e a dignidade do corpo, e considerando o contexto atual no qual o corpo se encontra hipervalorizado, podemos dizer que o cristão deve ter do seu corpo uma visão positiva, reconciliada e crítica.

Não podemos prescindir do nosso corpo em nossa vida de fé, pois desde a Encarnação, o corpo se tornou sacramento, lugar de encontro com Deus.

O pecado não está no corpo em si mesmo, mas nos excessos que se apoderam da nossa corporeidade. O cristão pode, sim, cuidar do corpo visando a saúde e o bem estar, pois isso é sinal do valor que o corpo tem no horizonte da nossa fé. Porém, é preciso manter sempre um juízo critico diante dos excessos que a cultura do consumo impõe sobre nossos corpos.

Mais que promovê-lo, a indústria do consumo objetifica o corpo ao impor padrões inalcançáveis, sendo um empecilho para a integração e reconciliação com o nosso corpo imperfeito, mas nem por isso menos importante e digno de ser valorizado.

A exaltação do corpo não denuncia a nossa pouca habilidade de nos aceitarmos como somos, com nossas imperfeições e vulnerabilidades? O corpo idealizado que se contradiz não deixou de ser caminho para Deus e para o próximo?

Pe. Rodrigo Costa Silva, C.Ss.R.

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