Por Pe. Antonio Clayton Sant’Anna, C.Ss.R. Em Grão de Trigo Atualizada em 26 MAR 2019 - 12H44

Arrependimento: saudade da casa paterna onde reina só a misericórdia!

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(Lc 15,1-3.11-32)

O quarto domingo da Quarema, ano C, aborda a parábola de Jesus talvez mais lida e mais comovente. Há quem a considere a “rainha das parábolas”. Intitulada: parábola do filho pródigo é sem dúvida uma joia da literatura universal. Projeta a atitude misericordiosa daquele pai preterido por seu filho mais jovem que saiu em busca de aventuras libertinas mundo afora.  Sobressai nela o apelo à reconciliação, a saudade do abraço do pai antes tão amado, o aconchego da família unida em festa, e muitas outras propostas. A própria Quaresma, bem vivida, tem na sua liturgia uma dinâmica espiritual convidativa à reconciliação com Deus, aos caminhos sociais da fraternidade e ao empenho por um mundo digno, justo e  saudável também nas estruturas de saneamento básico.

Mesmo falando só humanamente, reconciliar-se com os outros, faz bem ao espírito e ao equilíbrio emocional. Aqui e ali em nossos conflitos e desentendimentos, sentimos um vivo desejo de “dar meia volta”. Insatisfeitos com nossos relacionamentos e com nossas divergências com os outros queremos nos reconciliar. Às vezes lá no íntimo surge um certo vazio, uma angústia, uma forte frustração impelindo-nos à reconciliação: com Deus, com os outros e até conosco mesmos. A parábola, pois, do filho mais moço que trocou o carinho do pai no aconchego da casa paterna, pelas aventuras irresponsáveis e – depois – sentiu-se impelido a voltar, é a nossa própria história. Vazio interior... Frustração absoluta com amigos e prazeres... Reconhecimento sincero do erro... Desejo humilde de recuperar a vida. Tudo isso é um pouco a nossa experiência também. A parábola é longa. É oportuno dividir a leitura e comentários em duas partes. Ler: Lucas 15,1-3; 11-24.

O filho mais jovem aborreceu-se com tudo o que tinha e vivia na casa paterna. Achou pouco ter tudo. Exigiu mais. Exigiu sua parte na herança para ter independência total. E se aventurou pelo mundo à cata de gozo, liberdade, novas experiências. Afetuoso, o pai sentiu-se rejeitado, mas acatou a opção do filho moço. Deixou-o partir embora essa partida, lhe partisse também o coração paterno. O moço foi-se embora. Nas experiências das novas amizades descobriu também os falsos amigos que giram só em torno do dinheiro. Descobriu em pouco tempo a fome e a solidão da fome. E na fome sentiu a saudade do que tinha deixado, principalmente a do pai. Redescobriu o pai que ainda não aprendera a conhecer e a amar, usufruindo de graça os bens e a vida a seu lado.

Foi-lhe necessário perceber interiormente que lhe era insuportável o vazio, o desencanto consigo mesmo, a decepção com sua pretensa autoestima. Só então decidiu fazer meia-volta. O retorno ao pai e a casa onde era feliz e tudo o mais que havia trocado por miragens, seduções e ninharias! Tinha sido tão bobo, pensando ser esperto! Ensaiou mil vezes a palavra de reconciliação. Mas o pai que mal o vira e correra ao seu encontro nem o esperou falar. Imediatamente o acolheu e remoçado ele – o velho – por tamanha alegria, organizou uma festa. Na festa está posta a ênfase de toda a narrativa. Uma acolhida festiva, alegre, amorosa desse pai que não hesita em abraçar de novo aquele filho antes ingrato.  Entretanto, o filho mais velho – o fiel – achou-se injustiçado. Rebelou-se. E ia estragar a festa. Leia: Lc 15,25-32.

O comportamento desse filho mais velho, na intenção de Jesus revelada na parábola, está representando a atitude dos fariseus e mestres da lei. Os fariseus se tinham na conta de justos e benquistos por Deus porque eram observantes da religião. Em geral, porém, só no comportamento exterior. Aliás, nem exteriormente se aproximavam daqueles que não frequentavam o Templo, nos atos e sacrifícios religiosos, dele afastavam-se ou por falta de condições ou por serem funcionários a serviço da alfândega romana. Os fariseus os viam como antipatriotas colaboradores do inimigo estrangeiro, “pecadores públicos”, e logo, desprezados. Ora, quando Jesus se aproximou dessa gente foi criticado pelos fariseus e mestres da Lei. Ao rebater a crítica lhes contou a parábola dos 2 filhos. Quis ensinar-lhes o verdadeiro caminho da reconciliação. O caminho não era a lei, as normas, as regras exteriores, o comportamento civil exterior... Mas era o caminho do perdão, do amor e da acolhida. Este é o modo como o próprio Deus – o Pai da parábola – trata todos! Todos são seus filhos. Dando-lhes chances infinitas de conversão. Deus espera a nossa conversão – quaisquer sejam os nossos enganos – para deles nos libertar. Por isso, aproximou-se de nós em Jesus. A parábola do capítulo 15 de São Lucas integra segundo os estudiosos o coração do Evangelho. Retrata de modo profundo a misericórdia de Deus. Meditemos nela sob o olhar de Maria.

 

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A parábola do filho pródigo ilustra a alegria com que Deus nos recebe de volta. Não é um retorno melancólico, cheio de culpas, não! Pois “o amor cobre uma multidão de pecados” (1Pd 4,8). No Cristianismo, a misericórdia de Deus é a razão do jubilo do nosso coração. Esse Pai Eterno que nos recebe de volta é também mãe. Deus criou o homem e a mulher a sua imagem e semelhança. No Pai Eterno o feminino e o masculino estão além das funções biológicas e de suas concepções sociais. O homem e a mulher são um só coração em Deus. Por isso, Maria não ocupa, no projeto salvífico de Deus, apenas um papel material e social, porque na unidade carnal-espiritual com Deus, Maria torna-se também nossa mãe na ordem da Graça.

Um pintor holandês, Rembrandt (1669), retrata essa unidade na sua obra do filho pródigo. A mão direita do pai é feminina, enquanto a esquerda é masculina. O abraço misericordioso é a restauração de toda a criação que nos é oferecida pela graça, por pura graça... E a Mãe intercede o Pai em favor de nós. O Pai concede-nos o perdão com alegria.

 

Pe. Antonio Clayton Sant’Anna, CSsR

Ana Alice Matiello

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