Opinião

Língua, Linguagem e idioma: elos de Comunicação Fraterna

Joana Darc Venancio (Redação A12)

Escrito por Joana Darc Venancio

31 AGO 2023 - 10H54 (Atualizada em 12 SET 2023 - 14H23)

Fizkes / Shutterstock

Língua, Linguagem e idiomas são três vias essenciais à convivência humana. São conceitos que estão em sintonia, mas que têm diferenças importantes entre eles. A Língua faz parte de uma história cultural e tem regras específicas.

O Dicionário da Língua Portuguesa define que Língua é: Conjunto dos elementos que constituem a linguagem falada ou escrita peculiar a uma coletividade; idioma: Língua Portuguesa. Dessa forma, temos uma convenção linguística, com regras gramaticais, que nos permite nos expressar coletivamente e sermos compreendidos uns pelos outros: todos os indivíduos, identificados pelos muitos grupos sociais, estão incluídos e contemplados. 

Mas poderíamos nos perguntar, então, por quais razões a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) foi oficializada como Língua em nosso país? Não seria uma Linguagem? No caso de LIBRAS, trata-se de uma Língua que envolve expressões gestuais e visuais, com uma estrutura gramatical própria e definida; por isso não é Linguagem.

Leia MaisEntenda a importância do setor de acessibilidade da Tv AparecidaA Lei 10.098 de 19 de dezembro de 2000, conhecida como Lei da Acessibilidade estabeleceu normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade de mobilidade e de comunicação, que no caso da LIBRAS, foi reforçada pela Lei 10.436, de 2002, conhecida como Lei da Libras, reconhece a Libras como língua natural dos surdos.

A comunidade surda não se sentia contemplada pela Língua Portuguesa. Essa passa a ser, agora a chamada L2 (segunda língua) para os surdos no país, o que garante o aprimoramento de metodologia própria para aquele que tem a Libras como L1 (primeira língua) aprenderem com mais eficiência a Língua Portuguesa.

E a Linguagem, o que tem a ver com tudo isso? A linguagem é o ato de transmitir a mensagem. A via pela qual comunicamos nossos sentimentos, ideias, informações e demais experiências cognitivas e emocionais. A linguagem é composta por signos linguísticos que remetem aos significados e significantes da mensagem.

O significante que já está em nossa memória cerebral, nos remete à construção expressa pela imagem, desenho, som, sinal, gesto, expressão facial... Ou seja, o reconhecimento mental e a materialização do conceito. Dessa forma, a linguagem pode ser verbal e não verbal.

A Fala de Papa Francisco, na AUDIÊNCIA GERAL de 19 de junho de 2019, na terceira catequese sobre os Atos dos Apóstolos, nos dá um exemplo da força da Linguagem:

Conforme nos dizem as Sagradas Escrituras, a palavra dos Apóstolos impregnou-se do Espírito do Ressuscitado e tornou-se uma palavra nova, diferente, que, no entanto, é compreensível, como se fosse traduzida simultaneamente em todas as línguas: com efeito, «cada um os ouvia falar na própria língua» (At 2, 6).

Trata-se da linguagem da verdade e do amor, que é a língua universal: até os analfabetos podem entendê-la. Todos compreendem a linguagem da verdade e do amor. Se te apresentares com a verdade do teu coração, com sinceridade, com amor, todos te hão de entender. Mesmo que tu não possas falar, faz um afago que seja verídico e amoroso.

E ainda temos o idioma, que é a língua própria de uma nação. A Língua vernácula, ou seja, natural e que identifica características próprias de um povo (léxico, regras gramaticais, fonética, etc.). No Brasil, o Português se tonou idioma, pois foi a Língua falada oficialmente.

A definição de um idioma como Língua oficial está diretamente ligada ao Estado Político de uma nação, que é a organização territorial, dirigida por um governo soberano, respaldado por uma Constituição e sistemas jurídicos.

Leia MaisPapa Francisco recebe “Pai Nosso” em língua da AmazôniaPapa Francisco: "Nossa Senhora nos fala na língua materna, que nós entendemos muito bem"Conheça a língua universal contra os conflitosHavia um idioma antes do Português? Os nativos, que habitavam a Terra de Santa Cruz, antes da chegada dos Portugueses, tinham diversos idiomas (que correspondiam aos diversos povos existentes). Dentre eles, destacam-se os troncos linguísticos Tupi e Macro-Jê. Do primeiro, estava o idioma Tupinambá (da família Tupi-guarani), que foi preferido no processo de colonização.

