O novo normal, forçado pela pandemia, que poderíamos chamar de "processo de rapidação", exigiu mudanças em inúmeros âmbitos do mundo. Tocou os estabelecimentos comerciais, que se despertaram para o delivery; tocou o ambiente corporativo para transformar sua gestão e interligar a empresa à casa do colaborador; tocou a Igreja para que encontrasse uma forma nova de possibilitar experiências de fé; entre outros. Então, nasceram as Missas on-line, surgiram lives formativas, cultos remotos e por aí vai. São as novas formas de se conectar ao Sagrado? Há perigo nisso? Até onde a religião pode ir no mundo digital? Será que pode desbravar?
Primeiro, precisamos entender que os templos vazios geraram ou transformaram as próprias casas em um templo. Hoje, o banco da capela se tornou o sofá da sala. As casas se tornaram espaços propícios para comunhão, já que não se pode “comer a eucaristia”. No fundo, temos um novo ambiente para a fé que é encontro, ou, se preferir, experiência de encontro com o Sagrado, que vem ao nosso encontro. Podemos até dizer que a “virtualização” da vida já aconteceu, quando nos deparamos com o fato de que Deus se conectou a um ser humano, puramente gente, para que assim o ser humano pudesse se conectar ao Divino.
Leia MaisWebdocumentário "Igreja e Comunicação: Desafios e perspectivas"Assim, podemos perceber que, embora entendamos que tudo isso que estamos vivendo virtualmente seja novo, sua forma já estava presente.
Hoje, esse formato ganha um novo jeito com a internet. A fé não se perde, mas ganha uma nova mediação. A Fé sempre passou por uma mediação, e toda mediação vem de uma narrativa tecno-lógica. Exemplo: a técnica da fala, que Jesus usou para pregar, permitiu e permite que o ser desenvolva sua própria humanidade, sendo que texto, imagem e fala, tudo está interligado.
Esse novo tempo exige uma nova forma de contato, mesmo que não estejamos perto. Hoje, o contato nasce de uma interação que tem fala, vídeo, áudio. Nunca podemos pensar numa rede como robôs. A rede é uma conexão de pessoas humanas com sentimentos, crenças, fé, espiritualidade e incredulidade. Hoje, o com-tato, brota do sentimento. A fala do padre, o sermão do pastor, a música da liturgia, é esse contato com os humanos plugados na rede. O com-tato é tudo aquilo que nos tateia, que toca a nossa pele, arrepia, causa frios e calores internos. Esse é o novo contato que provém do confinamento litúrgico.
Vivemos uma ecologia comunicacional. Estar em comunhão ou em comunidade pelo ambiente virtual se tornou a saída, digamos assim, para vivermos ou expressarmos a fé nesse tempo. Porém, precisamos pensar que a tecnologia precisa apenas mediar essa experiência. A fé sempre será expressão da intimidade. Quando olhamos por essa lente, a sombra que é colocada sobre o tema da virtualização da fé é dissipada por uma luz. Por outro lado, estamos percebendo o valor ou a importância da presença, do estar junto, compartilhando e recebendo o mesmo calor em um templo.
Por fim, me parece que os templos vazios estão, de alguma maneira, modificando a forma de ser Igreja de um povo e de uma religião. É tempo de frequentar nossos vazios. Por isso, os olhos que se abrem para esse novo mundo, não podem mais se fechar. A mente que se abre para esse novo mundo, não pode mais voltar atrás. Não se experimenta a fé apenas dentro de quatro paredes, nem, tampouco, entre os fios de uma rede digital, mas na mediação desses formatos, e sobretudo, na intimidade.
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