Brasil

Constituição Federal e a Intervenção Militar

Documento veda a participação de militar em qualquer forma de (des) governo

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

03 NOV 2022 - 11H12 (Atualizada em 03 NOV 2022 - 11H45)

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No último dia 30 de outubro, a realização do segundo turno da eleição presidencial determinou a derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) para o seu oponente Luís Inácio Lula da Silva (PT), que voltará ao cargo depois de 12 anos.

Foi uma das eleições mais concorridas da história do país e a derrota do presidente Bolsonaro faz com ele se torne o primeiro presidente em exercício a não conseguir a reeleição, o que era tido como certo pelos seus correligionários.

Leia MaisAs faces brasileiras reveladas nas eleiçõesEleições: um caminho de escolhas e consequênciasEnquanto as autoridades das maiores potências do mundo reconheceram e manifestaram seu apoio ao candidato eleito, o Brasil esperou muitas horas para ouvir o discurso do presidente, que pouco acrescentou.

A partir da vitória do candidato Lula, apoiadores do atual presidente saíram às ruas e bloquearam rodovias, alegando uma “suposta fraude” nas urnas eletrônicas, pedindo intervenção militar, com base no artigo 142 da Constituição Federal.

Como que pressentindo o resultado de seu mandato, mesmo tendo sido eleito e não questionando a sua vitória em 2018 pelas urnas eletrônicas, o presidente alimentou essa oposição com uma série de falas nas quais afirmava que não aceitaria uma derrota nas eleições.


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A constituição cidadã

A Constituição de 1988, atual Carta Magna da República Federativa do Brasil, foi elaborada por 558 deputados e senadores, que por 20 meses formaram a Assembleia Constituinte, trabalhando em sua elaboração. Trata-se da sétima constituição da história do Brasil desde sua independência, tendo sido promulgada no dia 5 de outubro de 1988.

A constituição está organizada em nove títulos, que abrigam 245 artigos dedicados a temas como os princípios fundamentais, organização do estado, dos poderes, defesa do estado e das instituições e outros temas relevantes.

Ao longo dos trabalhos, a Assembleia Constituinte esteve aberta a propostas de emendas populares. Para tanto, bastaria que as sugestões fossem encaminhadas por intermédio de associações civis e subscritas por no mínimo 30 mil assinaturas que atestassem o apoio popular à proposta. Até o encerramento dos trabalhos, a Assembleia Constituinte havia recebido cerca de 120 propostas de emendas constitucionais nas mais diversas áreas, reunindo mais de 12 milhões de assinaturas.

Desde então, a constituição já sofreu dezenas de emendas, mas para que um tema seja incluído a partir de uma PEC (Projeto de Emenda à Constituição), deve passar por um longo processo de tramitação e votação no Congresso Nacional.

Não se pode mudar uma constituição a bel-prazer, porque ela é a lei maior que rege o nosso país e nela são inspiradas as demais leis estaduais e municipais.

O artigo 142

"As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem." (Artigo 142)

Este artigo, segundo especialistas em Direito Constitucional, é o responsável pela regulamentação dos fins e da estrutura das Forças Armadas e sua atuação em solo brasileiro. Ao afirmar que as Forças Armadas são instituições permanentes e regulares, que respondem à autoridade suprema do Presidente da República, se destinam à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

Os mesmos especialistas são também unânimes ao afirmar que o artigo que tem sido citado pelos bolsonaristas não oferece nenhuma base constitucional e que também não há nenhuma base na experiência histórica para uma possível intervenção militar.

Os episódios já constatados em nossa história mostram que sempre que as Forças Armadas intervieram no governo do Brasil, a intervenção levou à cessação de direitos, fechamento de instituições e obrigatoriedade de cumprimento de ordens de cima para baixo. Exemplo disto foi a terrível experiência dos 21 anos que transcorreram entre o golpe de 1964 a ditadura que veio logo a seguir.

Isaac Fontana/ Shutterstock
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Uma intervenção somente pode ocorrer se uma parte do País se declarar independente, o que é crime, pois, segundo a mesma Constituição, a República Federativa do Brasil é uma união indissolúvel entre estados, municípios e Distrito Federal. Não existem outras hipóteses previstas que justifiquem a intervenção militar, que seria caracterizada como golpe.

Um possível golpe das Forças Armadas, a pedido do presidente, para justificar a garantia dos poderes constitucionais, seria considerado um "autogolpe" contra as instituições democráticas do Brasil, e sua permanência no poder geraria uma onda de críticas e de oposição internacional, o que seria altamente prejudicial para todos. Se esta remota possibilidade acontecesse, o presidente aproximaria o Brasil da atual situação de países como a Nicarágua, que ele tanto critica.

A solução para a movimentação antidemocrática, que nestes dias acontece com os apelos ao golpe, se dará quando forem iniciados os trabalhos de transição para o novo governo. E ao que tudo indica, as forças armadas não estão muito dispostas a entrar numa “roubada” como essa!

Escrito por
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Redentorista da Província de São Paulo, graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da Província de São Paulo, atualmente é diretor da Rádio Aparecida

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