Palavra Redentorista

A experiência do sofrimento

Escrito por Redentoristas

24 MAR 2021 - 14H45 (Atualizada em 24 MAR 2022 - 14H51)

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Nos momentos mais sombrios da história, nas guerras, nas fomes, nas epidemias como em todas as outras tribulações, o homem revela sua verdadeira natureza, como filho de luz ou um filho das trevas, que o capacita a aceitar o senso de seus limites com plena confiança, na verdade com coragem intrépida em vez de desespero furioso. Quem aceita viver a aventura humana na fé dos filhos de Deus, terá sempre Ele ao seu lado.

A Bíblia não é um tratado de filosofia, nem é um tratado de teologia, no sentido que normalmente atribuímos a essas disciplinas. A Bíblia nos apresenta uma experiência em que o homem quase sempre tem nome; chama-se Abraão, Jacó, Moisés, Jó, todo o povo de Israel: homens reais, concretos, vistos e seguidos nos seus acontecimentos, nas suas experiências de vida. Quando o autor bíblico coloca questões, à maneira dos filósofos, e se pergunta, por exemplo, por que existe sofrimento no mundo e por que a condição do homem é esta e não outra, ele não responde com uma teoria, mas com uma experiência, que do primeiro homem.

O Livro de Jó é sem dúvida a narração mais dramática da experiência humana do sofrimento, tornada mais aguda pelo silêncio de um Deus que, depois de o permitir por razões incompreensíveis ao homem, parece a muitos incapazes de encontrar uma solução razoável. Jó conhece o poder d´Aquele que está acima do mundo, acima do destino, a quem se pode apelar no sofrimento. Jó dirige seu clamor a Deus, e esse clamor se torna o símbolo de uma luta contra o próprio Deus; só a Bíblia relata o fenômeno da luta pessoal com Deus, da luta de Jó, de todo o Israel.

Para Jó, o homem não pode explicar o sofrimento: ele quer envolver Deus diretamente na solução do mal enigmático que ultrapassa a razão. E Deus concorda em testemunhar neste tipo de julgamento em que a vítima do mal queria ser convocada. Há um aspecto relevante do sofrimento que não pode ser racionalizado e, portanto, Jó está certo em protestar (Jó 42, 7). O sofrimento grita seu escândalo cegante na mente do homem.

Deus revela ao homem que existe um projeto, uma racionalidade transcendente. Em seu encontro com Deus, Jó compreendeu seus limites no tempo (Jó 38, 4) e no conhecimento (Jó 38, 4-5; 39,26) e, portanto, limites no poder. O homem conhece apenas as margens do mistério. No entanto, a série de perguntas e imperativos com os quais Deus exorta Jó não é em vão. Ao descobrir a face de Deus por meio da criação, o homem se descobre à luz da obra de Deus. A criação é a ordem que governa o universo e é o fundamento da ética sapiencial.

Em (Hb 38-42), a resposta de Deus está contida na descrição da própria criação. O conhecimento da criação, que está ao alcance do homem, abre à admiração pelas obras maravilhosas de Deus. Em contraste, o significado do cosmos, que não é indispensável ao homem, permanece desconhecido para ele em sua verdadeira profundidade. Quando um homem pretende falar da grandeza ou justiça de Deus, ele deve adotar uma atitude de admiração e adoração que decorre da consciência de sua própria limitação. A questão central no livro de Jó não é o sofrimento, mas a descoberta da verdadeira face de Deus. Jó encontrou Deus face a face. O milagre do livro está no fato de que Jó, em sua rebelião, não se esquiva de Deus, mesmo quando Deus aparece para ele como um inimigo, Jó permanece um homem de fé e, portanto, ele encontra Deus.

No silêncio final, Jó, sustentado por uma fé inabalável, chega ao raciocínio exato e encontra as palavras certas para se dirigir ao Senhor: “Eu te conhecia de ouvir falar, agora os meus olhos te vêem” (Jó 42, 5). O Senhor se revelou a Jó em seu sofrimento. A fé é cheia de um senso de limitação porque não é nem nossa conquista nem nossa posse: é um dom e, além disso, um presente transportado em vasos frágeis (2 Cor 4, 7). Portanto, leva-nos a estar perto de quem se engana, sabendo ter pena das suas enfermidades, como fez Cristo (Hb 4, 15).

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A fé é cheia de um senso de limitação porque não é nem nossa conquista nem nossa posse: é um dom


Deus permitindo o sofrimento, não deixou o homem só, mas tomou sobre si o sofrimento humano no Filho encarnado, para a nossa salvação. A última visão de Daniel (Dn 12,1-3), o segundo livro dos Macabeus (1Mac 7,9.11.14.23; 12,43-46) e o livro da Sabedoria (Sb 1-5) revelam o destino eterno reservado para os justos e os pecadores. O Novo Testamento, explicando os ensinamentos do Servo do Senhor (Is 53,1-12), acabará por chegar à solução que os justos podem desejar sofrer em suas vidas porque o sofrimento dos justos tem um valor redentor (Rom 5,6-19; 1Cor 15,3; 2Cor 5,15; Col 1,14.20.24).

À luz do Novo Testamento, contemplamos em Cristo que sofreu por nós, antes de entrar na glória, o exemplo perfeito de resposta ao problema do sofrimento que é sempre recorrente, mas que, depois da vinda de Cristo, está iluminado por uma esperança segura. 


Fonte: Fr. Gabriel Witaszek, C.Ss.R. / CSSR News

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