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Arsenal da Esperança: uma cidadela do bem

Um refúgio de acolhida e oportunidades para quem busca recomeçar com dignidade e esperança

Karla Maria (arquivo pessoal)

Escrito por Karla Maria

06 FEV 2025 - 10H07 (Atualizada em 06 FEV 2025 - 10H29)

Karla Maria

O espaço em que foi criado o Arsenal era — desde 1888 — conhecido como Hospedaria do Brás, uma espécie de casa de quarentena dos imigrantes europeus. “Durante mais de 90 anos, a Hospedaria de Imigrantes do Brás foi um lugar de referência para pessoas oriundas de diversas partes do mundo. Estima-se que por lá passaram imigrantes de 75 nacionalidades e etnias, além de brasileiros vindos de todos os estados da federação”, revela Odair da Cruz Paiva, professor do Departamento de História da Unifesp.

Na hospedaria havia refeitório, dormitórios, farmácia, hospital, telégrafo, agencia postal e outras instalações, como a Agência de Colocação para o direcionamento dos trabalhadores rumo às fazendas do interior. Segundo os administradores daquele tempo, o período ideal de permanência dos imigrantes era de três dias, nos quais seriam realizados os registros, inspeções médicas, contatos e direcionamentos para o trabalho nas fazendas.

Professor Odair também explica que, a partir de 1930, com a crise da cafeicultura e o aumento das atividades industriais em São Paulo, os trabalhadores que vinham de Minas Gerais e de estados do Nordeste se tornaram a maioria entre os acolhidos. “E embora fosse um lugar de passagem, imigrantes e migrantes tiveram naquele edifício o seu primeiro endereço”.

Um século depois, a cidadela segue oferecendo hospedagem por períodos muito maiores que três dias, além de possibilidades de autocuidado, documentação, apoio jurídico, profissionalização, caminhos por meio de diversas parcerias com faculdades, ONGs, o poder público, como o curso de Hidráulica (pequenos reparos em edificações) em parceria com o SENAI, o curso de Jardinagem com o apoio da Fundação Beneficente Elijass Gliksmanis, além dos cursos de Elétrica e Construção de Alvenaria e Carpintaria também com as parcerias do SEBRAE e o SENAI.

Leia MaisAcolhida, fé e memória sustentam o Arsenal da EsperançaMas as atividades avançam também para o mundo da panificação e da culinária, com aulas práticas na Padaria do Arsenal da Esperança, onde já foram realizados os módulos de “Fabricação de salgados”, “Confecção de bolos” e “Fabricação de pizzas”.

Para além de se capacitar, o Arsenal promove o autocuidado de cada um, de modo particular com rodas de conversa, exames, cortes de cabelo e sessões de podologia.

“Há quase dez anos oferecemos a podologia, ao ponto de termos uma sala com as camas, pias, todo o equipamento, e dois dias por semana (manhã, tarde e noite) tem atendimento. É algo bonito, porque é literalmente servir a pessoa a partir dos pés, e nós temos os piores pés da cidade, porque eles caminham muito de chinelo, às vezes, até descalços”, comentou padre Simone Bernardi.

Neusa Fátima Pereira, vice-presidente da Associação Brasileira de Podólogos, já fez estágio no Arsenal. “Ali encontramos todas as patologias possíveis em membros inferiores e o melhor é que temos a oportunidade de conhecê-las, tratá-las e acompanhar sua evolução”.

Caminhando ainda pelas vias de paralelepípedo, cortando as árvores, adentramos portas e nelas descobrimos um grande refeitório, com dezenas de mesas compridas cobertas com toalhas estampadas que lembram a “casa da vó”. A fila naquela manhã era grande, mas rápida. Era hora do almoço. Ali, diariamente são fornecidos café da manhã, almoço e jantar. Refeições feitas por quem sabe que talvez aquele prato ou alimento seja o único gesto de bondade do dia.

Mais alguns passos e passamos por um dos seis dormitórios, com as dezenas de beliches: lençóis esticados, e espaço arejado. Ainda no percurso, encontramos uma lavanderia industrial, cujas máquinas de cerca de 2 metros de altura dão conta das trocas diárias de centenas de lençóis e toalhas.

As roupas pessoais também podem ser lavadas no Arsenal, a um custo simbólico, pedagógico.

Para lavar as roupas, os “moradores” precisam adquirir Ars [espécie de moeda local], que eles conseguem em troca de material reciclável. “Se eles entregam 10 latinhas, recebem 10 Ars; e com isso eles fazem alguns serviços, entre eles lavar as coisas na lavanderia ou comprar alguns itens no bazar. É uma maneira de dar dignidade, porque não é que eles sempre recebem doações, eles também conseguem suas coisas”, explicou Bernardi. 

Mediante um recibo que tem o número de matrícula de cada um, com a descrição e a quantidade das peças de roupa, ao final da tarde o “morador” retira seu montinho de roupas limpas.

O espaço dedicado ao maleiro também é especial e maior do que os guarda-volumes das rodoviárias de São Paulo. Tudo multiplicado por 1200, lembra? Ali, corredores e corredores de pequenas portinhas trancadas com cadeados guardam tudo o que aqueles homens têm de material.

“Aqui organizamos ao máximo e com muito cuidado para que as pessoas guardem seus pertences em segurança”, disse Clailson da Silva, enquanto trocava o miolo de um dos 1200 cadeados e orientava três novos estagiários do Arsenal.


.:: Este foi o segundo artigo da nossa série especial sobre o Arsenal da Esperança. Compartilhe com a gente sua opinião sobre a reportagem e, se você conhece iniciativas como esta, compartilhe também!

Escrito por:
Karla Maria (arquivo pessoal)
Karla Maria

Jornalista e escritora, autora de quatro livros que tratam sobre fé e direitos humanos, cada um a seu modo. É mestranda em História na Unesp. Foi finalista do Prêmio Vladimir Herzog 2024, é TEDx Speaker, mãe do pequeno João, antirracista e devota de Nossa Senhora Aparecida. (@karlamariabra)

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