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A voz dos profetas e dos povos ecoa em Belém (PA)

COP 30 é marcada pelo protagonismo dos que vivem e defendem os territórios, a vida que brota deles

Karla Maria (arquivo pessoal)

Escrito por Karla Maria

14 NOV 2025 - 15H12 (Atualizada em 14 NOV 2025 - 15H42)

Reprodução/ Hellen Loures (CIMI)

Era 2009 e uma multidão realizava uma vigília em frente ao rio Madeira, em Porto Velho (RO). Manifestava-se contra os impactos ambientais das obras da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, que, naquela ocasião, inundara um cemitério, a cultura e a memória dos ribeirinhos.

Aquela multidão compunha a Caminhada dos Mártires. Homenagens foram feitas a defensores da Terra e dos povos, como irmã Dorothy Stang, que foi assassinada em 12 de fevereiro de 2005, aos 73 anos de idade. A religiosa americana lutou, por décadas, na região amazônica contra o desmatamento e pelos direitos dos pequenos agricultores e dos trabalhadores.

Como lembra o jornalista Edmilson Rodrigues de Souza, do Sumaúma, irmã Dorothy idealizou, junto com outras lideranças, um modelo de assentamento rural que recebeu o nome de Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS).

“Os PDSs consistem em assentamentos regularizados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), organizados a partir de atividades agroextrativistas realizadas em harmonia com a floresta. Pelo menos 20% das terras são destinadas à agricultura familiar, enquanto os outros 80% são áreas comuns para extrativismo ambiental.”

Irmã Dorothy era uma defensora da terra, uma ambientalista, e sua memória foi recordada recentemente, em Belém, durante a COP 30, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, que acontece na capital paraense até o dia 21 de novembro. Lá, líderes mundiais, cientistas, representantes de organizações não governamentais e da sociedade civil compartilham ideias e ações que mitiguem a emergência climática.

A memória de irmã Dorothy e de tantos outros, como Chico Mendes (1944-1988), seringueiro, sindicalista e ativista ambiental; Margarida Maria Alves (1933-1983), trabalhadora rural e sindicalista morta em Alagoa Grande (PB); e do bispo Óscar Romero (1917-1980), hoje santo, morto por ódio à fé em El Salvador, foi resgatada durante a Caminhada dos Mártires, a mesma realizada em 2009, frente às obras da Usina de Santo Antônio.

Desta vez, a Caminhada dos Mártires inseriu-se como uma atividade paralela da COP 30 e, com a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, a Rainha da Amazônia, à frente, reuniu o povo que seguiu em caminhada da Praça Santuário de Nazaré até a Basílica de Nossa Senhora, para lá participar de missa presidida pelo arcebispo de Porto Alegre (RS), cardeal Jaime Spengler, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Outros 40 bispos do Brasil e de outras regiões da América, da Ásia, da África e da Europa concelebraram a missa.

Orações, cantos e denúncias de que é preciso, e de modo urgente, agir em defesa da criação marcaram a cerimônia.

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Resistência indígena

Entre as lideranças globais, os povos indígenas marcam presença como verdadeiros guardiões da natureza, defensores da justiça ambiental e da resistência diante da crise climática. “O indígena está curando o mal da terra, dessa governança perversa. A busca por proteção da terra é a busca indígena”, disse Fabíola Fabrício Braz, indígena Pankararu.

Natural de Paulo Afonso, cidade no sertão baiano, às margens do Rio São Francisco, Fabíola é paleontóloga e atuante na sociedade em defesa dos direitos indígenas e da natureza. Em uma longa entrevista à nossa reportagem, Fabíola falou de sua ancestralidade e do conhecimento oral transmitido de geração em geração, hoje desvalorizado pela sociedade de modo geral.

“Sempre houve essa mensagem de que os indígenas deveriam ficar nos seus territórios, com autonomia e sem venenos geneticamente modificados [...] é preciso levar em conta os saberes ancestrais.”

Como profetas do nosso tempo, os povos indígenas têm marcado presença na COP 30, denunciando o avanço de projetos de infraestrutura que ameaçam seus territórios e outros povos, como é o caso do povo Munduruku, que denuncia os impactos na bacia do Tapajós e do Xingu.

“A gente não aceita nenhum empreendimento dentro dos nossos territórios, e a gente não aceita a privatização da vida dos nossos filhos”, disse Maria Leusa Munduruku, em protesto com seu bebê em frente ao pavilhão da COP, ao falar com jornalistas da Sumaúma. Ela disse que o recado foi dado para mostrar que as mulheres, caciques e lideranças estão na luta contra qualquer tentativa de privatização ou empreendimentos nos territórios indígenas.

“O que eles querem fazer com o Rio? Eles querem entregar isso para os empreendimentos, construir empreendimentos para dentro do nosso Rio Tapajós. E a gente não vai aceitar, não vai se calar, não importa onde a gente esteja, a gente sempre vai denunciar e sempre vai falar pela vida dos nossos filhos, declarou.

O povo Munduruku, do Pará, é um dos mais atingidos pelo garimpo ilegal, que se intensificou entre 2019 e 2022. “A gente está largado enquanto está sofrendo com garimpo, agrotóxico, mercúrio. Não adianta negociar o futuro dos nossos filhos, não adianta negociar a nossa Mãe Natureza, afirmou Alessandra Munduruku, liderança indígena do Médio Tapajós, em frente à porta da Zona Azul da COP 30.

As crianças que estão aqui sofrem na base, com mercúrio no seu corpo, com agrotóxico no seu corpo. Já chega de usar a nossa imagem para dizer que é sustentável, para uma bioeconomia que vai destruir a nossa floresta. Nosso rio está contaminado pelo garimpo”, denunciou. “O Estado está matando a floresta, destruindo para colocar ferrovia, hidrovia, portos, para essas empresas internacionais chegarem.”

Cimi marca presença na COP

Presente com uma delegação de cerca de 100 pessoas, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) reforça que o enfrentamento da crise climática “exige decisões políticas, éticas e econômicas firmes, capazes de romper com a lógica da mercantilização da natureza”.

Em documento, o Conselho convoca à mobilização global por rupturas sistêmicas, que passam pela demarcação integral dos territórios indígenas, pela reparação das dívidas históricas e ecológicas e pelo reconhecimento do ecocídio como crime internacional.

“Os grandes poderes econômicos precisam pagar e não lucrar pela preservação, e os Estados precisam garantir recurso público, que se traduz em políticas públicas de garantia, de proteção ambiental e da proteção dos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, particularmente dos direitos territoriais”, aponta o secretário-executivo do Cimi, Luis Ventura.


.:: Acompanhe a cobertura da COP 30 pela Rede Aparecida de Comunicação em a12.com/cop30

Escrito por:
Karla Maria (arquivo pessoal)
Karla Maria

Jornalista e escritora, autora de quatro livros que tratam sobre fé e direitos humanos, cada um a seu modo. É mestranda em História na Unesp. Foi finalista do Prêmio Vladimir Herzog 2024, é TEDx Speaker, mãe do pequeno João, antirracista e devota de Nossa Senhora Aparecida. (@karlamariabra)

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