Por Prof. Dr. Pe. Rafael Maria,osb Em Artigos

Portugal e Brasil consagrados a Nossa Senhora da Conceição - 370 anos

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Celebramos em 2016, os 370 anos da Consagração de Portugal e suas colônias, o Brasil incluso, a Nossa Senhora da Conceição. Este ato, não só foi devocional, mas teve o intuito de uma defesa doutrinal que, Portugal, Espanha e França se puseram em defender a tese de que a Virgem Maria, desde a sua concepção foi isenta do pecado original. As controvérsias doutrinárias vinham se arrastando a séculos na história da Igreja. O fundo da questão não era Maria e sim a Redenção de Cristo e sua Encarnação. Com Agostinho (+ 409), se dizia que não se deve falar de pecado e incluir Maria. Muitos procuraram diversas fórmulas teológica para defender a isenção da Virgem Mãe do pecado de Adão e Eva. Na Idade Média, os Beneditinos foram os que primeiramente celebraram liturgicamente nos seus claustros ingleses, liturgias, onde esta foi refutada pelo abade cisterciense Bernardo de Claraval, por que dizia que, se a Igreja não aprovou tal doutrina, não se devia celebrar. Mas é ainda com os beneditinos que surge o primeiro «Tratado» teológico sobre o assunto. Eadmero de Cantuária (+ 1124), secretário do abade Anselmo de Aosta, teve a inspiração de argumentar sua tese dizendo que na concepção do homem há a dimensão ativa (onde os pais geram o filho) e a dimensão passiva (onde o filho é gerado). Considerando esta divisão no ato conceptivo, o monge beneditino pregava que na dimensão ativa há transmissão do pecado, pois há continuidade do ato. Contudo, na dimensão passiva, há um novo ser sendo gerado, portanto há uma descontinuidade que abre uma brecha para que a onipotência de Deus aja e rompa com o pecado original. Estabelecida a possibilidade, o monge beneditino inglês apoiou-se na onipotência de Deus para que aquilo que é possível venha a ser real. Eadmero deixou escrito em seu “Tratado sobre a conceição de Santa Maria”: Potuit plane et voluit; si igitur voluit, fecit”: como Deus pode e quis (romper a cadeia do pecado e fazer imaculada a Virgem Maria), fez aquilo que quis. Talvez essas palavras latinas – potuit, voluit, fectit: pôde, quis, fez – já se encontravam na piedade popular que, ao parecer, cantava da seguinte maneira: Quis e não pôde, então não é Deus; Pôde e não quis, então não é filho; Digam, portanto, que pôde e quis.

Foi neste período que os franciscanos começaram a defender a tese de Maria Imaculada. Sob a proteção do Papa Sixto IV - que era franciscano - foi imposto o silêncio aos que defendiam a tese contrária. Tais debates foram entre os dominicanos que negavam e os franciscanos que eram a favor. Porém, no século XV, novas liturgias surgem a mando do papa. Leonardo Nogarole e mais tarde, Bernardino de Busti compuseram as liturgias imaculatistas. Mas isto foi fruto da tese do franciscano inglês, João Duns Scoto que seguindo os passos da tese de Eadmero, elaborou com mais sagacidade, a profundidade teológica do mistério mariano.

 

Maria é totalmente remida por Cristo, mas já antes da concepção.

Bento XVI, na audiência do dia 07 de Julho deste ano, quando falou sobre o beato Duns Escoto, explicava alguns aspectos ligados a esse dogma. A descrição do Papa é muito interessante: “Na época de Duns Escoto a maior parte dos teólogos fazia uma objeção, que parecia insuperável, à doutrina segundo a qual Maria Santíssima foi preservada do pecado original desde o primeiro momento da sua concepção: de fato, a universalidade da Redenção realizada por Cristo, à primeira vista, podia parecer comprometida por semelhante afirmação, como se Maria não tivesse precisado de Cristo e da sua redenção. Por isso os teólogos opunham-se a estes textos. Então, Duns Escoto, para fazer compreender esta preservação do pecado original, desenvolveu um tema que depois seria adotado também pelo beato Papa Pio IX em 1854, quando definiu solenemente o dogma da Imaculada Conceição de Maria. E este argumento é o da “Redenção preventiva”, segundo a qual a Imaculada Conceição representa a obra-prima da Redenção realizada por Cristo, porque precisamente o poder do seu amor e da sua mediação obteve que a Mãe fosse preservada do pecado original. Por conseguinte Maria é totalmente remida por Cristo, mas já antes da concepção. Os Franciscanos, seus irmãos de hábito, aceitaram e difundiram com entusiasmo esta doutrina, e outros teólogos – muitas vezes com juramento solene – comprometeram-se a difundi-la e a aperfeiçoá-la”.

Muitas iniciativas em prol do mistério mariano foi impulsionado em diversos países até ao ponto de que se prestasse juramento em defesa da preservação de Maria do pecado original. Portugal, na faculdade de Coimbra formula o «voto de sangue», inspirando-se nas iniciativas feitas em outras faculdades europeias.

É neste período de entusiasmo que o rei Dom João IV, imitando outros monarcas da Europa dá uma enfase a defesa da Imaculada Conceição. Faz o voto de, a partir dele, nenhum outro rei usará a coroa que não seja Nossa Senhora da Conceição. Consagra a 08 de Dezembro de 1646, Portugal e suas colonias, a N. Sra da Conceição.

Não poderíamos deixar passar em branco este evento pouco conhecido e pouco celebrado na história religiosa do Brasil.

Dom Rafael Maria,osb é doutor em Mariologia: cf. Curso de Mariologia e Cultura Mariológica - www.cursoscatólico.com.br

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