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Educar para a Política: A pedagogia do poliedro

A discordância de ideias, os debates, e os posicionamentos contrários são previstos, aceitáveis e constituem a dimensão da discussão política, mas nunca serão justificáveis e aceitáveis o desrespeito e a agressão ao próximo.

Joana Darc Venancio (Redação A12)

Escrito por Joana Darc Venancio

15 JUL 2022 - 11H25 (Atualizada em 17 JUL 2022 - 16H58)

Para um cristão, educar para a Política sempre será uma missão ampla e desafiadora. Por isso, antes de prosseguir essa reflexão, fica a sugestão para que seja estudada e refletida a Carta Encíclica Fratelli Tutti, de Papa Francisco, sobre a fraternidade e a amizade social.

São os valores do Evangelho que devem compor o itinerário formativo da educação para a Política, e não correntes ideológicas de diversas naturezas. Não basta estar no mundo, mas estar nele fazendo escolhas que diferem de toda forma que é contrária aos ensinamentos de Jesus. “Não vos conformeis com este mundo” (Rm 12,2).

A Política tem sido assunto em muitas conversas atualmente, mas nem sempre tem sido compreendida e vivida de forma condizente com o real sentido do termo. Muitas vezes, é confundida com ideologias partidárias. Evidente que a política partidária faz parte deste universo, mas a Política vai muito além. Inclusive, cabe à Educação Política desmitificar a deturpada visão que se implantou no imaginário social, por conta do comportamento inadequado de muitos políticos eleitos, balizados por ideologias partidárias.

Papa Francisco, no discurso a um grupo de jovens líderes da América Latina, em 04 de março de 2019, refletiu que:

"A política não é mera busca de eficácia, estratégia e ação organizada. A política é vocação de serviço, diaconia laical que promove a amizade social para gerar o bem comum. Deste modo a política contribui para fazer com que o povo se torne protagonista da sua história e, desta forma, evita-se que as chamadas “classes dirigentes” pensem que só elas podem resolver tudo".

Leia MaisAprovado Projeto de Lei da Educação Domiciliar (Homeschooling)Sobre a educação domiciliar – estamos prontos?90 anos da conquista do voto feminino: o que mudou de lá para cáAristóteles, no Livro IV da Ética a Nicômaco, explica que as virtudes éticas e a phrónesis (sabedoria prática) constituem-se, a partir da experiência das relações humanas, no contexto da polis (cidade); ou seja: a Sociedade Civil. É ali onde o sujeito cumpre suas determinações, exercita o bem comum e cria novas determinações que o identificam como cidadão.

Uma verdade prática que o contextualiza, humaniza e o coloca à frente da interrogação sobre sua existência no desvelamento em seu tempo, espaço e lugar, tornando-o criador e recriador de sua vida. Onde sua preocupação para que a realidade que se apresenta possa ser de outra forma – mais justa, fraterna – o impelem ao cumprimento de ações para além daqueles que para ele traçadas.

O Compêndio da Doutrina Social da Igreja elucida que:

A sociedade civil é um conjunto de realizações e de recursos culturais e associativos, relativamente autônomos em relação ao âmbito tanto político como econômico: «O fim da sociedade civil é universal, porque é aquele que diz respeito ao bem comum, ao qual todos e cada um dos cidadãos têm direito na devida proporção» . Esta caracteriza-se pela própria capacidade de projeto, orientada a favorecer uma convivência social mais livre e mais justa, em que vários grupos de cidadãos, mobilizando-se para elaborar e exprimir as próprias orientações, para fazer frente às suas necessidades fundamentais, para defender legítimos interesses (VIII; V: 417).

Educar para a Política é formar para o Bem Comum, para a convivência fraterna na Sociedade Civil e para o exercício da condição cidadã. A Política não pode ser motivo de desagregação e dissolução da convivência social. Evidente que a discordância de ideias, os debates, e os posicionamentos contrários são previstos, aceitáveis e constituem a dimensão da discussão política, mas nunca serão justificáveis e aceitáveis o desrespeito e a agressão ao próximo.

O Papa Francisco, na mesma Carta Encíclica Fratelli Tutti, sobre a fraternidade e a amizade social, usa uma imagem geométrica tridimensional, a do poliedro, para explicar a convivência fraterna:

«A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida (Vinícius de Moraes)». Já várias vezes convidei a fazer crescer uma cultura do encontro que supere as dialéticas que colocam um contra o outro. É um estilo de vida que tende a formar aquele poliedro que tem muitas faces, muitos lados, mas todos compõem uma unidade rica de matizes, porque «o todo é superior à parte». O poliedro representa uma sociedade onde as diferenças convivem integrando-se, enriquecendo-se e iluminando-se reciprocamente, embora isso envolva discussões e desconfianças (215).

Ao aludir a questão da formação como ação do próprio sujeito, e depositar na Educação o seu principal viés e lócus, é inevitável a lembrança da paideia: a Educação pensada pelos gregos. Uma Educação passada de geração em geração, sem perder a essência do que se pretende que seja aprendido e apreendido, inclusive os princípios e valores éticos e morais e as referências das Ciências necessárias à compreensão da vida em sociedade.

A formação do homem, na concepção grega, assim como deve ser esperado da Educação em nosso contexto, se canaliza para uma verdadeira Educação autêntica enquanto formação ético-política, pilares essenciais inspirados na paideia: uma educação autêntica, que visa a formação do caráter para que este atinja a perfeição humana, ou seja a Areté (bondade, virtude).

A Educação plena não se completa, pois ela se renova na própria condição da vivência na polis. A Política ganha, em Aristóteles, o status de “Ciência do Bem Supremo”, pois efetiva a busca pela intencionalidade da atividade humana.

Escrito por
Joana Darc Venancio (Redação A12)
Joana Darc Venancio

Pedagoga, Mestre em educação e Doutora em Filosofia. Especialista em Educação a Distância e Administração Escolar, Teóloga pelo Centro Universitário Claretiano. Professora da Universidade Estácio de Sá. Coordenadora da Pastoral da Educação e da Catequese na Diocese de Itaguaí (RJ)

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