Por Leonardo C. de Almeida Em Artigos Atualizada em 24 ABR 2020 - 09H11

Nossa Senhora e a pandemia: alegria Pascal em meio ao caos

“Maria, tu sempre brilhas em nosso caminho como sinal de salvação e esperança.
Nós nos entregamos a Ti, Saúde dos Enfermos...” (Papa Francisco)

É chegado o tempo da Páscoa do Senhor. Em contraste com as sete dores de Maria, uma das práticas de piedade mariana próprias para a espiritualidade pascal, proveniente do carisma franciscano e estendida para toda a Igreja, é a Coroa das Sete Alegrias de Nossa Senhora: a Anunciação; a Visitação; a Natividade de Jesus; a Adoração dos reis magos; o Encontro de Jesus no Templo; a Ressurreição de Jesus; a Assunção e a Coroação de Maria – episódios, curiosamente, equivalentes a alguns dos Mistérios contemplados no Rosário.

Trata-se da devoção à Nossa Senhora da(s) Alegria(s).


Nossa Senhora da Alegria

À primeira vista, parece incoerente, em meio a tantas trevas vividas com a atual pandemia, falar-se em alegria. Contudo, não por acaso, o nome de Maria rima com alegria – foneticamente e na vivência cristã. Nesse sentido, relacionamos duas das sete alegrias de Nossa Senhora a Visitação de Maria a Isabel (cf. Lc 1,39-45) e a Ressurreição de Cristo (cf. Mc 16,1-7) – com o momento terrível e conturbado que não nos permitiu sequer celebrar a Semana Santa em comunidade.

A História atesta que o ícone de Maria, Mãe de Deus, intitulado Salus Populi Romani (isto é, Salvação/Saúde do Povo Romano), que se venera na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, é datado dos primórdios da Igreja. A Basílica foi erigida no preciso local onde caíra neve, em pleno verão, no dia 5 de agosto de 358. Maria teria revelado, em uma aparição em sonho ao papa Libério, que sua vontade era que a igreja fosse construída onde nevasse. Surgia aí a devoção a Nossa Senhora das Neves.

TV Aparecida
TV Aparecida
Ícone da Santa Mãe de Deus .


A piedade cristã atribui a autoria da efígie a São Lucas, o evangelista, também médico e pintor segundo a tradição. Conta-se que a madeira em que o ícone foi pintado era parte de uma mesa que pertenceu a Nossa Senhora e que teria sido confeccionada pelo próprio Jesus, na marcenaria de São José. Lucas, por sua vez, para realizar a pintura, teria se baseado em uma outra imagem da Mãe de Deus que se encontrava na Palestina, tida como achiropita, ou seja, “não feita por mãos humanas”. O ícone foi encontrado e trazido a Roma por Santa Helena, mãe do Imperador Constantino, e tornou-se uma das “relíquias” mais queridas do povo cristão e dos papas.

No referido ícone, evidencia-se, justamente, o dogma da Maternidade divina da Virgem Maria, isto é, Santa Mãe de DeusTheotokos – proclamado pelo Concílio de Éfeso, em 431: com uma riqueza grande de simbolismos, traços muito peculiares e inscrições, Maria é representada carregando o Menino Jesus.

A invocação Salus Populi Romani advém do costume de o ícone ser levado em procissão pelas ruas para aplacar ameaças, perigos, pestes e epidemias que se abatiam sobre Roma. Um fato miraculoso se verificou em 590, quando, a mando do papa Gregório Magno, foi realizada uma procissão com a imagem bendita, fazendo cessar uma epidemia que assolava Roma. Outros tantos episódios prodigiosos relacionados a curas ou cessações de pestes e conflitos por intermédio da Mãe de Deus invocada como “Salvação ou Saúde do Povo Romano” se registraram ao longo dos séculos.

São também memoráveis e muito difundidas outras invocações marianas em infindas cidades ou nações que foram agraciadas pela proteção da Mãe de Deus (seja por meio de aparições, inspirações ou imagens de Nossa Senhora) com o fim de períodos de secas, problemas sociais e carestia, epidemias, guerras, perseguições ou invasões. Muitos lugares, por essa razão, elegeram-na como Rainha, Imperatriz ou Padroeira, reconhecendo nela uma Mãe intercessora e solidária àqueles padecentes. Possivelmente muitas histórias e títulos marianos nos vêm à mente neste instante.

Pois bem... A Senhora que livrou os romanos e outros povos de outrora de tantos males não há de escutar nossas preces diante do atual quadro de avanço da doença provocada pelo coronavírus? Basta que façamos a nossa parte, seguindo, com responsabilidade e amor ao próximo, as orientações dos profissionais de saúde e das autoridades competentes e voltemos nossos corações e pensamentos confiantes à Mãe do Senhor, que não se faz indiferente a um pedido filial que aporta junto ao seu coração, o qual também foi martirizado pelos sofrimentos deste mundo como mulher, mãe, esposa...

