Por Ciro Leandro Costa da Fonsêca Em Palavra do Associado Atualizada em 06 OUT 2017 - 08H41

Nossa Senhora da África

Cores vivas da arte sacra na face negra de Maria


Ciro Leandro
Ciro Leandro
Nossa Senhora da África: cores vivas da arte sacra na face negra de Maria

O Instituto Jesus Missionário dos Pobres, no qual fui vocacionado à vida religiosa, fundado pelo Monsenhor Gervásio Fernandes de Queiroga, nasceu com o sonho do padre em evangelizar os pobres do Brasil, da África Portuguesa e do mundo inteiro. A casa mãe deste instituto localizada no sertão da Paraíba em Cajazeiras foi construída no mesmo solo onde a população carente do Nordeste acolheu em seu coração as pregações do missionário Padre Ibiapina, onde atuavam as Irmãs de Caridade, ordem religiosa fundada por ele para atender o povo sofrido dos sertões. É neste lugar ao lado da antiga Casa de Caridade do Padre Ibiapina que a missão se fez fecunda. Além da evangelização, o instituto é um guardião da história, do patrimônio e da arte sacra.

Os membros do instituto encontraram e restauraram o antigo altar da capela da casa de caridade do Padre Ibiapina em Cajazeiras. Este tesouro foi salvo do fogo, pois estava desprezado e hoje deitada a toalha branca sobre sua madeira, o compromisso com os mais pobres se renova a cada eucaristia e a semente do andarilho Ibiapina se fortalece. Como também a capela que tem como padroeira Nossa Senhora da Conceição guarda uma bela imagem também encontrada pelos membros nas dependências do Colégio Padre Rolim, construído na antiga casa de caridade. Devidamente restaurada e preservada, a imagem é de uma beleza singular. Esta pode ter pertencido aos salesianos que tomaram conta do colégio ou até mesmo às irmãs de caridade do Padre Ibiapina. Destaco o trabalho dos membros dessa congregação religiosa em preservar a história da Igreja local e do trabalho histórico trabalho missionário nos sertões.

Neste trabalho se destaca arte da religiosa Irmã Luíza Moisés, do Instituto Maria Mãe Imaculada, que integra o Instituto Jesus Missionário dos Pobres, na pintura e restauração do altar e da imagem. A religiosa se constitui como uma artista plástica que pintou em cores vivas a sua fé com telas sobre a vida de Jesus, o jovem Jesus com São José e Nossa Senhora na carpintaria, a Face de Cristo na Paixão, o Coração de Jesus em Chamas, símbolo maior do trabalho do instituto pintado no altar restaurado e no sacrário, estampas de vertente artística afro-brasileira como também em formas geométricas que se aproximam do cubismo. Uma tela se destaca no conjunto da obra: Nossa Senhora da África, Maria e o Menino com feições negras, no sentido adequado do termo, aqui esclarecido pelo seu uso constante com sentidos negativo e pejorativo. Feições africanas que nos lembram de traços dos afrodescendentes e afro-ameríndios. Nossa Senhora nas cores de Irmã Luíza se reveste de sua face negra, indígena, como Mãe que está ao lado dos povos massacrados ao longo da história e das colonizações do Brasil, da América Latina e da África. A pintura se constitui como um signo de resistência dos povos negros, joia rara da arte contemporânea que merece um estudo aprofundado juntamente com o conjunto da obra da falecida religiosa. Importante acervo para estudos nas áreas da semiótica da história e da cultura, como também para a história da arte e a arte sacra. Como a identidade do instituto nasceu com o sonho de evangelizar também a África Portuguesa, a tela de Nossa Senhora da África nos atenta para a situação dos países africanos na elaboração de suas identidades culturais e nacionais diante do mundo após anos de massacre colonizador e guerras e conflitos pró e pós-independências.

Que a chama de fogo do Coração de Jesus, tantas vezes pintada pela artista Irmã Luzia, aqueça e ilumine as lutas pela preservação da história, pela tolerância religiosa e cultural, nestes tempos de extremismo, e pela missão onde estão os mais necessitados. Parabéns ao Instituto Jesus Missionário dos Pobres!


Ciro Leandro Costa da Fonsêca
Doutorando em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Associado da Academia Marial de Aparecida



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