Espiritualidade

Educar para a 'mimesis' da Verdade

Joana Darc Venancio (Redação A12)

Escrito por Joana Darc Venancio

21 JUN 2021 - 10H49 (Atualizada em 21 JUN 2021 - 11H28)

Vamos refletir sobre mimesis? O filósofo Platão, em sua Obra “A República”, criou este conceito para refletir sobre a arte. Para ele, por mais que o artista tente, nunca representará em sua obra o que é o real, mas apenas uma ideia do real.

O filósofo Aristóteles, discípulo de Platão, aprofundou o conceito de seu Mestre e passou a entender a mimesis como uma possiblidade para além de ser apenas uma cópia simples do real. Dessa forma, seria como um processo de criação e recriação, assim como acontece na natureza.

Ele definiu que a mimesis tem duas dimensões: a imitação e a emulação. A imitação é a cópia do real e a emulação é a recriação do real, ou seja, o agir objetivado, o nosso criar e recriar, a marca de cada sujeito, em sua geração, no mundo. Neste contexto, imitei e posteriormente serei imitado. "A exemplo da santidade daquele que vos chamou, sede também vós Santos em todas as vossas ações, pois está escrito: sede santos porque Eu sou Santo!" (I Pedro 1, 15-16)

Essas questões nos fazem pensar na identidade do cristão. Imitar é o verbo que nos identifica. É preciso imitar o Mestre, assim como Ele mesmo orientou:

"Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque eu o sou. Logo, se eu, vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar-vos os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, assim façais também vós". (João, 13, 13-15)

Leia MaisEducar e instruir para o Éthos A imitação é um comportamento inerente à condição humana. Aprender com os outros faz parte do processo de formação da pessoa. Muitas teorias educacionais se dedicam ao estudo da imitação e a ela conferem credibilidade como proposta educativa. É na imitação que os hábitos se consolidam, que o comportamento é moldado, que as primeiras bases de nossas escolhas são traçadas.

Os preceitos morais não são fruto da instrução, mas sim do hábito, de acordo com Aristóteles em sua obra Ética a Nicômaco. Para ele, é através do hábito que devemos apostar na possibilidade de uma formação que garanta um comportamento para o bem.

No comportamento diário, aprendemos pela imitação do outro e repetimos como comportamento pessoal, tornando-se assim, uma “segunda natureza”, quando passamos do vício para a virtude. A natureza nos dá a capacidade de receber as virtudes, e tal capacidade aperfeiçoa-se com o hábito, diria o filósofo grego na mesma obra.

E a Palavra de Deus ensina que:

"Tomo hoje por testemunhas o céu e a terra contra vós: ponho diante de ti a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas com a tua posteridade..." (Dt 30, 19).

E eis a grade interrogação: aqueles que nós imitamos, ao longo da formação de nosso caráter nos permitiram escolher a vida ou a morte; o bem ou o mal? Quem nossas crianças, adolescentes e jovens estão imitando?

RozochkaIvn/ Shutterstock
RozochkaIvn/ Shutterstock

É nesta condição que surge a preocupação com a educação para a mimesis. No contexto social atual, a quem devemos imitar? Quais modelos têm sido divulgados e promovidos pela mídia, pelo mercado, pelo relativismo e pelo ceticismo entranhados na sociedade, como referências a serem imitadas? Quem são os heróis a serem enaltecidos? Quais são as “verdades” ilusórias a serem propagadas?

São João Paulo II, na Introdução da Carta Encíclica Veritatis Splendor (1) alerta:

"O homem é continuamente tentado a desviar o seu olhar do Deus vivo e verdadeiro para o dirigir aos ídolos (cf. 1 Ts 1, 9), trocando «a verdade de Deus pela mentira» (Rm 1, 25); então também a sua capacidade para conhecer a verdade fica ofuscada, e enfraquecida a sua vontade para se submeter a ela. E assim, abandonando-se ao relativismo e ao ceticismo (cf. Jo 18, 38), ele vai à procura de uma ilusória liberdade fora da própria verdade".

É preocupante o ataque aos valores oriundos da Verdade. Assistimos ao acelerado recrutamento promovido pelas “verdades ilusórias”, que parecem tomar conta de todos os espaços, arrebanhando imitadores e, consequentemente, promotores das mesmas. Podemos dizer que são as “novas arenas” e “novos leões”, que devem ser enfrentados pelos seguidores da Verdade. Urge educar para a Imitação do Bem, para imitação do Bom, imitação das Virtudes.

Quando somos educados para a imitação da Verdade, facilmente percebemos as tentativas das “verdades ilusórias” de nos arrebanhar:

"Irmãos, sede meus imitadores, e olhai atentamente para os que vivem segundo o exemplo que nós vos damos” (Fl 3, 17).

Escrito por
Joana Darc Venancio (Redação A12)
Joana Darc Venancio

Pedagoga, Mestre em educação e Doutora em Filosofia. Especialista em Educação a Distância e Administração Escolar, Teóloga pelo Centro Universitário Claretiano. Professora da Universidade Estácio de Sá. Coordenadora da Pastoral da Educação e da Catequese na Diocese de Itaguaí (RJ)

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