Por Redação A12 Em Música

Os instrumentos musicais na Liturgia

Ir. Miria T. Kolling*

É interessante saber que nos primeiros séculos do cristianismo, os chamados Padres da Igreja eram contrários ao uso de instrumentos no "sóbrio banquete" dos cristãos, pelo duplo motivo de serem usados nos cultos pagãos e por servirem à imoralidade, sendo símbolo da vida pagã, em contraposição à vida e ao culto cristãos. Admitem os pastores apenas o "puro canto", valorizando a voz humana. Clemente de Alexandria assim se expressa : "O Espírito Santo... se serve deste instrumento a mil vozes para louvar a Deus e canta ele mesmo de acordo com este instrumento humano... Pois tu és para mim uma cítara, uma flauta e um templo: uma cítara por tua harmonia, uma flauta por teu hálito, um templo por tua razão..." Portanto,  a voz e o corpo humanos são os primeiros e principais instrumentos musicais, que sob a regência do Divino Harmonizador,  formam o mais belo acorde do universo, o mais perfeito louvor ao Pai. E Santo Agostinho afirma: "Vós sois a trombeta, o saltério, a cítara, o tímpano, o coro, as cordas e o órgão." Daí a importância do canto comunitário da assembleia, que sempre deve ter a primazia, pela força expressiva da palavra divina, pelo sentimento que carrega, por ser louvor e sacrifício espiritual, e oferenda da vida ao Pai, com Cristo Senhor.

Até hoje as igrejas orientais não usam instrumentos em suas liturgias... Na igreja do Ocidente, com o passar do tempo, passou-se a admitir o uso dos mesmos, sendo o órgão de tubos considerado o mais nobre de todos, no acompanhamento das vozes, como instrumento musical tradicional, por se adaptar aos cantos litúrgicos e aos ritos sagrados.

O que diz o Concílio Vaticano II a respeito dos instrumentos? "Os instrumentos podem ser de grande utilidade na liturgia, quer acompanhando o canto, quer sem ele." Como prolongamento e extensão da voz humana, o instrumento musical não é sacro nem profano, e deve ser usado com critério, sempre dependendo do modo como é usado e do contexto da comunidade celebrante; deve   contribuir "para a beleza do culto e para a edificação dos fiéis". Neste sentido, abrindo espaço para a inculturação, diz o documento sobre a Música Sacra: "Para admitir e usar instrumentos na liturgia, deve levar-se em conta o gênio, a tradição e a cultura de cada povo." (cf Musicam Sacram, nr. 62 e 63) Assim, além do órgão, admitem-se hoje os instrumentos característicos da nossa cultura: o violão (e outros de corda), a flauta, o acordeão, os de sopro e percussão..., contanto que sejam adequados ao uso sagrado, buscando sempre o equilíbrio entre estes e a voz humana, a mensagem, o texto cantado.

Os instrumentos não são mera decoração nem  têm finalidade em si mesmos, mas sua função é ministerial (ajudar a assembleia a rezar se alegrando, pedindo perdão,  glorificando e aclamando, interiorizando a Palavra, silenciando..., conforme o momento ritual), devem ser som-sinal, que remete à ação litúrgica, ao gesto, à voz que canta, portanto a serviço da assembleia. Algumas de suas funções: acompanhar e sustentar o canto; criar um clima sonoro orante, de recolhimento; enriquecer e solenizar a celebração;  facilitar a participação da comunidade celebrante, criando unidade e harmonia; eventualmente executar um solo ou expressar a voz da assembleia, mas sempre com sobriedade, favorecendo o canto. O documento Musicam Sacram, em seu nº. 64, nos chama a atenção para o correto uso dos instrumentos: "O som deles, no entanto, jamais deverá cobrir as vozes, de sorte que dificulte a compreensão dos textos. Calem-se quando o sacerdote ou ministro pronunciam em voz alta algum texto, por força de sua função própria."

Dos instrumentistas, que exercem verdadeiro ministério musical, se exige, além de formação litúrgica e técnico-musical, atitude espiritual e vivência sacramental, imbuídos do espírito litúrgico, envolvidos com a comunidade celebrante, competentes, mas humildes servidores!

"Toda a vida do cristão deve ser uma contínua melodia espiritual; e o ser humano, um instrumento musical, um salmo vivo de louvor a Deus!"

*Ir. Miria Kolling é Religiosa da Congregação do Imaculado Coração de Maria, compositora da música litúrgica e religiosa, musicista, pedagoga, gravou mais de 30 trabalhos em LPs e CDs, como também livros sobre canto e liturgia.

FONTE: https://www.irmamiria.com.br

 

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