“Ouve em silêncio, e tua modéstia provocará a benevolência”. (Eclo 32, 9)
Uma amizade com Deus no mundo real requer que renovemos todas as coisas (cf. Ap 21,5), pois Deus tem um sonho para este mundo e quem experimentou em sua vida na humildade e no silêncio, apontando o exemplo de seu Filho a todos nós, foi Maria, nos retratando a ternura do Pai, pela força do Espírito.
Também podemos nos aprofundar neste silenciar, conforme apresenta o Frei basco Inácio de Larrañaga, no seu famoso livro “O silêncio de Maria”, onde, logo no início, nos diz: “o silêncio de Maria não é ausência, mas presença”, e, continua: “um apostolado sem silêncio é alienação, e que o silêncio sem apostolado é comodidade”.
Assim, vivemos mais uma Quaresma, tempo de despertar, tempo de recomeçar, onde devemos acolher com alegria essa travessia quaresmal em direção ao novo que Deus, de forma surpreendente, nos reserva. É preciso escutar mais para estar em contato com Deus, é preciso perder o contato com a confusão da vida. É preciso silenciar.
Por Deus possuir um sonho para este mundo, nos deseja um mundo onde os seres humanos trabalhem juntos em harmonia e amizade, com Ele, uns com os outros e com toda a criação. A criação toda, já se vê, foi feita à imagem e semelhança de Deus — Deus é a única realidade, o único modelo para a criação. Os cristãos creem que Jesus de Nazaré é Deus encarnado, em carne humana, que, depois da ressurreição, voltou onde estavam reunidos os Apóstolos, com as portas fechadas e disse: “A Paz esteja convosco! Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio” (Jo 20,21).
Então quais as consequências de viver como amigos de Deus? Esta espiritualidade da amizade com Deus é o propósito para o qual Deus nos criou. Eis, o tempo de conversão. Quaresma, tempo de discernimento sobre a nossa vocação de cristão.
Nossa vida é um eterno caminhar, pois crer é integrar-se, crer é partir sempre, é preciso atravessar a escuridão que está a nossa vida e, dessa maneira, chegar à claridade do mistério. O Pai é mistério, que se aceita no silêncio. Deus não está ao alcance de nossa mão, como a mão de um amigo, que podemos apertar com emoção. Deus é essencialmente desconcertante porque é essencialmente gratuidade.
Desta forma, podemos dizer que “A vida de Maria não foi turismo… como todos nós, Ela foi descobrindo o mistério de Jesus Cristo, com a atitude típica dos pobres de Deus: abandono, busca humilde, disponibilidade confiante” (O Silêncio de Maria, p.46). Assim, percorremos hoje este período quaresmal, da mesma forma como Maria percorreu: na fé em Jesus, no seu tempo, que Ela acreditava porque confiava. Ela se deixou permitir, aderiu, se entregou, amou.
Ao final da peregrinação, junto à cruz, Maria não se oculta, mas avança, se colocando em primeiro plano, digna e silenciosa, ensinando a todos os cristãos, hoje, a importância deste tempo. Pois, conforme o autor do Eclesiástico, sabia que “ouvir no silêncio nos leva à benevolência”.
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