História da Igreja

Mosteiros e Abadias ajudam a educar a Europa

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

22 JUL 2022 - 15H05 (Atualizada em 25 JUL 2022 - 09H47)

HISTÓRIA MEDIEVAL 15

Ler e escrever são capacidades básicas para dizer se uma pessoa é educada ou não, no sentido formal. Nada mais básico para a leitura do que uma escrita legível, com boa caligrafia que seja facilmente compreensível.

Imaginemos um texto escrito inteirinho com letras maiúsculas, sem espaços entre as palavras. Como seria penosa a sua leitura! Pois era desta forma que os romanos escreviam, e do latim, língua usada por eles, provém a nossa.

Isso está registrado em inúmeros monumentos, como no arco romano de Septímio Severo, em Roma. É por isso que, ainda hoje, se fala em algarismos romanos. A língua romana poderia ser explicada como verdadeiros algarismos, devido à confusão que provocava nos leitores menos preparados.

A facilidade de escrita e de leitura que hoje temos se deve aos monges da Idade Média, em particular ao imperador Carlos Magno e ao seu conselheiro beneditino, o abade Alcuíno de York.

Jolanta Wojcicka/ Shutterstock
Jolanta Wojcicka/ Shutterstock


Uma nova forma de escrever

Por volta do ano 780, o imperador ordenou que a Escola Palatina, que funcionava no palácio, passasse a usar letras minúsculas e que fossem colocados espaços entre as palavras. Desta forma ,surgiu a chamada “minúscula carolíngia”, uma antepassada direta da forma como hoje escrevemos.

Carlos Magno era aconselhado pelo abade Alcuíno, monge beneditino da abadia de York, uma espécie de “ministro da Educação”, muito valorizado pelo imperador, para esse e uma série de outros assuntos. Como o exemplo vem de cima, a ordem do palácio real pegou em todo o Império e as escolas adotaram a nova forma de escrever, que foi se desenvolvendo cada vez mais daí pra frente.

O imperador queria que as letras fossem arredondadas, de tamanho igual, para que o ato de ler e escrever fosse o mais fácil possível. A Minúscula Carolíngia substituiu a Minúscula Merovíngia, que era bem irregular, confusa e de difícil leitura.

Na nova forma de escrever, as letras maiúsculas ficaram como legado dos romanos e as minúsculas foram inspiradas pela escrita usada pelos monges da Inglaterra e da Irlanda. A forma final foi então elaborada pelo abade Alcuíno, sob direta supervisão de Carlos Magno.

Reprodução/ Wikipedia
Reprodução/ Wikipedia

O mais antigo manuscrito que usa a “minúscula carolíngia” é o Evangeliário de Carlos Magno, ou de Godescalco, que hoje se encontra na Biblioteca Nacional da França e que foi encomendado pelo imperador.

As abadias da França, Suíça, Alemanha, Áustria e Itália passaram a empregar a nova escrita e as abadias da Inglaterra e Irlanda a adotaram pouco depois, com o mesmo fazendo as abadias dos outros países da Cristandade, chegando até a região nórdica ou na região dos eslavos.

Essa facilidade de ler e escrever ajudou muito na conservação e transmissão das obras clássicas da Antiguidade, pois os escritos antigos, copiados pelos monges, ficaram muito mais acessíveis. E como a Igreja tinha o monopólio da educação, logo as escolas passaram a se utilizar desta forma de escrita, trabalhando na educação de toda a Europa.

Renascimento Carolíngio

O imperador Carlos Magno teve um longo reinado, de mais de 50 anos, no qual investiu muito na educação e na produção artística e cultural, dando origem a um movimento chamado de “Renascimento Carolíngio”, graças a uma série de iniciativas focadas na cultura, conhecimento e arte promovidas pela corte de Carlos Magno, em parceria com as abadias e mosteiros católicos.

Como os mosteiros se estabeleciam nas regiões mais longínquas não só do império, mas de outras regiões fora do império, e como cada mosteiro funcionava como um centro autônomo de evangelização e de subsistência, a cultura foi chegando para todos.

Leia MaisA Igreja e a Cultura MedievalIgreja: Na Idade Média instituição ganhou força políticaGraças a esse movimento, chegaram até nós milhares de livros do mundo grego e latino, escritos com a “minúscula carolíngia”, além de se estabelecer uma premissa decisiva para o longo processo de alfabetização do continente: um sistema de grafia mais simples e prático.

Graças à Igreja, a Europa é hoje um continente onde a taxa de alfabetização é muito alta, numa percentagem média de 98% de pessoas alfabetizadas. Portugal, com uma taxa de 95%, e Turquia, com uma taxa de 88%, são os dois países mais atrasados.

Pensadores cristãos conciliam fé e razão

Antes de Carlos Magno, com a dissolução do Império Romano, as invasões bárbaras e o desaparecimento das instituições, os centros de difusão cultural também se desagregaram. Os chamados "pais da Igreja" se tornaram os primeiros filósofos a defender a fé cristã nos primeiros séculos, até aproximadamente o século VIII e, como filósofos, buscaram conciliar a herança clássica greco-romana, com o pensamento cristão. Esta corrente filosófica e teológica ficou conhecida como Patrística.

Sue Smith/ Shutterstock
Sue Smith/ Shutterstock

Os pensadores cristãos aos poucos foram trabalhando a conciliação entre fé e razão, ajudando na sistematização da doutrina cristã, surgindo ideias e conceitos novos, e as questões teológicas, relativas à relação entre fé e razão passam a ocupar o centro da reflexão dos principais pensadores cristãos, até surgirem os grandes nomes do período: Santo Agostinho e São Tomás de Aquino.

Santo Agostinho (354-430) foi o primeiro grande filósofo cristão. Com ele, as ideias filosóficas tornaram-se verdades reveladas e inquestionáveis, e algumas darão origem a dogmas da Igreja. Porém, a partir da formulação das ideias da filosofia cristã, abriu-se a perspectiva para uma distinção entre verdades reveladas e verdades humanas, com a distinção entre a fé e a razão.

A partir do século XII, a filosofia medieval é conhecida como escolástica. Com o surgimento das universidades e dos centros de ensino, e com o desenvolvimento das cidades, o conhecimento passa a ser guardado e transmitido de forma mais sistemática. Platão e Aristóteles, os grandes pensadores da Antiguidade, se tornam as principais influências da filosofia escolástica.

Nesse período, a filosofia cristã alcança um notável desenvolvimento. No campo da teologia, a grande preocupação era provar a existência de Deus e da alma.

O método da escolástica fundava-se na disputa (Disputatio), que consiste na apresentação de uma tese, que pode ser defendida ou refutada por argumentos.

O pensamento deve ser subordinado a um princípio de autoridade, no qual os argumentos podem ser tirados dos filósofos antigos, dos padres da Igreja ou dos homens da Igreja, como os papas e os santos. O destaque desse período é São Tomás de Aquino, que produziu uma obra monumental que influencia até hoje, a "Suma Teológica", elaborando os princípios da teologia cristã.

Tanto Agostinho como São Tomás terão os seus seguidores e seus opositores, mas graças a eles e a tantos outros personagens da Igreja é que absolutamente a Idade Média não pode ser chamada de “Época de Trevas”, porque nela também brilharam grandes luminares da educação, da arte e da cultura.

Escrito por:
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Missionário redentorista graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da antiga Província Redentorista de São Paulo, tendo sido também diretor da Rádio Aparecida.

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Por Redação A12, em História da Igreja

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