Ainda que a quarentena e a distância nos impeçam de estarmos presencialmente ante a milagrosa imagem da Virgem de Roma ou de outros tantos santuários a Ela dedicados, em sintonia com a Campanha da Fraternidade deste ano, elevamos a Maria nossas preces em favor da vida, dom concedido pelo Criador:

Que Ela nos livre do vírus; cure os infectados; auxilie-nos no exercício consciente da prevenção e do isolamento social; afaste o pânico e o desespero; eduque-nos para não sermos indiferentes aos dramas das nações; fortaleça os profissionais da saúde; ilumine os cientistas e estudiosos para a elaboração de medicamentos e da vacina; dê sabedoria e bom senso aos governantes; não permita que a pobreza e outros dramas de opressão social sejam esquecidos; guarde os trabalhadores e os seus direitos; inspire os empregadores a valorizar a vida acima do lucro; proteja a Igreja e o papa; ensine a valorizarmos as relações humanas; console os enlutados e receba nos céus os falecidos.

Ora, o poder intercessor, ou melhor, o amor maternal de Maria não conhece fronteiras e limites. Dessa forma, que Maria Santíssima seja invocada por todo o mundo, onde recebe os mais variados títulos e exerce diversos patrocínios, oriundos dos infindáveis livramentos e das curas milagrosas realizadas ao longo dos séculos por Aquela que assumiu a maternidade universal aos pés da Cruz – o que nos faz recordar as poéticas palavras de Isaías a respeito de Jerusalém, em quem reconhecemos Maria, imagem da Igreja:

Sim, a treva cobre a terra, névoas espessas envolvem os povos, mas sobre você brilha o Senhor, e sua glória a ilumina. Sob a sua luz caminharão os povos, e os reis andarão ao brilho de seu esplendor. Lance um olhar em volta e observe: todos esses aí se reúnem e vieram procurá-la. Seus filhos vêm de longe, suas filhas vêm carregadas no colo” (Is 60,2-4).

O queridíssimo papa Francisco, assim como tantos outros papas ou bispos que experimentaram situações de guerra, crise ou epidemias por toda a História, recomenda que acorramos a Maria, nossa piedosíssima Mãe das Mercês, bem como aos santos protetores contra a peste e aos padroeiros dos lugares e das comunidades.

Francisco, ele mesmo, peregrinou a pé à Basílica de Santa Maria Maior para rezar pelo fim da epidemia mundial e compôs à Mãe do Divino Amor a oração cujo trecho encabeça este artigo. Também solicitou o papa que o ícone original de Maria, Salus Populi Romani estivesse presente, bem como o Crucificado prodigioso da igreja de São Marcelo, durante a comovente e histórica bênção Urbi et Orbi extraordinária do dia 27 de março de 2020.

Reprodução Vatican News
Reprodução Vatican News
Oração do Papa Francisco diante da Praça São Pedro vazia.


Nos
passos de Francisco, o Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam) realizou um ato de consagração da América Latina e do Caribe à sua padroeira principal, Nossa Senhora de Guadalupe, no Domingo de Páscoa, na intenção do cessamento da pandemia e em solidariedade às suas vítimas.

Assim, as duas alegrias de Nossa Senhora que salientamos no primeiro parágrafo – a Visitação de Nossa Senhora e a Ressurreição de Jesus – atualizam-se em nossos dias: Maria, atenta aos frágeis, VISITA-NOS, como a Isabel. Ao nos visitar, a Virgem, Saúde dos Enfermos, traz-nos o Cristo, tal como quando ainda grávida diante da mãe de João Batista.

E ao passo que, em meio à pandemia, surgem tantos gestos e testemunhos de doação de vida (inclusive até a morte, como no caso daqueles que trabalham para garantir nossa sobrevivência e se dedicam ao cuidado dos enfermos e dos mais fragilizados), de solidariedade, de generosidade, de sensibilidade, de redescoberta e vivência da Igreja doméstica, de respeito e tolerância, de preservação do meio ambiente, de revisão e mudança de mentalidades e posturas, de reeducação, vemos a RESSURREIÇÃO do Senhor concretizando-se na humanidade. Com efeito, o olhar e o coração de nossa Mãezinha piedosa e linda estão conosco e ao nosso lado nos sofrimentos, especialmente nesta hora difícil de enfrentamento do vírus.

Matheus Andrade
Matheus Andrade


É certo que tudo ficará bem
, mas pedimos a Maria que abrevie, para nós, a espera por esses dias de paz e tranquilidade. Elevemos aos céus, então, esta seguinte prece poderosa e antiquíssima, recitada, segundo a tradição de muitas comunidades do Brasil e da Europa, em ocasiões graves e críticas, para as quais se invoca a intercessão da Santíssima Mãe de Deus, nossa ALEGRIA, nosso Amor, nossa Estrela e nossa Esperança infalível:

A ESTRELA DO CÉU, Virgem Santíssima,

que a seus seios criou o Senhor,
extinguiu a mortal peste que, no mundo,
introduziu o primeiro homem, pai dos humanos.

Digna-se, agora, a mesma Estrela

reprimir os influxos dos astros que,
por suas disposições malignas,
ferem o povo com moléstias.

Gloriosa Estrela do Mar,

de sublimes louvores digníssima,
dos perigos nos defendei,
contra os enganos do mundo nos protegei!

Medicina Cristã,

aos sãos conservai, aos enfermos sarai:
o que a humana força não pode,
vossa graça nos conceda!

Ouve-nos, ó Maria,

porque vosso Filho vos honra em nada vos negar!
Salvai-nos, Messias,
que por nós vos pede a Santíssima Virgem Maria!
Valei-nos em todas as nossas atribulações e angústias!
Socorrei-nos, ó piedosa Virgem Maria!

Amém.


Leonardo Caetano de Almeida
Associado da Academia Marial de Aparecida

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