Vale ressaltar que os Jesuítas que catequizaram os índios, valorizaram, estudaram e difundiram a língua nativa, fato que geralmente fica oculto, no ensino da História. São José de Anchieta criou a primeira gramática português/tupi-guarani, impressa em 1595, em Portugal.

Há no Brasil atual, diversas comunidades indígenas que resistem e mantém vivo o Tupi-Guarani e foram esses grupos, que impulsionaram para que a Constituição Brasileira fosse traduzida para idioma nativo. São da região do Alto Rio Negro e Médio Tapajós, os 15 indígenas bilíngues, que traduziram a Constituição. Em 19 de julho de 2023, após 35 anos de promulgada, o STF lançou a versão traduzida para o nheengatu, que descende do tupi antigo, e que ainda está vivo.

Ainda vale citar a "linguagem neutra", sem flexões de gênero, que tem causado grandes debates acadêmicos, religiosos e políticos. É uma proposta de representatividade para pessoas “não-cisgênero”, ou seja, que afirmam não se identificar com o sexo biológico que nasceram e, por isso, defendem que a Língua Portuguesa seja inclusiva.

Para isso, propõem que não haja flexão de gênero: eles, todos, não deixando evidente o sujeito da frase e substituir a vogal temática e o artigo pela letra “E”, pelo “I” ou mesmo pelo “U”. Todos seria substituído por “Todes” “Todis, Todus”.

Papa Francisco na Encíclica Amoris Lætitia, alertou que:

Preocupa o fato de algumas ideologias deste tipo, que pretendem dar resposta a certas aspirações por vezes compreensíveis, procurarem impor-se como pensamento único que determina até mesmo a educação das crianças. É preciso não esquecer que «sexo biológico (sex) e função sociocultural do sexo (gender) podem-se distinguir, mas não separar».(46)



A linguagem neutra tem sido compreendida e defendida, por alguns teóricos e grupos sociais, como um movimento transformador, que busca superar a ideia das coisas fixas.

A proposta de linguagem neutra, no entanto, não é reconhecida por muitas instituições, grupos, parte da Academia, por razões linguísticas e de valorização histórica da Língua Portuguesa. Para a Igreja, ela representa uma das vias da implantação da chamada teoria de gênero, ou ideologia de gênero.

Papa Francisco, em julho de 2016 no Encontro com os Bispos Poloneses, nos alerta novamente:

Outro desafio surge, de várias formas, de uma ideologia genericamente chamada gênero, que nega a diferença e a reciprocidade natural de homem e mulher. Prevê uma sociedade sem diferenças de sexo, e esvazia a base antropológica da família. Esta ideologia leva a projetos educativos e diretrizes legislativas que promovem uma identidade pessoal e uma intimidade afetiva radicalmente desvinculadas da diversidade biológica entre homem e mulher. A identidade humana é determinada por uma opção individualista, que também muda com o tempo.

Portanto, trata-se de um projeto de linguagem, para além dos significantes e significados, mas de interferência na orientação sexual, começando desde criança, inclusive pelas vias escolares. Tal projeto é movido por grupos que buscam a mudança da mentalidade no que tange aos valores morais, religiosos; aqueles que zelam pelo entendimento de que o fator biológico define o sexo.

Continua Papa Francisco:

Na Europa, nos Estados Unidos, na América Latina, na África, em alguns países da Ásia, existem verdadeiras colonizações ideológicas. E uma delas – digo-a claramente por «nome e apelido» - é o gênero! Hoje às crianças – às crianças! na escola, ensina-se isto: o sexo, cada um pode escolhê-lo.

A linguagem neutra, dessa forma, exclui a maior parte da sociedade constituída, já que defende que a forma de pensar de um grupo, que evidentemente deve ser respeitado e acolhido pela Igreja, deva prevalecer sobre a maioria.

Não se trata de uma negação às diversas formas de expressão, de linguagens próprias advindas de muitas experiências dos mais variados grupos sociais que compõem a vida social. Elas são expressões, que sempre existiram e continuarão existir, são dialetos que dão visibilidade a várias identidades.

Esses grupos, com suas expressões, fazem parte da riqueza cultural e a comunidade que defende a “linguagem neutra” tem todo direito e liberdade de defender suas expressões. No entanto, essas expressões particulares não devem ser impostas à toda sociedade.

Escrito por:
Joana Darc Venancio (Redação A12)
Joana Darc Venancio

Pedagoga, Mestre em educação e Doutora em Filosofia. Especialista em Educação a Distância e Administração Escolar, Teóloga pelo Centro Universitário Claretiano. Professora da Universidade Estácio de Sá. Coordenadora da Pastoral da Educação e da Catequese na Diocese de Itaguaí (RJ)

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