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O mosaico da Natividade de Maria no Santuário Nacional

Neste artigo, a associada da Academia Marial de Aparecida, Profª Wilma Tommaso, nos convida a compreender a festa litúrgica do Nascimento da Santíssima Virgem

Escrito por Wilma Tommaso

08 SET 2025 - 08H49 (Atualizada em 08 SET 2025 - 10H55)

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A Fachada Sul do Santuário Nacional, inaugurada em 2023, apresenta — além das cenas bíblicas do nascimento, morte e ressurreição de Jesus — cenas da vida de Nossa Senhora que, embora não sejam narradas nas Escrituras, há séculos pertencem à Tradição da Igreja. Em 08 de setembro, tanto a Igreja do Oriente como a do Ocidente comemoram a festa da Natividade da Santíssima Virgem Maria.

Há um fato interessante a ser observado: a Igreja sempre celebra como o dia dos santos o dia da morte, ou seja, seu nascimento no céu, mas há três exceções — o Natal de Jesus, de João Batista e da Virgem Maria. Diz Jacopo De Varazze no século XIII: “A Igreja celebra três natividades, a saber, a de Cristo, a de Santa Maria e a de João Batista, que designam três natividades espirituais: renascemos com João pela água, com Maria pela penitência e com Cristo na glória”.

Os evangelhos narram o nascimento de Jesus e de João Batista, mas se calam sobre o nascimento da Virgem Maria. A lacuna foi preenchida, no século II, pelo autor do Protoevangelho de Tiago, um conto apócrifo que, de forma muito significativa, narra a vida de Maria, suas origens, os nomes de seus pais e seu nascimento extraordinário. Embora não seja um livro canônico, o Protoevangelho de Tiago teve um sucesso notável e grande importância na piedade popular, na liturgia e na iconografia mariana, tanto no Oriente quanto no Ocidente. Esse texto faz parte da Tradição da Igreja e, por isso, podemos afirmar: Maria veio ao mundo para realizar o projeto inefável de dar o Salvador à humanidade pecadora.

História e celebração

A origem da festa da Natividade da Virgem está ligada à cidade de Jerusalém, precisamente à dedicação da igreja construída nas proximidades da piscina probática, ou tanque de Betesda – esse lugar é mencionado no Evangelho de João (5,1-15) como local da cura do paralítico — onde a tradição afirmava que havia a casa de Joaquim e Ana. Séculos depois, foi construída uma igreja dedicada a "Santa Maria, onde nasceu", agora chamada de Basílica Santa Ana. Esse lugar, desde o século V, é venerado pelos peregrinos como o lugar da natividade de Maria.

A Igreja bizantina, já no dia anterior (7 de setembro), celebra a pré-festa, e nas orações mais repetidas (tropário e Kontákion) vislumbram-se já os temas que serão desenvolvidos nas celebrações de 8 de setembro, como, por exemplo:

“Da raiz de Jessé e da estirpe de Davi, para nós hoje foi gerada Maria, a celeste menina. Por isso, a criação se alegra e se renova, céus e terra juntas tripudiam. Povos todos, louvai-a; Joaquim exulta e Ana se alegra, exclamando: à estéril dá à luz a Mãe de Deus, nutriz da nossa vida. Hoje, a Virgem e Mãe de Deus, intransponível câmara nupcial do esposo celeste, é gerada pela estéril, em conformidade com a vontade divina, para ser o coche do Verbo de Deus. Para isso, de fato, foi destinada aquela que é a porta santa é a mãe da verdadeira vida.” DONADEO, Maria. O ano litúrgico bizantino. São Paulo: Editora Ave Maria, 1998.

Em Roma, esta festa começou a ser celebrada no século VIII, durante o pontificado do Papa Sérgio I (08 de setembro de 701). Essa tradição, tão importante para a fé católica, não poderia faltar em um santuário mariano e está retratada de forma singular na parte externa da Basílica do Santuário Nacional em Aparecida.

A cada ano, em 8 de setembro, quando a Igreja celebra a festa litúrgica da Natividade de Maria, o pensamento mais recorrente é que surge a aurora — aquela que anuncia a natividade da Virgem prenuncia o nascimento de Jesus. Reza a antífona da entrada: “Celebremos com júbilo o nascimento da Santa Virgem Maria, da qual nasceu o Sol da justiça, Cristo, nosso Deus”.

O Concílio Vaticano II se expressa com uma frase exemplar sobre o nascimento da Virgem. O capítulo VIII da constituição sobre a Igreja Lumen Gentium (LG), totalmente dedicado à Virgem Maria, afirma: “Com ela, enfim, excelsa Filha de Sião, passada a longa espera da promessa, cumprem-se os tempos e se inaugura a nova economia.”

O mosaico da Natividade de Maria

Wilma Tommaso Wilma Tommaso Figura 1: Lateral ocidental da Fachada Sul do Santuário Nacional


O lado ocidental da Fachada Sul do Santuário Nacional é dedicado à Virgem Maria. Olhando do alto para baixo, há quatro mosaicos: a profecia de Balaão; a natividade de Maria; a apresentação de Maria no templo; e, por fim, Maria que tece o manto — ou seja, aquela que tece em seu ventre a carne do Filho de Deus.

O mosaico que retrata a Natividade da Virgem foi inspirado no ícone bizantino, que tem muita similaridade com o ícone da Natividade de Jesus, como podemos observar (fig.1): Ana está deitada, três mulheres trazem presentes à Maria menina, como fazem os reis Magos levando presentes ao Menino Jesus. Abaixo, aparece a cena do banho, que já prenuncia o batismo. Na janela de uma das torres está Joaquim, que de longe observa a cena.

Figura 2: Ícone da Natividade da Santíssima Virgem Maria


O ícone da Natividade de Jesus é um evento cósmico, um louvor da criação e dos homens ao Verbo que se fez carne, ao Menino-Deus. A Natividade da Virgem Maria acontece em um ambiente doméstico; é uma cena íntima e familiar que destaca valores fundamentais para a Igreja: o matrimônio e a família.

Vamos ao mosaico! Ana, a mãe da Virgem Maria, também está ao centro, e três mulheres, que prefiguram as virgens prudentes (Mt 25 1-13), intuem que aquela menina recém-nascida é especial, pois ela trará o Esposo. Assim como os reis Magos, elas lhe oferecem presentes: o pão, o vinho, e o óleo. O que significam esses presentes — pão, vinho e óleo? Maria dá a carne e o sangue ao Filho por obra do Espírito Santo (óleo), e o Filho entrega seu Corpo, seu Sangue e, em Pentecostes, o Espírito Santo.

Thiago Leon Thiago Leon Figura 3: Ícone da Natividade da Virgem Maria no Santuário Nacional


O banho da pequena Maria afirma a sua humanidade; a água, mais do que a purificação, é prefiguração do Batismo. A presença de Joaquim, assim como a de José na Natividade de Jesus, é bem discreta. No ícone, ele espia a cena do alto da torre; no mosaico, da mesma forma, ele apenas assiste ao acontecimento. Há uma diferença essencial: Joaquim é o pai de Maria, enquanto José é pai adotivo de Jesus. Cristo é o Filho de Deus. A única concepção virginal é a de Maria — a Imaculada Conceição — que celebraremos em 08 de dezembro.

A festa de 8 de setembro celebra a vocação única e irrepetível da Mãe do Senhor: ela nasceu para gerar a Vida. Desde o seu nascimento - eternamente presente na mente de Deus, em razão da maternidade divina - a Virgem ocupa um lugar privilegiado na história da humanidade. De fato, quando Aquela que deve dar à luz, os filhos dispersos de Israel retornarão a Deus (Miq 5, 2-5), e todos serão reunidos pelo “Deus conosco”, concebido pela Virgem por obra do Espírito Santo, começo e início da nova geração dos filhos de Abraão (Mt 1,1-16.18-23).

Por causa de sua missão como Mãe do Salvador, "no dia de seu nascimento - canta a liturgia bizantina – começaram a soprar os ventos anunciadores da salvação". Precisamente por isso, o dia 8 de setembro, os bizantinos marcam simbolicamente o início do ano litúrgico: no início do evento salvífico, a Virgem abre o ano dos mistérios de Cristo com a celebração de sua Natividade; ao mesmo tempo, como Igreja já perfeita - ou seja, aquela que realizou plenamente em si a Igreja antes da Igreja - encerra o ano da salvação, em 15 de agosto, com a glória de sua Assunção ao céu.


Referências

AMORTH, Gabriele. O Evangelho de Maria: A mulher que venceu o mal (Portuguese Edition). Kindle Edition.

DE VARAZZE, Jacopo. Legenda Áurea: vida dos santos. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

DONADEO, Maria. O ano litúrgico bizantino. São Paulo: Editora Ave Maria, 1998.

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